segunda-feira, 14 de abril de 2014

O Meu País é o Centro do Mundo

Nota introdutória: Quando aceitei escrever este artigo de opinião era meu intuito falar de Portugal principalmente como destino turístico, puxando pelas Glórias do Passado e pelos inúmeros motivos de interesse turístico existentes no Portugal Moderno, como sendo, a arquitectura e artes em geral, a cultura, a gastronomia, a sociedade moderna nas diferentes vertentes, etc. Acontece que me fui deixando levar noutras direcções fora do meu âmbito profissional. Decidi deixar como está na esperança de que a leitura não seja para vós simples perda de tempo.

Estou farto de ver deixada aos estrangeiros a despesa dos elogios ao meu país e de ver compatriotas ociosos por convicção a assumir de forma sistemática a despesa de críticas acéfalas e destrutivas. Fizeram escola estudos sobre a inteligência emocional, tendo Daniel Goleman escrito, há mais de vinte anos, uma importante tese sobre o assunto. Quando se trata de relações tão próximas como as entre Pais ou Pátrias e os seus filhos, é importante somar à capacidade de análise crítica equilibrada uma boa dose de inteligência emocional. A inteligência emocional tempera as conclusões tornando-as mais profundas ao passarem a considerar um elemento menos científico mas mais profundo, no sentido da essência dos povos e dos seres humanos que os formam. Por isso, digo com convicção:- O meu país é o Centro do Mundo!

Se eu, como português, não consigo olhar e ver na História de Portugal as páginas de glória apenas comparáveis a muito poucos outros países em todo o mundo e em todos os tempos, que podemos esperar? A cobardia tem um preço amargo que eu não estou disposto a pagar. Prefiro gritar, olhando em frente, como fizeram os descobridores portugueses quando tiveram que se confrontar com os próprios medos e os venceram. Camões descreve, como só ele, nas estrofes sobre o Adamastor em que conta como a fúria deste pela rejeição do seu amor pela nereida Tétis leva Júpiter a castiga-lo, transformando-o no Cabo das Tormentas. Que páginas de glória! Vasco da Gama e os seus homens no meio das tormentas aguentando as vagas de um “mar tenebroso” é colocado ao nível dos deuses e vence o mar e vence os medos. Ao longo da nossa História os portugueses lutaram, perderam e ganharam. Forjaram Impérios, contaram riquezas e cantaram glórias. Subiram aos píncaros e desceram aos infernos. E fizeram palácios… e castelos… e ruinas. Dividiram o mundo mesmo antes de o ganhar. E eram apenas uns centos de milhar de homens válidos. Tão poucos e tão Grandes!

Antes de nós, outros pequenos povos foram grandes, tão grandes que, não fora a sua grandeza, como a nossa, alguns dos hoje ditos grandes não passariam de espaços geográficos. Penso nos gregos, primeiro que tudo nos gregos, mas outras grandes civilizações tiveram merecimento, como, por exemplo, os romanos que com os gregos souberam aprender. E, muito, penso muito em nós portugueses.

“Se és grande porque te apoucas?” Não se é pequeno quando apenas um milhão de almas (velhos e crianças incluídos) aperfeiçoaram técnicas de orientação e de navegação fazendo que soprassem a favor os ventos contra. Não se é pequeno quando se dão Novos Mundos ao Mundo formando um network de comércio global e fazendo assim a primeira globalização da história. Não se é pequeno quando se consegue, contra ventos e marés, manter um império cobiçado por todas as potências. Não se é pequeno quando se consegue manter uma fronteira praticamente intacta, resistindo, sempre em inferioridade numérica, aos intentos do invasor. Não se é pequeno quando o nome Portugal está presente e indelevelmente escrito e apreciado nos cinco continentes. Não se é pequeno quando se derrubam ditaduras com cravos e com sorrisos. Não se é pequeno quando em português se escreveram páginas das mais belas da literatura universal. Não se é pequeno quando se é compatriota de Camões, de Garret, de Pessoa, de Saramago ou Lobo Antunes, para citar apenas uns poucos ligados à literatura. Não se é pequeno quando se suportam os tempos de chumbo e se sobrevive pronto a enfrentar novos desafios.

