Por: José Mário Leite
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)
Sempre!
Vinte e cinco de abril de mil novecentos e setenta e quatro é a conjugação de um binómio espácio-temporal único que, habitando as minhas memórias permanentes, inevitavelmente, revisito, com saudade, prazer e determinação. Todos os anos, ao longo de meio século, regresso, a esse lugar distante, mas presente, cristalizado, mas dinâmico, diluído, mas persistente com a urgência de o recriar. Foi um tempo mágico que, não existindo já, prevalece porém, de forma impressiva, nas insubstituíveis recordações dos lugares, das pessoas, mas, sobretudo dos sonhos, a um “Aleph” mágico prenhe de esperança e de desejos, a um cadinho onde sob o fogo dos receios calcinados e da fornalha das desilusões se fundiu e moldou a vontade determinada de ser livre e justo e democrata e fraterno.
O tempo foi delindo pormenores, alisando sonhos, desfazendo ilusões, caldeando enseios, modificando-me e mudando o mundo, mas uma parte de mim continua lá, nesse tempo, nesse lugar, nesse prodigioso encontro do tempo e do lugar, de onde é impossível arrancá-la. Nessa manhã estremunhada, calcorreada pela terra batida de acesso ao Liceu, revelou-se na incredulidade inicial, espreitando pelas janelas do novo Liceu, os veículos militares do Batalhão de Caçadores n.º 3 a apontarem os seus canhões para o lado do castelo onde, diziam, haveria um foco de resistência ao Golpe de Estado que, sabia-se então, ainda de forma muito empírica, acabara de acontecer em Lisboa. Haveriam de sair, eles, em coluna, para dominar uma fação conservadora em Chaves, depois de tranquilizados pela rendição efémera da unidade da Polícia de Segurança Pública, e nós, com cartazes improvisados de cartolina, desaguávamos no centro do mundo, junto ao pelourinho, entre o Chave D’Ouro, o Cruzeiro e o Flórida, dando vivas à Liberdade, exigindo o fim da guerra e o regresso dos soldados de paragens para onde mais ninguém pudesse ser mobilizado e reclamando o fim da censura e da PIDE.
Por motivos profissionais celebrei os cinquenta anos do vinte e cinco de abril, em Odense, na Dinamarca, a milhares de quilómetros de Bragança, mas presente, em espírito, na capital do nordeste e, igualmente, com o pensamento, como em 74, na capital do país. Então, andava já eu, de “Cravo na Boca”, agora tinha-o eu, orgulhosamente ao peito, despertando a curiosidade de amigos e conhecidos. Os mais informados davam-me os parabéns pela singular comemoração revolucionária, os mais curiosos perguntavam-me pelo significado das felicitações recebidas, mas, sobretudo, o cravo que trazia no bolso do casaco, sobre o coração foi motivo de identificação e reunião dos vários portugueses, igualmente presentes no certame.
Ao final do dia a RTP presenteou-me com uma reportagem histórica, avivando-me a memória, trazendo-me de volta pessoas, tempos, lugares, sonhos e propósitos. E uma reflexão, gerada nas explicações sobre esta revolução inédita: Em Portugal, as armas saíram à rua não para impor qualquer sangrenta ditadura militar mas antes para “impor” uma democracia plena e livre. Por isso mesmo, dos canos das espingardas não saíram balas mas entraram cravos. Por isso o símbolo que, em mim, ao longo de meio século de vida, me desceu da boca para o peito.
Vinte e cinco de abril de mil novecentos e setenta e quatro é a conjugação de um binómio espácio-temporal único que, habitando as minhas memórias permanentes, inevitavelmente, revisito, com saudade, prazer e determinação. Todos os anos, ao longo de meio século, regresso, a esse lugar distante, mas presente, cristalizado, mas dinâmico, diluído, mas persistente com a urgência de o recriar. Foi um tempo mágico que, não existindo já, prevalece porém, de forma impressiva, nas insubstituíveis recordações dos lugares, das pessoas, mas, sobretudo dos sonhos, a um “Aleph” mágico prenhe de esperança e de desejos, a um cadinho onde sob o fogo dos receios calcinados e da fornalha das desilusões se fundiu e moldou a vontade determinada de ser livre e justo e democrata e fraterno.
