quinta-feira, 11 de outubro de 2018

E se falássemos de publicidade das Casas Comerciais de Bragança?

Na verdade, o mundo da imprensa pode bem ser uma caixa de surpresas. Da publicidade – que normalmente preenchia a última das normais quatro páginas destes hebdomadários – vivia também a imprensa local. O jornal era, no contexto da época, um meio, um veículo importante. Publicitar para informar, para chamar a atenção, para atrair, para “criar necessidades” que levassem à conquista de consumidores. As mensagens publicitárias na imprensa, que se serviam das técnicas gráficas e fundamentalmente do engenho dos gráficos, visavam, como é manifesto, através da “arte de criar fascínio” – embora, neste campo se tivesse ido, depois, muito mais longe –, aumentar as vendas e conquistar mercados. A publicidade pode ser, na perspetiva que nos interessa – conhecer o meio e os seus habitantes – uma fonte de ensinamentos.



Como seria de esperar, informações colhidas algum tempo antes e depois do 5 de Outubro, sobre o tecido empresarial e sobre a oferta dos mais variados produtos e serviços, pouco diferem. É um mundo onde as coisas não mudaram de um momento para o outro.
Falar em tecido empresarial, é falar, fundamentalmente, no setor comercial, que, contribuiu, à sua maneira, para a “urbanidade” do meio, para a construção de urbanidade, e para lhe conferir dinamismo económico e social.
A publicidade é alusiva, sobretudo, ao que seriam os principais estabelecimentos comerciais e industriais – ou seja, às unidades de maior dimensão e com mais projeção – e aos produtos e serviços aí oferecidos. Dá-nos pistas sobre o meio comercial e industrial. Como é óbvio, não são publicitadas casas comerciais e oficinas de pequena dimensão, ligadas, por exemplo, à oferta de comidas de bebidas, de géneros alimentares e a atividades artesanais que, frequentadas essencialmente pelas camadas mais baixas, integravam o “pequeno comércio”, embora tivessem um importante significado económico.
Não seria de esperar – pelo que julgamos conhecer do aglomerado – que existissem grandes casas com ofertas diversificadas e um grande número de estabelecimentos especializados que pusessem à disposição dos consumidores uma enorme variedade de produtos e géneros. E no entanto, se pensarmos que Bragança era cabeça de uma vasta região agrícola e sede de um extenso Distrito, torna-se compreensível que aqui se encontrem algumas unidades significativas – próximas do que seriam os “armazéns comerciais” da época –, quer pela dimensão e vitalidade dos seus negócios, quer pela variedade e atualidade/modernidade dos seus produtos.
Havia também muitas outras lojas e oficinas que vendiam ao público e que, no âmbito de uma certa especialização, ofereciam uma grande variedade de produtos.
Diga-se, entre parênteses, que todas as casas de porta aberta, quer oferecessem produtos ou serviços, independentemente da sua dimensão e do volume de negócio, eram designadas por “comércios” e por “sotos”, um regionalismo local que deve derivar de soto (sob, em baixo), porque se localizavam no rés-do-chão.
Os anúncios pouco variam, são praticamente os mesmos em todos os órgãos de informação. Por vezes, excedem o espaço da última página. Alguns revestem a forma de notícias. A grandeza das empresas é proporcional à dimensão e até à qualidade gráfica dos espaços publicitários.
As mensagens publicitárias permitem-nos tirar, ainda, algumas conclusões acerca de muitos dos serviços disponíveis. Pela publicidade, por aquilo que se anuncia – no duplo sentido de informar e publicitar –, podemos ficar a conhecer aspetos do quotidiano ligados à “civilização material” – expressão cara a Fernand Braudel –, à vida económica e social, a hábitos, costumes e práticas da formação social, a aspetos do quotidiano. Elucida-nos sobre produtos e géneros de consumo corrente, sobre artigos de luxo, sobre usos, costumes, gostos, sensibilidades, “modas”, inovações. As mensagens publicitárias fornecem-nos, também, elementos sobre contactos e intercâmbios entre Bragança e outros espaços e localidades.
Dos produtos e artigos publicitados, alguns, pelo seu caráter mais inovador ou raro, no contexto da época, são propagandeados com mais ênfase. Uma vez mais, há “novidades” que estão disponíveis no mercado local. E, se aqui chegam, é porque encontram consumidores. Entre artigos de consumo mais e menos corrente, o sortido é variado e a lista extensa: géneros alimentícios; artigos domésticos; materiais de construção, com produtos sofisticados para acabamentos.
Serviços e trabalhos tipográficos de qualidade – pelo menos desde 1907, uma das tipografias tinha equipamento técnico muito avançado; serviço de encadernação; materiais de papelaria diversos; uma livraria que acumulava com tipografia e papelaria. Há uma variedade “assombrosa” de artigos de vestuário, chapelaria, luvaria, gravataria e ainda um significativo setor de alfaiataria. Máquinas de costura – com a Singer a ter uma forte presença no mercado – e máquinas agrícolas integram as ofertas. Como é evidente, num aglomerado como Bragança, não podiam faltar produtos químicos para a agricultura, adubos e fertilizantes.



