Na biblioteca da Abadia de Montserrat, em Barcelona, uma investigadora descobriu uma nova versão da obra de um autor português.
![]() |
| ABADIA DE MONTSERRAT- A biblioteca da Abadia de Montserrat contém tesouros bibliográficos que continuam a surpreender. As publicações mais antigas aqui guardadas remontam ao século XX. |
Francisco Botelho de Moraes e Vasconcelos (1670-1747) nasceu em Bragança e estudou em Coimbra, mas passou uma parte da vida entre Madrid e Barcelona. Foi autor de uma obra poética notável, com destaque para El Nuevo Mundo, um poema épico composto em castelhano sobre a viagem de Cristóvão Colombo para a América. Conheciam-se as versões publicadas em 1701 desta obra, mas a investigadora Claudia García-Minguillán descobriu, na biblioteca da Abadia de Montserrat, na Catalunha, um documento inédito há mais de três séculos.
![]() |
| CLAUDIA GARCÍA-MINGUILLÁN / BIBLIOTECA DE MONTSERRAT- A primeira página do importante manuscrito agora descoberto. |
A versão manuscrita da obra contém cerca de duzentas oitavas não utilizadas nas versões publicadas e várias passagens riscadas que sugerem que a obra foi sujeita a censura (pelo próprio ou por outros) ao sabor da ideologia do momento na complicada política ibérica de Setecentos. A dedicatória ao nobre Manuel de Toledo, da Casa de Alba, figura numa versão impressa e desaparece na seguinte, mas consta com grande proeminência no manuscrito agora descoberto.
“Trata-se do primeiro poema épico escrito em espanhol e dedicado à figura de Colombo, publicado cerca de duzentos anos depois da viagem”, diz a investigadora. “Mas o poema foi escrito pouco antes da Guerra da Secessão Espanhola, que produziu a alteração da dinastia dos Áustria para os Bourbon.” Como consequência, Botelho (ou alguém por ele) teve de navegar com cuidado por estas águas, pois essas oitavas recém-descobertas constituiriam material sensível com referências a acontecimentos históricos e militares interpretados de maneira diferente em Portugal e Espanha, bem como entre as duas casas reais com aspirações ao trono de Espanha.
Também as oitavas dedicadas à personagem Carlos, suposto marinheiro da frota de Colombo, têm relevância, uma vez que foram suprimidas na versão que chegou ao público. “São passagens que contêm informação inédita da própria biografia do poeta”, diz García-Minguillán. Aludem a Coimbra, Madrid e Barcelona e ao exílio forçado da personagem, longe da sua terra.
A investigação, parcialmente financiada pela Fundação Gulbenkian, prossegue e a autora mostra interesse em responder a novas interrogações. “Pode o poema ter sucumbido aos interesses do clima político? Terá sido usurpado das mãos do poeta e convertido numa arma de propaganda ao serviço do interesse de alguns em vez de respeitar o desejo legítimo do autor para servir a filiação política da Casa de Alba com os Borboun?”, pergunta. É o que se verá.



Sem comentários:
Enviar um comentário