A História só merece esse nome quando resiste ao escrutínio do tempo. O que muitos pensam serem actos políticos importantes num determinado momento caem, quase sempre, numa irrelevância total. Outros, que pareceram quase irrelevantes quando praticados, tiveram efeitos práticos e repercussões futuras que levaram a História a incluí-los na sua lista restrita. Não sendo possível referir a maior parte dos heróis nacionais, até porque os anónimos que mereceriam citação seriam mais, muitos mais, não posso nem quero deixar de referir nomes sem os quais Portugal, o nosso querido Portugal não existiria, pelo menos como é. Desde logo, Afonso Henriques, de cuja obra nasceu Portugal, mas que dificilmente teria dados consistentes que lhe permitissem sequer imaginar o resultado da obra iniciada. Ficou, já então, clara a nossa capacidade para abraçar causas e juntar vontades. Um certo jeito nato para, em situação de dificuldade ou mesmo de desvantagem, congregar interesses de outros para somar as suas às nossas forças e retirar a melhor parte do esforço colectivo.

Merece referência a crise de 1383 a 1385. Com a Morte de D. Fernando sem outro herdeiro que não fosse a sua filha D. Beatriz, entretanto casada com D. João I de Castela e Leão, Portugal perdeu a independência. A Batalha de Aljubarrota teve como fim primeiro recuperar a independência perdida. O exército português comandado por Nuno Alvares Pereira e com o apoio dos Ingleses bateu o exército de Leão e Castela que incluía milhares de franceses e onde a desvantagem numérica para Portugal era de cinco para um. A extraordinária vitória de Aljubarrota foi um dos actos heróicos mais justamente celebrados. As consequências desta acção foram várias e muito duradouras: desde logo, libertar o país do jugo espanhol; estabelecer a Dinastia de Avis colocando no trono D. João, Mestre de Avis como D. João I; aprofundar a aliança com Inglaterra pelo casamento de D. João I com D. Filipa de Lencastre, pais da Ínclita Geração, que tantas glórias deu a Portugal.

Terminada a consolidação do território continental, tendo como vizinho um aliado intermitente, restava-nos o mar. Com o Infante D. Henrique se forjaram os Descobrimentos, momento maior da nossa História. Claro que a História é selectiva e, não cabendo lá tudo, rejeita a parte que, aparentemente, menos nos engrandece. Refiro-me à supressão em alguns compêndios da referência à prática da pirataria. Essa prática era uma forma legal de subsistência, desde que se respeitassem as naus aliadas. Sem o pecúlio proveniente dessa actividade não teria sido possível desenvolver as técnicas de navegação nem afinar a coragem dos homens.

Nesses tempos de glória são tantos os nomes que merecem referência que só assumindo por antecipação a impossibilidade de referir sequer os essenciais, podemos aceitar mencionar alguns nomes exemplares: D. João I e D. Filipa de Lencastre; Infante D. Henrique, Vasco da Gama, Alvares Cabral, Fernão Magalhães, Afonso de Albuquerque, Bartolomeu Dias e tantos, tantos outros.

Entretanto, em 1494, foi dividido o mundo entre Portugal e Espanha pelo tratado de Tordesilhas. Esta primeira divisão do mundo teve por base interesses estratégicos de ambos os países, já que ambos sabiam algo mas nenhum deles sabia tudo sobre os conhecimentos e interesses do outro. Por isso foi tão pacífico. Cristóvão Colombo ao serviço dos reis de Espanha tinha descoberto a América quando pensava ter chegado à Índia; por seu lado Portugal mantinha segredo sobre a descoberta do Brasil, mas, mais importante para Portugal era a salvaguarda das rotas marítimas que lhe deixassem livre o caminho marítimo para o oriente pela costa sul de África. Assim, em defesa de “todos” os interesses de ambas as partes, pelo tratado de Tordesilhas, foi traçada uma linha imaginária a 370 léguas a oeste de Cabo Verde, já então colónia portuguesa, ficando acordado: as terras descobertas ou a descobrir a este desta linha pertenciam a Portugal e as descobertas ou a descobrir a oeste pertenciam a Espanha.