Os serviços publicitados dizem ainda respeito à hotelaria e à restauração. Há reclames a farmácias e a vários produtos farmacêuticos. Anunciam-se espetáculos, festividades e atividades recreativas. Deparamos com anúncios de empresas, casas, escritórios, livrarias, escolas, colégios, agências de viagens e serviços, com sedes noutras localidades – essencialmente no Porto e em Lisboa. São firmas, produtos e serviços que, normalmente, se impõem pela sua modernidade e que não estavam disponíveis no mercado brigantino.
No campo da cultura são publicitados escritórios de advogados; “explicadores”, isto é, professores que davam explicações a alunos; livros de ficção e de ciência. No que respeita aos títulos anunciados, quase desaparecem, compreensivelmente, depois do 5 de Outubro, os de caráter religioso; publicitam-se, sobretudo, novidades que se coadunam com a ideologia e com o pensamento republicanos. Mas muitos destes livros já figuravam, por exemplo, em A Pátria Nova – na secção publicitária –, antes da proclamação da República.
Em suma: acaba por ser verdadeiramente surpreendente a quantidade e até a qualidade de bens que se encontravam no mercado de um meio como este, aparentemente parado no tempo, com múltiplos problemas e sérias limitações de índole económica, social e urbanística, mas que era um centro e um polo aglutinador de uma vasta área: um Concelho rural tecido de aldeias e um Distrito com algumas vilas que eram atraídas, preferencialmente, por e para Bragança. Não esqueçamos os negócios e os intercâmbios com uma Espanha que, quando as relações eram amistosas, estava perto; a fronteira, como é reconhecido, se separa, também aproxima.
Não deixam de nos surpreender máquinas e equipamentos variados e produtos de “última hora” – papéis, tintas, vernizes, papéis de parede, objetos de relojoaria e de joalharia, revistas de moda, publicações muito recentes.
Bragança parecia estar atualizada no que à moda respeita – era grande a variedade de tecidos e de produtos de vestuário.
Transcrevemos, pelos ensinamentos e pelas informações que nos podem dar, alguns desses anúncios.
Um grande espaço publicitário era reservado a Francisco Cândido Teixeira, 49 Rua Direita 53. “Camas, lavatórios e fogões de ferro”; “videta de ferro e zinco; louças de ferro e porcelana; colchões e enxugadores para roupa; ferragens, pregagem e vidros; pólvora estancada do Estado; munições para caça; papel de cores para forrar salas. Depositários das tintas e vernizes de Olsina”. A propósito das tintas Olsina, há informações esclarecedoras: “a superioridade destas tintas a água para pinturas de interiores e exteriores de casas... cada vez mais se acentuam”.
Os argumentos para a sua preferência aludiam a novos hábitos e novas práticas que se tentavam impor – substituição do papel pela tinta –, e a preocupações higiénicas, uma vez que “as tintas substituem com grande vantagem o papel de forrar casas que tão anti higiénico é, pois podem lavar-se depois de secas e são um magnífico desinfetante, visto na sua composição entrar o ácido fénico”; sendo “muitíssimo mais duráveis que a cal, não têm o inconveniente de sujar os fatos”. Muitos e variados produtos nesta grande loja. Podemos dizer que se tratava de um armazém.
Com um anúncio bem visível, aparecia também a “Antiga Casa Comercial de Francisco Inácio Teixeira. Rua Direita. Atual proprietário, Henrique da Conceição”. A oferta era variada: “Novo e completo sortido de todos os géneros de mercearia. Há também à venda as afamadas águas de mesa de Bem Saúde e de Verim. Papelaria, perfumaria e objetos de escritório. Vendas por junto e a retalho”.


