segunda-feira, 27 de julho de 2020

A PRAÇA CAVALEIRO DE FERREIRA E A NOVA SÉ CATEDRAL

Construção do Palácio da Justiça de Bragança
Deste modo se ia inscrevendo no espírito da opinião pública e dos que tinham capacidade de decisão os passos a dar quando começava a ser urgente a projeção de um novo ordenamento urbano. Todavia, apesar do novo limite que a linha férrea estabelecia, no lado poente da nova Avenida João da Cruz ainda sobrava espaço livre com suficiente amplitude para, já na vigência do Estado Novo, se formar uma nova praça – a Praça Cavaleiro de Ferreira, ministro da Justiça de Salazar –, contendo a novidade, em termos de urbanismo bragançano, de uma fonte de aparato. Seria delimitada a Norte e Sul pelos edifícios do Tribunal Judicial, residência dos magistrados e Caixa de Previdência, obras com uma intencionalidade arquitetónica monumental de modo a que a solidez do granito e a austeridade formal das suas linhas e volumes propagandeassem os critérios, políticos e estéticos, com que os dirigentes da época justificavam a sua legitimação. E se a estruturação da nova praça mostrava um assinalável afastamento das propostas apresentadas por Januário Godinho, merecedoras da aprovação do Governo em 1948, tal não significa que tivesse sido abandonada a ideia de fazer deste espaço o centro de uma dinâmica urbanística que abrisse outros horizontes a este centro urbano.



Em todo o caso, apesar da monumentalidade com que se edificou, a permanência de lotes sem utilização transmitiram duradouramente a sensação de um espaço fragmentado e carente da genuína vitalidade que, essencialmente, continuava a ser comandado a partir da Praça da Sé. Apesar da diversidade de linguagens estéticas, sinais dos diferenciados ritmos de ocupação de solos, será útil acrescentarmos que a sensação de desordenado campo aberto só se ultrapassou com a construção do Banco Nacional Ultramarino e, mais recentemente, com a do Teatro e de um bloco quase inteiramente dedicado à atividade comercial.
Capela de Santo António do Toural
Mas nenhum destes episódios construtivos invalidou a repetição de fenómenos mais antigos, visto que, antes destas obras, um dos lados da praça esteve destinado à implantação de um novo templo com funções catedralícias, o qual teria a servir-lhe de fundo a Escola Industrial e Comercial de Bragança. Para a concretização deste desígnio, na Quaresma de 1960 o bispo D. Abílio Vaz das Neves publicou uma pastoral respeitante à Sé Nova de Bragança, e em 14 de novembro de 1964 anunciou os nomes das pessoas que integravam a comissão executiva e a comissão de meios para levarem a cabo tão gigantesco empreendimento. Em 27 de outubro de 1963, no salão de festas do Paço Episcopal, o engenheiro João de Almeida, do Patriarcado de Lisboa, prestou esclarecimentos sobre o concurso de anteprojetos para a catedral que, logo no mês seguinte, se expuseram publicamente na Sociedade Nacional de Belas Artes.
Os propósitos iniciais relativos à construção da Igreja Catedral arrastar-se-iam no tempo por variados motivos, os quais decorriam de orçamentos curtos e também dos temores institucionais relativamente às novas tendências da arquitetura. Paralelamente, sentiam-se as dificuldades de conjugação das inércias que o tempo longo fomentava com alguns dos inovadores normativos que o Concílio do Vaticano II sancionou. Num outro tempo, à vista das grandes transformações que, cruzando os seus efeitos, produziram uma sociedade mais complexa, a Cidade respondeu expandindo-se, nem sempre bem, enquanto procurava responder às diversificadas solicitações que se exigiam.
D. Manuel de Jesus Pereira, que sucedeu a D. Abílio Vaz das Neves, aceitou aquele desígnio como herança e “mandou fazer nova planta, modesta, (e) escolheu o local, lá para as bandas do Toural, perto da Capela de Santo António”. O projeto chegou a ser exposto no salão da Câmara Municipal mas logo se esgotaram as vontades que o impulsionaram.
Diversas perspetivas da Catedral de Bragança




Passaram mais alguns anos para que o projeto da equipa do arquiteto Vassalo Rosa pudesse começar a concretizar-se, justamente com a abertura das fundações, iniciadas em 8 de junho de 1992. Este projeto, segundo o texto inserido no “Programa preliminar para a Nova Sé de Bragança”, de 1982, “tratando-se de uma igreja, além da verdade e pureza próprias de uma arquitetura autêntica, deve caraterizar-se por um conjunto harmónico de qualidades que exprima, em linguagem propriamente arquitetural, mais do que pelo recurso ao simbolismo das formas ou das decorações, o caráter sagrado do edifício que, pela consagração ritual, é retirado dos usos profanos e destinado a usos exclusivamente sacros. Por outras palavras, tanto exterior como interiormente, deve impor-se ao sentir comum dos homens não como um edifício que também pode ser uma igreja, mas como um edifício que não pode deixar de o ser”.
Agora, num outro sítio, encostando-se onde estiveram algumas cortinas do antigo Forte de S. João de Deus, edificou-se em Portugal a sua última catedral, inaugurada oficialmente em 7 de novembro de 2001 – sendo, como todas as catedrais portuguesas, dedicada a Nossa Senhora da Assunção.

Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa

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