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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Ribeiro Telles - «O grande problema do país é a morte das aldeias»

Numa conversa que decorreu nos jardins da Fundação Calouste Gulbekian, o arquitecto paisagista falou sobre o país, os problemas de planeamento das grandes urbes, a desertificação das aldeias. Para o antigo ministro da Qualidade de Vida, os governantes conhecem mal o país, o território e, em especial, o mundo rural. «É preciso que os responsáveis pensem mais no país, menos nas finanças e reflictam na economia do planeamento para o desenvolvimento das gentes». De acordo com Gonçalo Ribeiro Telles há que recuperar a «autenticidade das coisas».
Num momento em que Portugal vive uma crise económica e social, o arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles, que completa 90 anos em Maio deste ano, começa por dizer que o principal problema do país «é a falta de informação e a cultura das pessoas, transversal na sociedade portuguesa».

«Desde as camadas superiores, mais intelectualizadas até às mais profundas, de ligação à terra e aos lugares, essa falta de cultura continua à vista», argumenta, recordando que Portugal «vive uma crise de valores».
Refere que o fosso entre o Litoral e o Interior continua a aumentar. «A quem se deve o desaparecimento e a degradação das aldeias?», questiona, sublinhando, em seguida, que tal se deve «a toda uma política de organização do desenvolvimento planeada para a destruição do país e à preocupação em considerar a ruralidade como qualquer coisa do passado sem futuro».
«Criámos uma ruína. É preciso que os responsáveis pensem mais no país e menos nas finanças. Que reflictam mais na economia do planeamento para desenvolvimento das gentes, das potencialidades e da nossa posição quanto ao mundo», apela Gonçalo Ribeiro Telles.
E considera que «se estão a construir cidades só por construir e a criar não o vazio do espaço, mas o vazio do espaço construído». Sobre o interior, salienta que as aldeias «não podem despovoar-se como está a acontecer» e frisa que «dentro de pouco tempo, isto é um país de velhos, de asilos urbanos». Por isso defende que a recuperação das aldeias «tem de passar pelo restabelecimento da agricultura local».
E não tem dúvidas: «hoje, o grande problema do país é a morte das aldeias, que é também um problema de cidades».
E explica porquê: «o aglomerado urbano, que vive do abrigo, do encontro das pessoas, do tecto, do ambiente é a cidade. Mas isso também existe e tem de existir na aldeia. A dimensão é que é diferente. O que está aqui em causa não é a cidade, que dentro de pouco tempo terá 80% da população a viver nela. As aldeias não podem despovoar-se como está a acontecer».
O arquitecto recorda que com os actuais modelos de Planos Directores Municipais (PDM’s) não há recuperação urbana das aldeias para as pessoas mas apenas «a recuperação de algumas aldeias para o turismo».
«Mas não há turismo sem aldeões. Estamos completamente errados. A recuperação das aldeias passa pelo restabelecimento da agricultura local. E isso é o que não se quer», afirma.
Para Ribeiro Telles, o crescimento urbano deu-se baseado na ideia de um enriquecimento a curto prazo. «Ninguém apostou, por exemplo, na agricultura. E grande parte da industrialização deu-se também devido a isso. As políticas não eram autênticas em função das gentes. Onde é que está a funcionar a agricultura em termos nacionais? E o povoamento do território? Não está nem nos programas dos partidos nem dos governos. Tem apenas os limites de um jogo financeiro», frisa.
Para o arquitecto, o chamado «regresso à terra», «não é um regresso para férias nem para fazer agricultura de recreio», mas tem de ser uma «aposta no investimento das escolas, que estão a fechar, na circulação de todo o movimento que se tem de fazer em qualquer região».
Para isso, vinca, «é preciso criar gradualmente as condições. Se não for possível, temos o caos. Não conhece os subúrbios das cidades? Aí está o exemplo de caos», diz.
«Temos utilizado mal os nossos recursos»:
Sobre a Reserva Agrícola Nacional (RAN), a Reserva Ecológica Nacional (REN) e os PDM’s, que Ribeiro Telles impulsionou no início dos anos 80 do século passado, o também engenheiro agrónomo, realça que os dois primeiros diplomas «tiveram uma má aplicação, muitas vezes, por incompetência de quem fazia o planeamento e incompreendida pela maior parte dos autarcas, que não viam naqueles diplomas uma vitória eleitoral a curto prazo, em parte, pela pressão do investimento que os bancos realizavam para determinadas entidades, e deu no que deu».

«O mal está à vista. Continuamos a falar da floresta, da expansão urbana, do crescimento das cidades. Mas isso não se vê», salienta.
E prossegue, dizendo que «não há uma planificação global em face das possibilidades e virtudes do território. E não há povoamento».
Sobre a utilização dos PDM’s, Ribeiro Telles refere que estes instrumentos foram criados como «algo necessário para a defesa dos melhores solos agrícolas de que depende a existência do povoamento e a existência do país».

«Mas foi muito desvirtuada por muitos políticos e programas, porque não viam o essencial na autenticidade do país. Além disso, o PDM não servia a rápida expansão urbana nos sítios mais fáceis, mais planos e nos lugares mais urbanos», acrescenta.
A juntar a tudo isto, o arquitecto garante que «temos utilizado mal os nossos recursos». E os exemplos de má utilização são muitos, de norte a sul do país, e principalmente, «têm-se acelerado a má utilização dos recursos porque não se acredita nas «gentes», que estão – ou deviam estar – ao serviço da Humanidade e com uma identidade própria».
Recorda que «todas as coisas no nosso mundo têm uma autenticidade e que é sempre possível recuperar». «Uma coisa autêntica é aquela que tem um passado, que tem alicerces e que tem também um presente que se vê, que se sente. Não há presença nem autenticidade sem futuro», avisa.
E lembra que há três elementos fundamentais para os países, incluindo Portugal, se manterem como tal: «os lugares, as potencialidades e os recursos que nos dá a Terra-mãe e as suas gentes. Havendo estas três condições há lugar à autenticidade e à criação».
Recorde-se que o Centro Nacional de Cultura, que Gonçalo Ribeiro Telles ajudou a fundar, homenageou o arquitecto em Dezembro de 2011. À iniciativa que decorreu na Fundação Calouste Gulbenkian, acorreram dezenas de figuras dos mais variados quadrantes da sociedade portuguesa. Destacaram o trabalho desenvolvido pelo arquitecto em várias áreas, nomeadamente nas questões do ordenamento do território e do uso da terra em Portugal.

Ana Clara
in:cafeportugal.net

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