Henrique da Conceição era proprietário de uma padaria, Panificia Brigantina, na antiga cerca das freiras de Santa Clara. “Nesta padaria, recentemente montada, com as melhores condições de higiene, se está manipulando pão de todas as qualidades. Pessoal completamente habilitado vindo das melhores casas do Porto. Todos os dias se encontra aberta ao público que queira ver o asseio com que é feita a manipulação”.
A Grande Alfaiataria Brigantina de António Augusto dos Santos Agrochão, na Rua Direita, também merece destaque. Nas revistas Le Progrés, Les Modes Françaises, L’élegant “encontram os fregueses modelos e figurinos que são executados com perfeição”. A moda francesa chegava a Bragança. Não aparecem referências publicitárias a costureiras e modistas, que teriam, provavelmente, os seus ateliês instalados nas suas próprias residências.
A Chapelaria Brigantina, de Manuel da Costa Brilhante, também se localizava na Rua Direita. Vendia chapéus finos para homem desde 800 réis. Em 1911, oferecia “um esplêndido sortido de chapéus modernos, muito lindos, feitos pelo próprio proprietário em vários formatos, tendo cada um desses formatos o nome dum ministro do Governo Provisório da República. Fazem-se chapéus e consertam-se, garantindo-se a sua perfeição”.
A chapelaria associava-se, agora, à República e prestava-lhe homenagem. Por essa altura, o ministro da Guerra e o do Interior tinham visitado Bragança. Mais uma razão para esta jogada de marketing, que aumentaria a aceitação destes produtos. Houve provavelmente clientes que adquiriram chapéus à ministro.
José Manuel Montes, próximo ao estabelecimento de Luís Lopes dos Santos, oferece camas, fogões, selaria, calçado, “papel para forrar salas”.
Outra importante casa era a Livraria, Papelaria e Oficina de Encadernação de Adriano Rodrigues, na Rua Direita, 137 e 139, que oferecia “bilhetes-postais com diversas vistas de Bragança”. “Sortido completo de livros de instrução primária e outros. Variado sortido de papel e objetos de escritório. Trabalhos de encadernação”. “Bilhetes ilustrados: extraordinária coleção de postais ilustrados, tanto nacionais como estrangeiros”. Informava se ainda que a “oficina foi recentemente melhorada com duas máquinas modernas, vindas diretamente da Alemanha, e tem um empregado completamente habilitado que executa todos os trabalhos que lhe forem apresentados”.



