Castelo de Mirandela - Planta da porta na antiga muralha (1951) |
Em posição dominante sobre a povoação medieval, às margens do rio Tua, de sua estrutura, tragada pelo progresso, resta hoje apenas a Porta de Santo Antônio, um dos cartões-postais da cidade.
História
Antecedentes
Não foram identificadas informações acerca da primitiva ocupação de seu sítio, embora as pesquisas arqueológicas testemunhem a presença romana na zona, então um expressivo centro de produção agrícola.
O castelo medieval
A primeira referência documental a Mirandela testemunha a presença de Sancho I de Portugal (1185-1211) quando do cerco imposto a Bragança pelas forças de Afonso IX de Leão (1198).
Afonso III de Portugal (1248-1279) outorgou carta de foral à vila (25 de maio de 1250). Possivelmente data deste momento a edificação do primitivo castelo e da cerca da vila. As Inquirições de 1258 referem que o povoamento do local remontava ao reinado de Afonso II de Portugal (1211-1223).
A primeira grande campanha construtiva vivida pela vila data do reinado de Dinis I de Portugal (1279-1325). Por Carta-régia de 1282 ordenou a transferência da primitiva povoação de Mirandela, implantada no lugar do “Castelo Velho”, para o do “Cabeço de São Miguel”, mais elevado e onde atualmente se situa. O soberano concedeu novo foral à vila, fazendo delimitar os limites do seu concelho (Coimbra, 7 de março de 1291), e determinou levantar uma alcáçova e uma torre de menagem. Por volta de 1295 foi instituída uma feira e estava a ser levantada uma cerca para envolver a vila. O castelo, à época, era considerado uma das melhores fortificações de Trás-os-Montes.
No alvorecer do século XIV a vila e seu termo foram doados a Branca Lourenço, amante do rei:
“Em nome de Deus amen. Conheçam quantos esta carta virem e leer ouvirem que eu dom Deniz pella graça de Deus Rey de Portugal e do algarve com ho infante dom Afomso meu filho primeiro herdeiro dou e outorgo a vos Branca Lourenço a minha villa de Mirandella com todos seus termhos velhos e novos, dereictos e dereicturas, rendas, padroados e com todo o dereito e jur reall que eu ey e de direicto devo a aver em essa villa e em seus termhos velhos e novos e que vos ajades e possoyades em toda vossa vida. E se Deus tiver por bem que eu aja de vos filho ou filha ou filhas a vossa morte fique a dicta villa com todos seus termhos velhos e novos e pertenças e com todo dereyto reall ao filho ou filhos, filha ou filhas se ho eu de vos ouver. E mando e outorgo que aquel ou aquelles que dese filho ou filhos filha ou filhas se ho eu de vos ouver decenderem de dereicta linha liidimamente aja ou ajam a dicta villa com seus termhos velhos e novos e direictos e padroados como dicto he. E se esse filho ou filhos, filha ou filhas se o eu de vos ouver ou aquelles que delles descenderem de dereicta linha liidimamente morrerem sem filhos liidimos a sobredicta villa com seus termhos, padroados e dereictos torne-se aa coroa do Regno com todos seus melhoramentos livremente e sem embargo nenhum.
E esto vos faço por compra de vosso corpo. E todollos Reys de Portugal que depos mi veerem que aguardarem e manteverem esta doaçam que eu faço e nunca contra ella veerem em todo nem em parte ajam a beençam de Deus e a minha pera todo o sempre; e se alguns dos Reys de Portugal que depos mim veerem nom aguardarem e manteverem esta minha doaçam e contra ella veerem em todo ou em parte aja a maldiçam de Deus e a minha pera todo o sempre. E por esta doaçam seer firme e mais stavel e nunca viir em dovida dei a vos Branca Lourenço esta minha carta sellada do meu sello do chumbo.
Feita em Lixboa viinte e oyto dias de Joynho. El-Rey o mandou. Afomsso Martins a fez era de mil trezentos trinta nove annos.” (1301 de nosso calendário. In: Francisco Manuel Alves, Abade de Baçal, “Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança”, Bragança: Ed. Câmara Municipal de Bragança, 2000. Tomo IV, p. 443.)
Ainda no reinado de D. Dinis dispomos de notícia documental sobre o aforamento da alcáçova do castelo de Mirandela, doado pelo monarca a um Domingos Geraldes, em virtude do estado de abandono em que se encontrava o edifício, designado por "paaço del Rey" (1318).
