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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

A máscara e o seu papel nos rituais populares do Nordeste Transmontano

A associação da máscara aos ritos parece estar presente em várias culturas representando, no caso português, ainda reminiscências de usos e costumes herdados dos povos primitivos que passaram pela Península Ibérica.
Pereira (1973) salienta que as máscaras estão representadas em todos os continentes, sendo caracterizadas por especificidades inerentes a cada região. As máscaras europeias nada têm a ver com a dos outros continentes apresentando estas, não só um carácter cultural, ritual e profano, como ainda, um sentido lúdico.
Integradas em cerimónias, assumem um carácter dramático através do traje que prefigura seres sobrenaturais.
A tipologia da máscara está de acordo com a especificidade de cada continente. É neste sentido que o autor estabelece uma relação entre as máscaras portuguesas e as europeias, lembrando-nos que “as máscaras europeias e as portuguesas para lá de certas semelhanças meramente normais, nada têm a ver com as máscaras de povos que se situam fora do continente europeu”. (Pereira: 1973, p.11).
Podemos concluir, pelas palavras do autor, a existência de culturas diversas entre si, donde resultam formas de expressão diversificadas.
Pereira, reportando-se ao Continente Europeu, diz-nos que a máscara tem um “ (…) carácter ritual, cultural e profano” (1973: p.11). Lembrando ainda o sentido lúdico, refere as suas tonalidades específicas fundamentais, como o caso das que representam “comportamentos obscenos, aspersões com água e cinza, combates, danças, barulheira de campainhas e chocalhos”. (Pereira: 1973, p.11).
Seguindo o pensamento de Pereira, que cita Karl Meuli, este refere-nos a importância da máscara nas actividades carnavalescas e relaciona-as com os espíritos dos antepassados.
Tiza acrescenta que o mascarado sai à rua nas festas solsticiais de Inverno e no período de Carnaval, assumindo, na actualidade, funções meramente profanas.
Tiza (2004) referindo-se, ao que nos parece uma função simbólica, atribui à máscara uma função que, aos olhos do povo, «representa o diabo», o que é visível através das atitudes que o autor enfatiza.
O Carnaval, corresponde a um momento crítico das sociedades agrárias, situa-se no momento de passagem do Inverno para a Primavera, e está de acordo com o calendário gregoriano, iniciando o ano em Março.
De facto, sabemos a importância da cultura grega no nosso povo, visível em inúmeras manifestações culturais ainda hoje presentes. Além disso, a cultura gregoriana atribuída a S. Gregório Magno (não confundamos com a origem do nome, baseada no povo grego), está presente na cultura popular, como nos foi dado a conhecer através da nossa pesquisa, destacando-se por exemplo, na música, que nesta região foi profundamente estudada por vários autores como Giacometi, Lopes Graça e Jorge Dias.
Um aspecto que nos parece digno de algum apreço, como lembra o autor, tem a ver com a relação com o sagrado e a consequente “purificação das comunidades pela crítica social, o culto da natureza, pelas suas atitudes licenciosas relacionadas com o apelo à fecundidade (…) o culto dos mortos e da divindade com a transformação de uma pessoa humana num ser com poderes míticos que estão acima das normas sociais instituídas” (Tiza: 2004, p.16).
A máscara acaba por despertar valores sobrenaturais no próprio mascarado que se transforma num ser superior, gozando de uma força e liberdade sem paralelo, colocando-se, de acordo com o autor, “acima de toda a lei humana, como se tratasse de um ente sagrado mas possuído pelo diabo”. (Tiza: 2004, p.19).
Esta diabolização do humano, de que nos fala Tiza, está patente em atitudes que nas suas palavras “dá largas às suas faculdades de destruir e de castigar, de troçar e de acariciar, de dançar e de gritar, a seu bel-prazer”. (2004, p.20).
Tiza (2004), a título de exemplo, refere que os Caretos de Podence se enquadram nas anteriores funções a que nos referimos.
As atitudes tomam o lugar de expurgação e castigos dirigidos aos elementos da comunidade através das conhecidas “chocalhadas”, bastante violentas, muitas vezes propiciatórias e tomando atitudes licenciosas para com as mulheres.
Não podemos esquecer a organização social muito definida nesta região, uma vez que, na opinião de Rocha (citado por Maciel) os comportamentos sociais, como o próprio nome indica, são o produto da organização e da relação, uma vez que “a vida social, de uma comunidade é definida pelo funcionamento da estrutura social” (1998, p.73).
Sabemos da importância cultural que reveste a família nesta região, desde a família nuclear, até à família alargada que, muitas vezes, tem um alcance numérico surpreendente incluindo a maioria dos elementos da comunidade.
Maciel (1998) lembra-nos que a máscara está conotada com um lugar, com uma comunidade, fazendo parte dos costumes e das tradições. Podemos transpor esta afirmação para o caso dos Caretos de Podence, cuja tradição se delimita à localidade e comunidade de Podence, localidade onde a comunidade tem feito esforços por manter viva a sua tradição.
É necessário, e fundamental, preservar o património cultural de acordo com as indicações da UNESCO. Assim, compreendemos a necessidade de tornar público elementos culturais que traduzem a cultura do nosso povo. A preservação destes elementos no contexto em que se foram desenvolvendo, possibilitam uma preservação que nos parece estar de acordo com as pretensões do organismo internacional anteriormente referido. Um costume de grande significado como é o Carnaval desta região deve, na nossa perspectiva, ser igualmente preservado, tendo em vista a sua divulgação cultural, presente e futura.
O respeito e veneração pelo objecto sagrado que é a máscara, confirma a contextualização a que anteriormente nos referimos: “ (…) da máscara só pode vir sorte, quer para o povo, quer para os animais ou para a agricultura” (Maciel: 1998, p.81).
Não se pode, assim, estranhar o apreço que estes objectos representam para toda a população.
A máscara no mundo contemporâneo está associada a três grandes grupos, como nos diz António Cravo: “segundo a simbologia, a funcionalidade lúdica e o esvaziamento do seu conteúdo original” (Site: bragancanet, 2005, p.1).
O mesmo autor, em relação ao primeiro grupo, diz-nos que as máscaras estão integradas na própria cultura e na sociedade que lhe deram origem, dado que cada tipo de máscara não existe por si só, mas sim inserida num contexto social e cultural.
Seguindo esta ideia, verifica-se que a funcionalidade lúdica é referente ao espectáculo “a máscara deste grupo representa apenas uma personagem precisa e a sua estética resulta de normas bem definidas, variadas para o espectáculo” (Site: bragancanet, 2005, p.2.)
Este autor considera que no último grupo as “máscaras falsas, têm um conteúdo contextual quanto à cultura que teimam representar” (Site: brangancanet, 2005, p.2).
De facto, a máscara do Nordeste Transmontano está associada ao primeiro grupo, ou seja, o da simbologia, mostrando rituais pagãos como nos refere Tiza, lembrando as palavras do saudoso Abade Baçal e Padre Firmino Martins, que referem essa “infinidade de festas em honra dos Deuses protectores dos campos, dos trabalhos, das sementes, dos frutos, intempéries, doenças, dos lares, dos actos de casamento, da guerra, da morte!” (2004: p.261).
O mesmo autor refere outros casos em aldeias transmontanas que, em sua opinião, se associam à comemoração de ritos tidos como imprescindíveis, não só para a profilaxia dos males sociais, como ainda na preparação da natureza nas suas funções reprodutivas.

Mariana Especiosa do Rosário
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

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