O progresso, vindo diretamente da avançada Alemanha, chegava a Bragança – o anúncio incluía gravuras de máquinas. Mas já antes, em 1907, se publicitava que nesta oficina, “recentemente fundada, mas já muito conhecida, executam-se com a máxima rapidez e aperfeiçoamento todos os trabalhos que lhe forem apresentados”. “Adquiriu ultimamente em Paris, todos os ferros e tipos de gravura, e duas excelentes máquinas vindas da Alemanha”.
A Tipografia Minerva, de António Melo, na Rua Direita, anuncia “trabalhos tipográficos bem feitos e baratos”. Em 1911, existia na Praça Almeida Garrett, Praça da Sé, uma outra tipografia, a “Ferreira Soeiro”, onde se compunha e imprimia O Concelho de Bragança.
A Singer publicitava, com grande relevo, os serviços prestados à comunidade e as excecionais qualidades das suas evoluídas máquinas que se vendiam na Rua Fora de Portas e “em todas as vilas do Distrito”. “Na sucursal, em Bragança, uma senhora completamente habilitada ensina gratuitamente a bordar à máquina”. Máquinas de costura tinham, na época, mercado garantido. Como é sabido, a produção de muita roupa e de muitos enxovais era domiciliária. Costurar e bordar fazia parte da educação feminina, em especial das “meninas prendadas”. Para potenciar as vendas, davam-se lições de costura e de bordado – este tipo de serviço ainda se mantinha nos anos de 1980. “A roupa que veste a humanidade foi cosida com a máquina Singer…” A Bragança chegavam, em 1911, as máquinas mais evoluídas e tecnicamente mais avançadas, como era o caso da Singer “66”. “Em todas as cidades do mundo…” e em Bragança também.
A ourivesaria e relojoaria de Madeira e Martins, na Rua Fora de Portas, anuncia preços “sem competência”.
“Com oficina de ourivesaria na Rua Mouzinho de Albuquerque, 200-202, Porto”. Eis o que oferecia: “Completo e variado sortido de objetos de ouro e prata. Relógios de mesa e de parede. Despertadores Baby e de fantasia.
Relógios de bolso em ouro, prata, aço e níquel”.
Na Rua Fora de Portas, a casa de José António Rodrigues de Paula vendia carboneto de “superior qualidade”, a 90 réis o quilo. E, mais tarde, um “desmesurado” reclamo anunciava, no jornal de que era proprietário, a Farinha Cream of Wheat. “Chegou grande quantidade deste bom alimento”.
Podemos conhecer um pouco da imensa e surpreendente variedade de tecidos que vestiam as gentes destas terras, especialmente as senhoras, em 1909. Entendamo-nos: gentes de pessoas… E podemos ficar a conhecer, ainda, algumas das roupas e dos acessórios que compunham o trajar. O anúncio abre com um título bem destacado: “Coisa Assombrosa” – assim era de facto e ainda mais “assombrosa” para os dias que correm, porque muitos destes artigos são, hoje, enigmáticos. “Estamparia do Bolhão em Bragança na antiga Casa Braga. Hoje de Albano Costa. O mais completo sortido em todo o género de tecidos, tais como: lanifícios; panos; fazendas de lã; armures, bearritezes, amazonas, gorgorões e outras mais fazendas pretas para vestidos; écharpes de seda, cor e branca – estas, lindas para noivos; pelerines boas, xailes de malha, jerseys e outros agasalhos para senhoras e crianças; cobertores de lã franceses e muito fortes, da Serra; chalaria; calçado de feltro, tapete e borracha, para homem, senhora e crianças; cetins e seda, creplises e outras muitas guarnições para vestidos; granadines, cambraias, chitaria, zefires para camisa, etc.; morins, panos-família, chapelaria, guarda-sóis de seda e algodão para senhora e cavalheiro, bretanhas de linho, sombrinhas, perfumarias”. E este sublinhado: “Pede-se especial atenção para uma monstruosa coleção de roupas para verão e meia estação vinda das principais fábricas estrangeiras, inglesas e alemãs”. Surpreendente variedade, de muitos e “desvairados” sítios!
Tabacos e bebidas estavam profusamente representados: “sortido completo em tabacos nacionais e estrangeiros, vinhos, bebidas de guerra e espirituosas, especialidades estrangeiras, bolacha fina, cervejaria, chocolate, cacau, o melhor café da Brasileira e muitos artigos de difícil numeração”. E uma apelativa mensagem final: “Tudo por preços excessivamente convidativos e sem competência. Às três distintas classes clero, nobreza e povo roga--se a fineza de ir VER para melhor apreciar e CRER”.



