Daniel Tiepolo aguarda uma resposta há três anos. Em 2021 deixou o Brasil e entrou no mestrado no Politécnico de Bragança. Queria ficar na região a trabalhar, por isso solicitou, ao na altura ainda SEF, um título de residência. E foi aí que deu início a um processo que ainda hoje não está concluído e que mal imaginaria que viesse a ser uma grande dor de cabeça. “Já recebi contratos de trabalho e não consigo, porque o empregador não quer contratar alguém que não tenha residência formal. Há um ano o SEF lançou o CPLP e os empregadores aceitaram. No entanto, o meu CPLP vai caducar no próximo mês e a minha empregadora pergunta-me como estará a minha situação e vim à AIMA e disseram-me que não sabem o que vai acontecer”, contou.
Segundo o presidente da Associação de Estudantes Brasileiros do IPB, Gabriel Cangussu, este é um problema “recorrente”. São vários os pedidos de ajuda de alunos por terem problemas em conseguir um agendamento para o título de residência ou para conseguirem o CPLP. “Há estudantes que entram em contacto com a nossa associação com problemas de que não conseguem o agendamento, há outros que raramente conseguem o CPLP, que é basicamente um documento que se imprime com um QR no meio e que não é aceite noutros países”, adiantou.
Há cerca de um ano, o Governo criou a autorização de residência CPLP, documento que garante que os imigrantes vivem no país. No entanto, impede que as pessoas circulem pela Europa. A União Europeia já emitiu um comunicado referindo que iria processar Portugal pela ilegalidade destas autorizações.
Mas não são apenas alunos do IPB a passar por esta situação. Marcelo Anjos, professor na Universidade Federal do Amazonas, veio fazer o pós doutoramento para o IPB. Como os prazos eram apertados, decidiu vir e a partir daqui emitir o visto. Passaram 10 meses e até agora não conseguiu. “Há uma série de limitações para eu transitar dentro a União Europeia, porque eu tenho muitas reuniões com outros lideres de investigação e eu não consigo, às vezes, participar nas reunião presencialmente noutros países, porque estou restrito a ficar em Portugal”, disse.
Uma situação que afecta brasileiros, mas também africanos. No entanto, Dionísio Mendes, da Associação de Estudantes Africanos do IPB, apontou ainda outro problema, a dificuldade de obter comprovativo de residência na junta de freguesia. “Uma das dificuldades é a obtenção do comprovativo de residência. Para isso é preciso duas testemunhas de nacionalidade portuguesa, que é muito difícil, porque é muito complicado uma pessoa testemunhar por quem não conhece”, referiu.
Nos últimos três anos, a Junta de Freguesia da Sé, Santa Maria e Meixedo, com sede na cidade de Bragança, já atribuiu “15 mil atestados de residência a estrangeiros, dos quais 10 mil permanecem na região”.
Os advogados e solicitadores são muitas vezes a ponte entre os estrangeiros e a AIMA. Ajudam na recolha da documentação e acompanham o processo, mas também se vêem de pés e mãos atados, porque assim que a documentação entra na AIMA nada mais podem fazer senão esperar. A solicitadora Joana Silva tem sido procurada por brasileiros, mas também pessoas que vêm da India, Bangladesh e Paquistão. No entanto, admite que a situação só piorou com a reestruturação do SEF. “A AIMA não foi bem organizada, tem muitas falhas, tem baixa de funcionários para o IRN. Não quero dizer que a AIMA foi um projecto falhado, mas está quase nesse ponto, porque ninguém consegue trabalhar com estes sistemas que estão constantemente a dar erro e a não funcionar”, apontou.
Em Março, a AIMA, a Ordem dos Advogados e a Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução celebraram um protocolo de cooperação para ajudar na regularização dos cerca de 300 mil processos pendentes. Vai ser aberto um concurso público para advogados e solicitadores concorreram a uma bolsa, facilitando na resolução dos processos que têm anos de atraso.
Há mais de duas semanas contactámos a AIMA, via email, para obter esclarecimentos sobre os títulos de residência e o motivo do atraso. Tentámos também ligar para o contacto disponível no site, mas até agora não tivemos qualquer resposta.
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