Quando da Crise de Sucessão de 1383-1385 a vila e seu castelo tomaram o partido pelo Mestre de Avis, futuro João I de Portugal (1385-1433). (Fernão Lopes, “Crónica de D. João I”.)
Entre 1357 e 1448 Mirandela foi um dos castelos medievais a sofrer intervenções de conservação e reforço. Em 1401 dispomos de notícia de obras do muro e cava a decorrer por iniciativa régia, em virtude da guerra.
Manuel I de Portugal (1495-1521) outorgou-lhe o Foral Novo, passado em Lisboa, a 1 de julho de 1512.
Sob o reinado de João III de Portugal (1521-1557), a perda de importância estratégica da vila leva à ruína gradual da sua defesa, conforme registado no Censo de 1530: “A villa de Mirãdella he cerquada e a cerqua em partes deribada”.
Do século XVII aos nossos dias
Em 1688 um documento camarário, menciona o Postigo de São José, que se abria na muralha do castelo.
No início do século XVIII, registava-se que a vila era “murada ao uso antigo com debil muro em partes arruinado, e nelle tres portas" (COSTA, António Carvalho da. “Corografia Portuguesa e descripçam topographica do famoso Reyno de Portugal (...)”. 1706-1712.) Eram elas a Porta ou Arco de Santiago, a Porta de Santo António e o Postigo de São José. Outro autor coevo, Juan Álvarez de Colmenar, refere Mirandela como localizada às margens do rio Tuela, defendida por um castelo (“Les délices de l'Espagne et du Portugal”, 1715).
Com a perda de sua função estratégico-defensiva, e o desenvolvimento econômico da região, o progresso urbano rompeu a cintura de muralhas medievais, que deram lugar a ruas e novas residências solarengas, processo que se acelerou no último quartel do século XIX. Desse modo, regista-se o rebaixamento, em cerca de meio metro, do nível da rua no ponto da antiga soleira, para se proceder ao calcetamento e, no período de 1874 a 1884 vários troços importantes da muralha foram derrubados para a construção de habitações.
No início do século XX restavam duas das quatro portas originais, tendo uma delas sido destruída pelo município. Nesse período regista-se a construção de casas sobre as muralhas.
Em maio de 1950, a Câmara Municipal de Mirandela colocou uma placa no remate interior do arco da Porta de Santo António, comemorando o VII Centenário da elevação de Mirandela a vila. Ainda na mesma década, os remanescentes da cerca medieval, representados pela chamada Porta de Santo António, foram classificados como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto nº 40.361, publicado no Diário do Governo, I Série, nº 228, de 20 de outubro de 1955.
No final da década, a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN) promoveu intervenção de consolidação na zona protegida (1957, 1958 e 1968).
Mirandela foi elevada à categoria de cidade em 1984.
A Câmara Municipal de Mirandela, em 1991 e em 2000 promoveu obras de beneficiação do atual terraço do arco e das fachadas dos imóveis adossados, na face exterior da estrutura. Em maio de 2000 colocou uma nova placa no paramento interior do arco da Porta de Santo António, comemorativa dos 750 anos da elevação de Mirandela a vila.
Características
Da antiga fortificação dionisina, de implantação urbana, na cota de 228 metros acima do nível do mar, composta por alcáçova, torre de menagem e cerca da vila, restam-nos hoje apenas a Porta de Santo António, a remanescente de um conjunto de três que se rasgavam na cerca medieval da vila.
Ela é formada por dois muros espessos, sobre os quais assenta um arco com recorte quebrado na face exterior e de volta perfeita na interior, resultante do abobadamento da estrutura. A porta, na face interior, apresenta as dimensões de 5 metros de altura por 2,70 metros de largura. No paramento interior do arco, são visíveis ainda as pedras de granito com as aberturas onde girariam, em cima e em baixo, as coiceiras dos portões ferrados, distando, entre si, 2,40 metros. Sobre ela há vestígios do primitivo adarve, atualmente transformado em terraço de uma residência em mãos de particular. Por ela, a Rua de Santo António, a mais movimentada da vila medieval, comunicava-se com a ponte (erguida no século XVI) e com o rio.
É possível que a porta tenha sido reconstruída, uma vez que o aparelho construtivo da sua seção inferior, em granito, é substancialmente distinto do superior, em xisto, mas até que se realize um estudo rigoroso das parcelas sobreviventes, pouco se poderá concluir.
Defronte desta porta, a aproximadamente quinze metros de distância, abria-se outra, em um resto de barbacã, demolida em 1884, para, em seu lugar, se erguer um palacete da família Araújo Leite.
in:fortalezas.org
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