Em meados de 1907, anunciava-se o “progresso industrial” com uma “Fábrica de Gasosas“ que se encontrava “instalada nos baixos do Seminário S. José, na Rua Fora de Portas”. Resultou do esforço do comerciante António Augusto Dias. “Para iniciar os trabalhos de funcionamento veio um empregado do Porto… O material empregado é de primeira qualidade, e por isso é de esperar que o público acolha como deve esta primeira tentativa de progresso industrial da nossa terra…” A informação deixa pressupor a existência de “um deserto industrial”.
Passemos à hotelaria e à “restauração”. O Hotel Pirelho e Granjo oferecia, como principal atrativo, “jantar reclame aos domingos e dias santos, pelas cinco horas da tarde. Consta de sopa e três pratos do meio, sobremesa e frutas, vinho e café. Preço 300 réis”. Também servia jantares para fora.
O primeiro Governador Civil republicano, João José de Freitas, e o seu irmão, que lhe sucedeu no cargo, estiveram instalados, como o comprovam algumas notícias, no Hotel Virgínia, na Rua Almirante Reis. Dito “Grande Hotel…”, quando aqui também se hospedaram, em 1911, os ministros.
De notar, ainda, a referência, em 1907, à Farmácia Macias.
Para além de outras conclusões, pode ver-se que a artéria comercial, por excelência, continuava a ser a Rua Direita (posteriormente, Combatentes da Grande Guerra), mas outras unidades comerciais significativas localizavam-se nas proximidades da Praça da Sé – o coração da urbe –, nas ruas Alexandre Herculano e Fora de Portas e na Rua Almirante Reis (que havia sido Rua dos Oleiros e de Santo António).
Antes do 5 de Outubro de 1910, entre os livros anunciados, encontramos, essencialmente, como seria de esperar, obras de cariz religioso ou sentimental. Mas também são publicitados exemplares que abordam temas científicos de grande atualidade, que integram coleções, com obras de “vanguarda”, nos diferentes domínios do conhecimento. Bragança não funcionava em “vaso fechado”.
Eis algumas das obras que se anunciavam nos primórdios de 1908: História Sagrada do Antigo e Novo Testamento,“ com aprovação do Senhor D. António, bispo do Porto”; OVale das Lágrimas, “assombro de sentimento cristão”; Mês de Maria. E ainda, Dois berços roubados – a melhor obra de Castelhanos, autor dos romances As Duas Mártires, Vingança de Mulher, O Amor Fatal, Lágrimas de Mulheres. Mas já se publicitavam Elementos d’eletricidade…
É bem possível que géneros literários ligados à religião e à exploração dos sentimentos continuassem a contar, depois do 5 de Outubro, com fiéis leitores, mas a publicidade a este tipo de obras, em especial as de cariz religioso, vai praticamente desaparecer.
De Trindade Coelho promovia-se, em 1908, o Manual Político do Cidadão Português, em segunda edição, um “grande volume de 720 páginas. 800 réis”. Outros títulos publicitados, que eram vendidos em fascículos: Os Lusíadas para as Escolas e para o Povo, por José Agostinho, e o Novo Dicionário Enciclopédico Ilustrado, por Francisco de Almeida. O Manual da cozinheira trazia mais de 1 500 receitas para ricos e pobres, e era “o mais completo de todos até hoje publicados”.
Um número de A Pátria Nova, de fins de novembro de 1910, inseria esta publicidade: Biblioteca da Educação Moderna – 3.º volume desta série de “excelentes livros”, intitulado Descendemos do macaco?, de Dennoy. Já publicados: A Igreja e a Liberdade, de Emílio Bossi; Socialismo e Anarquismo, de Ramon. Atente-se na orientação ideológica que presidia à coleção… Continuava a promoção do Manual Político do Cidadão Português, de Trindade Coelho; Elementos de eletricidade, um livro de 450 páginas; do capitão Machado, A flexibilidade da Infantaria no combate, com o preço de 1 000 réis, e Palestras no Regimento, por 700 réis. A Biblioteca de Educação Moderna continua a ser publicitada em abril de 1911.



