Há uns dias atrás o chefe do executivo usou a palavra «emigração», referindo-se aos professores não colocados. Parece que caiu o Carmo e a Trindade. Os maldizentes profissionais ignoram que foram os nossos emigrantes os maiores heróis (juntamente com os combatentes), do fim do Estado Novo. Uns e outros têm sido e continuam a ser bombos de festa. Esta alusão é sintomática.
Foi de tal modo relevante o papel dessa geração de portugueses (homens e mulheres de todas as idades) que foram as suas remessas que aguentaram a sobrevivência do país, nesses anos de descalabro que antecedeu o recurso a empréstimos em Bona, pelo então Primeiro Ministro, Mário Soares.
Não foi degradante o papel de quem emigrou. Pelo contrário: Portugal está ainda em dívida para com essa geração de sacrifício por ainda não ter levantado um monumento do tamanho da Torre dos Clérigos. Foram nobres e prestigiantes os seus esforços. Em vez de anteciparem a onda de assaltos, de barbaridades, de crimes e de corrupção generalizada que a classe «democrática» introduziu na sociedade portuguesa, à medida que alguns sucessivos governantes e gestores públicos foram malbaratando os dinheiros públicos e algumas empresas privadas, deram magníficos exemplos de trabalho, de honradez e de gratidão. Os Portugueses das últimas décadas valeram mais pela mão-de-obra prestada pelos nossos emigrantes e pelo espírito de civismo e de hospitalidade do que por alguns dos nossos políticos. Alguns deles do topo da hierarquia. Uns bem à vista, outros enjaulados e outros mais, ainda a monte... Não fosse a máfia que esconde alguns e não haveria algemas e amarras para todos. Foi por eles e não pelos emigrantes que estamos todos a apertar o cinto e a perder os direitos adquiridos, extinguindo serviços essenciais, como os da saúde e postos de trabalho que resultaram de falências fraudulentas e outros truques baixos.
«Brincar» com «a emigração» e com os seus sujeitos reais, é jogo de mau gosto de políticos de trela ao peito.
Cinco dos meus irmãos são emigrantes e cada um deles semeou as suas comunidades de gerações mais novas. A minha aldeia que tinha 600 residentes quando eu nasci, a exemplos de tantas outras de Trás-os-Montes, perdeu 80% dos seus filhos mais válidos. E dão hoje exemplos aos que os receberam e aos que ficaram. Em Bridgeport (USA), por exemplo, o Clube Vasco da Gama começa a ser pequeno para acolher, em 6 de Dezembro de cada ano, os meus conterrâneos e seus familiares mais próximos, porque a Festa de S. Nicolau que se realizava na aldeia de Codeçoso, passou, por troca, a fazer-se naquela cidade norte-americana, em vez de ser na terra de origem. E esses Barrosões de gema, iguais a tantos milhares, aparecem lá com verdadeiras obras de arte, em cestaria, em miniaturas de mobiliário, em artesanato diverso que fazem nas suas horas livres. Cada um de nós tem uma dívida de gratidão para com os emigrantes. Em horas de desânimo, muitas vezes, incluindo na guerra do ultramar, me serviram de referência. Sempre os admirei.
Censurar quem tenha de fazer o mesmo, longe de ser uma ofensa, é um elogio. Eu já não emigro porque estou velho. Se ainda fosse útil, tentaria ir para Angola (que é uma terra de promissão), como iria para o Brasil, para Moçambique ou para um país europeu. Talvez aí, como ancião, fosse mais respeitado. Pelo menos não teriam os seus governantes coragem de me «roubar» parte dos direitos de velhice que adquiri, através de descontos que fiz com língua de palmo.
Talvez aí obtivesse mais formação superior. E nisso foi exemplo claro José Sócrates que «emigrou» para se embrenhar nos sortilégios da filosofia, enquanto «mãe» de todas as ciências.
Conheço «doutores» a sério que emigraram para as duas coisas: estudar e trabalhar. Saíram-se bem. Não tiveram complexos. São hoje cidadãos europeus de pleno direito. Não perderam cidadania, nem lhes caiu o verniz. Merecem o maior respeito, admiração e apreço.
A classe de professores está vacinada para tudo. Perguntem a quem foi trabalhar para Timor, aos professores que têm contrato com os consulados, àqueles que procuram complemento de formação nos Estados Unidos, na Inglaterra, seja onde for. O que querem é trabalho. Não discutem a qualidade, nem o espaço, nem a língua ou a política reinante no país de destino. Fui mais tempo aluno do que professor. Durante os meus últimos anos de vida activa, fui professor de professores. Em qualquer situação sempre descortinei na arte de aprender e de ensinar, boa fé, ânsia de vencer e de ser útil. Não foi nesses caminhos que descobri os apóstolos do parasitismo, da arte de furtar ou de passar rasteiras aos verdadeiros cidadãos que procuram fazer da vida um hino à dignidade, à lisura, à transparência e à cidadania.
por: Barroso da Fonte
in:http://www.jornal.netbila.net
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