A empreitada dos Descobrimentos foi ponto de partida para o desenvolvimento de ciências exactas, de conhecimento de nova geografia e de novos povos. Revolucionou a ideia que até então se tinha da palavra mundo. Foi, igualmente, ponto de partida para a Moderna Ciência que atingiu o seu auge já no seculo XVII. Não podemos deixar de mencionar o nome de Pedro Nunes quando falamos de ciência ligada aos descobrimentos.

Homens como João de Barros, Fernão Mendes Pinto e Luís de Camões merecem um destaque especial. Graças a eles ficámos com registos, mais ou menos fantasiosos, dos novos mundos que os portugueses deram ao mundo e de como Portugal se tornou o país mais rico da Europa e um dos mais ricos do mundo e Lisboa na mais cosmopolita cidade europeia “cidade de muitas e desvairadas gentes”.

D. Sebastião merece uma reflexão atenta. O seu desaparecimento prematuro em Alcácer Quibir em 1554 foi o início de um período particularmente complicado para Portugal com a perda da soberania para Espanha. Este acontecimento permitiu que os Filipes, somando o Reino de Portugal a Espanha se transformassem não apenas nos reis mais poderosos mas também nos mais ricos do mundo. Com a morte de D. Sebastião seguida de todo o tipo de vicissitudes que pareciam não ter fim, criou-se o mito do encoberto, que o povo acarinhou como janela de esperança. Segundo ele, D. Sebastião apareceria numa manhã de nevoeiro para resgatar Portugal do jugo externo. Este mito mantem-se hoje, como então. Se lhe somarmos o mito do velho do Restelo, os dois mitos simbolizam, no seu conjunto, uma das facetas mais negativas dos portugueses enquanto povo: por um lado, os velhos do Restelo são gente (mesmo que jovem) que nasceu vencida, para quem de nada vale remar contra a maré porque estamos derrotados à partida; Os sebastianistas, por razões quase opostas, também pensam que não vale a pena fazer grandes esforços porque um dia há-de chegar, envolta em nevoeiro, a solução para os problemas do país. Um mito só já seria muito mau, os dois juntos são veneno puro que urge contrariar com antidoto eficaz.

Como D. Sebastião não veio e, felizmente, nem todos são velhos do Restelo, fartos da delapidação do património português por parte de Filipe III e de sermos implicados em guerras que apenas interessavam a Espanha, deu-se o movimento da Restauração que em 1640 põe no poder em Portugal D. João, Duque de Bragança como D. João IV, primeiro rei da dinastia de Bragança.

Resolvida a questão da soberania nacional, os Braganças não souberam criar novos desígnios para Portugal e a Pátria nem sempre esteve na linha da frente das preocupações dos governantes. O ambiente ocioso na corte suportado pelas riquezas que ainda continuavam a afluir permitiam um conforto propício ao aumento de apetites desmesurados, alianças que se faziam e desfaziam ao ritmo dos caprichos e das intrigas palacianas. O povo foi perdendo o respeito pela instituição monárquica na mesma medida em que os monarcas iam desprezando esse mesmo povo. Exemplo eloquente, o desabafo do D. Carlos para os amigos de cada vez que tinha que deixar Paris para regressar às suas responsabilidades como rei de Portugal: “cá vamos nós, de regresso à piolheira”. Este tipo de ambiente e de atitudes eram já o prenúncio do fim da monarquia. Os longos períodos de decadência esvaziaram os cofres e contaminaram a sociedade. Já nos tinha sido dito e é bem verdade que, “fracos reis tornam fraca a forte gente”.