A livraria de Adriano Rodrigues que, na altura – fins de 1909 –, funcionava como “agência da Livraria Chardron” (de Lelo e Irmão) do Porto, vendia livros da “Biblioteca Racionalista”, que incluía, entre outros estudos “avançados”, obras de Ernesto Haeckel e de Darwin.
Na área da prestação de serviços é grande a variedade, como se comprova por alguns exemplos: Explicador – Guilherme Correia de Araújo, “tenente de Infantaria n.º 10, explica matemática e ciências do 3.º, 4.º, 5.º ano do liceu”.
Escritório de advogado – o antigo advogado Alves de Morais, agora “administrador” em Vimioso, com escritório no Porto, “vai estabelecer na Cidade de Bragança uma sucursal”.
Colégio do Porto de Nossa Senhora da Saúde, fundado em 1905, para ambos os sexos. Com instrução primária, secundária, comércio, música, etc.
Um grande anúncio “vende” A Minerva com uma oferta de serviços que, para Bragança, não se esperaria: “Consultório Literário e Jurídico. Agência de trabalhos científicos, literários e artísticos. Comissões e consignações. 82, 2.º Rua do Arsenal 84, 2.º“.
Portugal Previdente. Companhia de Seguros. Sede Rua do Alecrim – Lisboa. Seguro agrícola (cereais), palhas, fenos, maquinas debulhadoras. Seguros de vida. Dá em Bragança todas as informações: F. de Moura Coutinho”. Mala Real Inglesa – carreiras a saírem de Leixões para o Brasil e para a Argentina.
Há alguns anúncios alusivos a firmas do Porto, que estavam relacionados com a propaganda a armas e, sobretudo, com a realidade agrícola. Neste campo destacamos: produtos para “melhoramento, preservação, conservação e clarificação” de vinhos; máquinas e aparelhos para apicultura, laticínios, oleicultura e vinicultura – moinhos para azeite, prensas, desnatadeiras… batedeiras, amassadeiras, chocadeiras termostáticas…, criadeiras, colmeias móveis…, extratores, fumigadores, fio estanhado, etc.” Os nomes, de marcas estrangeiras, são sonantes.
Publicitavam-se ainda: “instalações elétricas…, carboneto de cálcio, adubos químicos, simples e compostos”.
Ainda um “florido” reclame que surpreende pelo número impressionante de variedades de cravos, a provar que a floricultura era levada a sério. Coleção de cravos, com 330 variedades – Rio Tinto-Porto.
Há outra gama de produtos que também fornece luz sobre aspetos do quotidiano. Vão desde os que estavam ligados aos cuidados corporais – produtos farmacêuticos, medicinais e com propriedades profiláticas e curativas –, passando pelos higiénicos e de beleza, até aos artigos e acessórios ornamentais. Muitos deles só poderiam ser consumidos pelos grupos sociais que tinham poder de compra. E, se estavam presentes no fim do mundo monárquico, vão continuar a ser consumidos nos novos tempos republicanos.
Como seria de prever, pensando na mortandade provocada pelas doenças pulmonares, em especial pela tuberculose, alguns dos “fármacos” mais publicitados eram destinados a “prevenir” e a “combater” estas enfermidades, as chamadas “doenças de peito”.
O “reconstituinte enérgico – Nucleiarrhenal Hygiene. Marca registada – específico das doenças de nutrição e das afeções pulmonares”, apresentava-se “nas três formas de Elixir, Granulado e Gotas concentradas”. Elucidava-se: “a forma elixir é preparada com vinho velho do Porto, da conceituada casa Ferreirinha”.
Deste “reconstituinte” passava-se à publicidade – agora em formato de notícia – da milagrosa Solução Pantanberge para os “que sofrem doenças do peito”. Era “composto de creosate puro de faia e de cloridrofosfato de cal”, e apresentado como “o antiséptico mais poderoso e o reconstituinte mais energético”. Com excelentes e múltiplos efeitos, “aumenta rapidamente a vontade de comer e as forças, facilita a expectoração e cicatriza as lesões pulmonares. A solução Pantenberge nunca cansa o estômago”. Como se explicava, “os numerosos médicos que fazem uso da Solução Pantenberge consideram-na como o remédio mais seguro e eficaz para todas as doenças dos pulmões e dos brônquios. Cura constipações, bronquites e tuberculoses, gripe, pleuris e pneumonia… Quase milagroso e com poderosos efeitos profiláticos, dá força às crianças de compleição fraca, pondo-as ao abrigo da tuberculose. Vende-se em toda a parte”.



“Histogeno Llopis. Depositário em Bragança, Acácio Augusto Mariano. Tuberculose, diabetes, anemia, neurastenia e doenças consuntivas em geral, que, abandonadas, no seu princípio, dão origem à tuberculose.
O doente sente-se melhor com um frasco e curado tomando seis”.
Há ainda remédios para a “ronha ou sarna das ovelhas”: Pós de Cooper. O depositário é o conhecido Rodrigues de Paula e “cada pacote contém qualidade suficiente para beneficiar 40 ou 50 ovelhas”.
“A Inimiga!” Ora, esta inimiga vem a ser a prisão de ventre que é vencida por Aloina Houdé. Estes grânulos evitam também “gastrologias”, “enxaquecas” e “ideias tristes que são o cortejo acostumado da prisão de ventre”.
Vende-se nas boas farmácias.
Era um outro mundo, com outras doenças, outras maleitas, outros produtos, outras preocupações…

Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa

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