O tempo foi delindo pormenores, alisando sonhos, desfazendo ilusões, caldeando enseios, modificando-me e mudando o mundo, mas uma parte de mim continua lá, nesse tempo, nesse lugar, nesse prodigioso encontro do tempo e do lugar, de onde é impossível arrancá-la. Nessa manhã estremunhada, calcorreada pela terra batida de acesso ao Liceu, revelou-se na incredulidade inicial, espreitando pelas janelas do novo Liceu, os veículos militares do Batalhão de Caçadores n.º 3 a apontarem os seus canhões para o lado do castelo onde, diziam, haveria um foco de resistência ao Golpe de Estado que, sabia-se então, ainda de forma muito empírica, acabara de acontecer em Lisboa. Haveriam de sair, eles, em coluna, para dominar uma fação conservadora em Chaves, depois de tranquilizados pela rendição efémera da unidade da Polícia de Segurança Pública, e nós, com cartazes improvisados de cartolina, desaguávamos no centro do mundo, junto ao pelourinho, entre o Chave D’Ouro, o Cruzeiro e o Flórida, dando vivas à Liberdade, exigindo o fim da guerra e o regresso dos soldados de paragens para onde mais ninguém pudesse ser mobilizado e reclamando o fim da censura e da PIDE.
Por motivos profissionais celebrei os cinquenta anos do vinte e cinco de abril, em Odense, na Dinamarca, a milhares de quilómetros de Bragança, mas presente, em espírito, na capital do nordeste e, igualmente, com o pensamento, como em 74, na capital do país. Então, andava já eu, de “Cravo na Boca”, agora tinha-o eu, orgulhosamente ao peito, despertando a curiosidade de amigos e conhecidos. Os mais informados davam-me os parabéns pela singular comemoração revolucionária, os mais curiosos perguntavam-me pelo significado das felicitações recebidas, mas, sobretudo, o cravo que trazia no bolso do casaco, sobre o coração foi motivo de identificação e reunião dos vários portugueses, igualmente presentes no certame.
Ao final do dia a RTP presenteou-me com uma reportagem histórica, avivando-me a memória, trazendo-me de volta pessoas, tempos, lugares, sonhos e propósitos. E uma reflexão, gerada nas explicações sobre esta revolução inédita: Em Portugal, as armas saíram à rua não para impor qualquer sangrenta ditadura militar mas antes para “impor” uma democracia plena e livre. Por isso mesmo, dos canos das espingardas não saíram balas mas entraram cravos. Por isso o símbolo que, em mim, ao longo de meio século de vida, me desceu da boca para o peito.
José Mário Leite, Nasceu na Junqueira da Vilariça, Torre de Moncorvo, estudou em Bragança e no Porto e casou em Brunhoso, Mogadouro.
Colaborador regular de jornais e revistas do nordeste, (Voz do Nordeste, Mensageiro de Bragança, MAS, Nordeste e CEPIHS) publicou Cravo na Boca (Teatro), Pedra Flor (Poesia), A Morte de Germano Trancoso (Romance) e Canto d'Encantos (Contos), tendo sido coautor nas seguintes antologias; Terra de Duas Línguas I e II; 40 Poetas Transmontanos de Hoje; Liderança, Desenvolvimento Empresarial; Gestão de Talentos (a editar brevemente).
Foi Administrador Delegado da Associação de Municípios da Terra Quente Transmontana, vereador na Câmara e Presidente da Assembleia Municipal de Torre de Moncorvo.
Foi vice-presidente da Academia de Letras de Trás-os-Montes.
É Diretor-Adjunto na Fundação Calouste Gulbenkian, Gestor de Ciência e Consultor do Conselho de Administração na Fundação Champalimaud.
É membro da Direção do PEN Clube Português.
Sem comentários:
Enviar um comentário