Na primeira metade do século XX, enquanto a monarquia agonizava e surgia a Primeira República, o desgoverno e a miséria destes tempos foi pouco mais que trampolim de acesso para a ditadura de Salazar. O ambiente geral na Europa não ajudava, antes pelo contrário. Desfizeram-se impérios, houve duas guerras mundiais, na Espanha uma guerra fratricida semeou miséria material e moral. Tudo isto no nosso quintal e com consequências devastadoras para Portugal. A maior parte da Europa foi destruída e reconstruída duas vezes. E Portugal, ao ser aparentemente poupado, também nunca foi chamado ao esforço da reconstrução do país, ato que exige pesados sacrifícios, mas que tempera forças, cria coesão nacional e forja duradouras dinâmicas de progresso. Por comparação com os países directamente afectados pelas guerras, Portugal foi definhando na vil tristeza duma ditadura também ela vil e triste, acomodados sob a teoria dos “pobres mas honrados”. Finalmente, a 25 de Abril de 1974, um grupo de jovens militares decidiram dizer basta às mortes numa guerra colonial da qual muitos discordavam e outros não tinham a ela suficiente adesão ideológica.

A Revolução do 25 de Abril foi exemplar a muitos níveis. Desde logo, pela forma, Revolução dos Cravos. Criou esperança e espectativas novas. Pôs fim à ditadura do Estado Novo. Pôs um ponto final na guerra colonial e garantiu a independência às Colónias Ultramarinas. O golpe militar surpreendeu quase todos, mas todos tentaram apropriar-se politicamente dos acontecimentos e aqueles que não se tinham ainda organizado em partidos políticos fizeram-no sem demora. Foi instaurada a democracia parlamentar. O povo continuou pobre e ignaro.

Perdidas as colónias e livres do estigma de país colonialista virámo-nos para a Europa que nos acolheu de forma inicialmente solidária. Como bom aluno da Europa, Portugal foi, de forma lenta mas irreversível, destruindo a sua desactualizada máquina produtiva, em vez de lutar pela sua modernização. Á Europa importava garantir mercado sem se preocupar com os desequilíbrios que provocava e de que ela própria viria a ser vítima. Assim, destruímos agricultura, pescas e indústrias tradicionais e fomos ficando mais pobres, na medida em que mais dependentes. Este período de políticas erradas somado a séculos de paralisia da sociedade, fizeram com que as populações em geral aceitassem como bom o que era mais cómodo e ficaram sentados a ver passar o tempo e as oportunidades. Portugal foi sendo governado, muitas vezes, por políticos sem estratégia nem sentido patriótico. Neste ambiente que infelizmente se prolonga sem prazo de validade, quando surge algum político capaz, com sentido patriótico e uma estratégia para Portugal, as máquinas do imobilismo tendem a cerrar fileiras para derrubar quem está, mudando qualquer coisa para garantirem que tudo fica na mesma.

As políticas empreendidas ao longo da nossa longa História são extremas e contraditórias, mas ricas de lições e ensinamentos. Não se constrói futuro sólido fazendo tábua rasa do passado. Por isso vos convido a meditar nos muitos fracassos colectivos, mas igualmente nos momentos de glória. Dos fracassos devemos tentar compreender as causas para tanto imobilismo e tentar contrariá-las. Os momentos de glória fazem bem ao ego e devem ser acarinhados e mantidos vivos na nossa memória colectiva para serem exibidos de forma convicta e orgulhosa a nós mesmos e ao mundo.

São duros os tempos que vivemos mas havemos de sobreviver, e mais fortes. Para tanto, cabe-nos, a todos nós portugueses, recusar o medo e o imobilismo que nos mantem reféns de nós mesmos. Olhar nos olhos o “Adamastor” e seguir em frente porque o nosso país é o centro do mundo. Acreditem que é verdade: – O Nosso País é, mesmo, o Centro do Mundo.

P.S.: Hoje é dia 10 de Abril de 2014, a escassos quinze dias de se celebrar o 40º aniversário da revolução dos cravos. Há pouco, na antena da TSF o tema era a tentativa, por parte do poder instituído, para evitar que os Capitães de Abril pudessem usar da palavra na sessão solene da comemoração dos quarenta anos do 25 de Abril na casa da democracia, democracia essa que se deve em grande parte a esses militares que se pretende silenciar. É triste ver como, frequentemente, Portugal maltrata os seus melhores. Quando alguns enchem a boca afirmando que o melhor de Portugal é o povo, lembro-me que, não raro, esses são a parte má do povo bom.

por Publituris
in:Publituris.pt

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