Primeiro, há que entender a comunicação, a sua necessidade ontológica, como processo de socialização, como atuam os órgãos de comunicação social, como comunicar acaba sempre por nos influenciar e em que termos a comunicação apela e se embebe do fenómeno estético. É um resumo muito bem elaborado que não deixará indiferentes todos aqueles que estudam Ciências da Comunicação, História e Literaturas.
O que está em causa na arte da memória é conhecer a fala do povo, a expressões da literatura oral, daqui saltando para o lendário duriense, andando à volta do conto, da lenta e do mito. Porque a antropologia da comunicação preza a literatura oral tradicional, seja ela para divertir, caricaturar ou criticar, seja ela para instruir ou ter força integradora dos membros na comunidade. As lendas têm um peso simbólico que ultrapassa a força do próprio texto. É aqui que cabe interpretar a arte da memória. De há muito que o autor estuda a região duriense, que lhe merece a seguinte menção: “Representa um desses espaços míticos, carregados de espiritualidade, onde o homem, na sua relação com os fenómenos naturais e culturais da paisagem, e sempre dominado pelas inquietações do sobrenatural, preceitos da religiosidade e preocupações agrolaborais, vai criando e alimentado os contos, as lendas e os mitos”. E procura aproximar o leitor do significado destas narrações orais: “Se os contos estão geralmente associados a saberes e valores que as gerações procuram transmitir muito à medida dos seus perfis ou conveniências éticas e estéticas, as lendas e os mitos resultam, claramente, de uma hermenêutica popular respeitante a realidades físicas e históricas muito concretas”. E para que não haja ilusões da vastidão do estudo, insiste-se que a região duriense tem sinais profusos de povos antigos, de cultos pagãos, da religiosidade cristã, é um espaço onde se conjugam formações megalíticas, vales profundos e escarpas assombrosas, tudo moldado pela sinuosidade dos rios.
Chegámos ao objeto do estudo, o património imaterial que é aquele onde mora a alma do povo e que integra a literatura popular de tradição oral (lendas, mitos, contos populares, romanceiros, cancioneiros, quadros, autos populares, advinhas, rimas infantis, orações, rezas, fórmulas de superstições e de mezinhas…), bem como saberes e vivências da cosmogonia popular (tais como os falares regionais, os ritos e as festas, os jogos, as danças, os saberes do artesanato, da culinária e dos trabalhos rurais e marítimos…). Aqui estamos nesse universo com serões à lareira, esconjuros às maleitas, recitações, teatro popular, festividades, rituais religiosos e pagãos, jogos tradicionais. De uma forma profundamente didática, o autor aproxima-nos, faz-nos ingressar no folclore obsceno, com as suas rimas infantis, poesia popular, provérbios, advinhas, orações com escárnio, mas também nos contos jocosos e divertidos. O autor observa o seu conteúdo: “O valor formativo destes textos reside na sua capacidade de promover o desenvolvimento psicossocial e cognitivo e, especialmente, a socialização da criança. A noção de pertença a um grupo é fundamental, e isso implica o conhecimento das regras e das tradições do grupo, o que passa pelo conhecimento dos seus contos, assim como dos seus jogos, das suas rimas maliciosas, orações com escárnio, etc.”; vamos depois até ao teatro popular, daqui seguimos para os contos de tradição oral e então o autor assenta arraiais nos ritos, nos mitos e nas mitologias. Dá-nos um fresco sobre o mito das mouras mortas, percorremos várias lendas até chegar os ícones sexuais e diabólicos, estão ali bem à vista as pouca vergonhas e até as tentações do diabo, salta-se depois para a “murra” do Natal (trata-se de um gigantesco canhoto de carvalho que arde noite fora no largo principal das aldeias mais puras do nordeste), daqui vamos até ao Menino Jesus da Cartolinha, saltamos para a tradição do entrudo onde pontificam os desfiles diabólicos de “caretos”, “matrafonas”, assim como as leituras de “testamentos” e “julgamentos públicos” e “pulhas casamenteiras”, assim chegamos aos rituais cristãos e pagãos da Semana Santa em Trás-os-Montes.
“Antropologia da Comunicação” é um precioso manual de consulta para diferentes disciplinas, o autor soube reunir algumas joias da oralidade do povo do nordeste transmontano e remeteu-as a preceito para os territórios da Antropologia.
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