terça-feira, 23 de abril de 2013

39 Anos Depois


25 de Abril. Portugal acorda mais tarde, ao som da Grândola, das bandas que dão melodia às vilas e aldeias, cheirando o perfume gasto de cravos que apodreceram. Passaram já 39 anos sobre a Revolução que, um dia, libertou Portugal de um poder violento, cinzento, feito de silêncios opostos e arbitrariedades chocantes. Um dia, creio eu, há-de fazer-se a história destes 39 anos e, temo, vai chegar-se à conclusão de que os ideais de Abril, os verdadeiros ideais de liberdade, igualdade e justiça, continuam por cumprir… Há 39 anos, Portugal sofria com uma guerra colonial que, acontecendo longe, matava a força deste país levando os jovens para um mundo de sangue e ódio de onde, muitas vezes, voltavam em caixões negros. Ao mesmo tempo, neste retângulo continental, vivia-se o medo e a violência. Escrever não era permitido, falar podia dar prisão e tortura, sonhar acontecia em segredo… Por tudo isto, penso eu, o 25 de Abril representou para nós, portugueses, um mundo de esperança, um renovar de vida com sentido e oportunidades.
Na euforia da Revolução, depois de nos garantirem que nos tinha sido dada a liberdade e a democracia (algo que eu penso que não se pode dar porque é de uma constante conquista que se trata), veio a Europa. Parecia tudo perfeito! Aboliam-se as fronteiras, criavam-se laços fraternos com inimigos históricos, os grandes ajudavam os fracos e pequenos e íamos todos viver bem e ser felizes. Já havia quem se imaginasse a viver, se não à grande e à francesa (porque o Luís XIV há muito tinha batido as botas), à grande e à alemã. Foi a festa! Tudo parecia possível, o dinheiro era barato, os sonhos pareciam realizáveis e a responsabilidade, tal como a democracia, pareciam valores eternos e seguros. Ninguém, nestes 39 anos, se preocupou em formar cidadãos ativos, conscientes e responsáveis, ninguém recuperou a autoridade, ninguém se preocupou em educar para a cidadania e para a verdade. Por isso, num instante os sonhos se desfizeram contra uma parede feita de realidade agreste e empedernida. Agora, 39 anos passados, tudo está em causa, o medo voltou, a insegurança é uma constante, as injustiças imperam. Agora, este mesmo país eternamente adiado volta a ouvir Zeca Afonso cantando a Grândola Vila Morena e o povo, seja lá essa entidade o que for, encara quotidianos de instabilidade, violência sobre as famílias, desemprego e fome. Hoje, nesta data que devia fazer sentido, eu sinto uma desilusão enorme, uma revolta que me dilacera. Não foi para viver assim que aconteceu a Revolução de 1974!. Eu, assumidamente mulher de opções políticas de direita, defensora da verdadeira democracia cristã, não consigo compreender o sistema político que vigora no meu país e que, enquanto me sufoca de impostos, permite que haja cidadãos a ganhar mais de três milhões de euros por ano. É obsceno, é imoral. Os políticos de hoje, governantes que, na sua maioria, da esquerda à direita, fizeram carreira no que os Partidos têm de pior, não me inspiram confiança. Sequer respeito! Hoje, 39 anos depois de ter acreditado na mudança e na construção de um país melhor, desejo uma nova revolução. Feita não de palavras, mas de atos. Não de promessas, mas de conquistas reais. Não de cravos, mas de construções de novos quotidianos.
Muitas vezes digo, mais ou menos brincando, que Poder e Podre se escrevem com as mesmas letras… Hoje, já nem acho graça a esta brincadeira! Estou cansada de um poder podre, farta de mentiras e de existências adiadas. Hoje, 39 anos depois de Abril, em vez de ouvir a Grândola apetece-me ouvir John Lennon e “Imagine” porque o sonho é mesmo só o que me resta…

Maria Luísa Moreira
in:jornal.netbila.net

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