Preservar o património imaterial enquanto tradição oral e não deixar morrer o saber popular junto dos mais jovens são objectivos da Associação Internacional de Paremiologia (AIP). Sedeada em Tavira, esta entidade é, de acordo com Rui Soares, o presidente, «a única no mundo dedicada ao estudo científico dos provérbios».
«Pelo São João a sardinha pinga no pão». «Março, marçagão, manhãs de Inverno e tardes de Verão». «Abril, águas mil». «Antes pouco, honrado, que muito, roubado». Estes são apenas alguns exemplos de provérbios que permanecem no ouvido dos portugueses e que continuam, de Norte a Sul, a saltar para as conversas sempre que a ocasião se propicia.
«Mantê-los vivos é o nosso objectivo. Os provérbios acabaram por ser consagrados pelo povo que os preservou do esquecimento e os divulgou. Sob a forma de sentença, encerram conhecimentos milenares feitos de experiência e que ainda hoje nos continuam a atrair pela beleza do raciocínio e das suas metáforas. São uma das maiores manifestações da cultura de um povo», começa por explicar Rui Soares, presidente da AIP, associação que nasceu a 7 de Maio de 2008, na cidade algarvia de Tavira.
Para o responsável, este património tem sido esquecido no país, e «o trabalho da associação passa por não deixar que morra uma das maiores manifestações de memória de um país». «Temos imensos provérbios. Todos nós, por vezes sem nos apercebermos, recordamos diariamente estes provérbios nas mais variadas circunstâncias. Não podíamos continuar a deixar que este legado caísse no esquecimento», refere, sublinhando que «o país, e os seus responsáveis, têm esquecido este património, tão importante nas raízes das populações».
E acrescenta que «temos uma tradição oral muito rica» e que «os provérbios têm passado geração a geração, graças às gerações anteriores».
Rui Soares recorda que a associação nasceu na sequência do primeiro congresso mundial de provérbios que se realizou em Tavira, em 2007. «Nessa altura, tivemos cá os maiores especialistas em provérbios a nível mundial, que nos incentivaram a criar a associação», relembra.
Desde então, o crescimento foi «visível» e mostra o «interesse de muitos portugueses por esta área». Hoje, a associação conta com 150 sócios espalhados por todo o país. Entre os objectivos da AIP constam a preservação do património imaterial do ponto de vista da tradição oral, a realização de estudos de paremiologia (estudo dos provérbios) a nível internacional e a organização de conferências internacionais de paremiologia.
Escolas e lares de terceira idade têm sido os públicos-alvo desta associação, «não só para divulgar os provérbios junto dos mais novos, mas também para recuperar a memória dos mais velhos».
«Queremos passar os testemunhos aos mais jovens. Já há, por exemplo, provérbios antigos que os jovens adaptaram à realidade de hoje como “mais vale prevenir que remediar”, substituído por, “mais vale prevenir que formatar”».
«A passagem do testemunho às gerações mais jovens é fundamental. São eles os guardiões deste legado, e sabemos que, muitas vezes, não estão familiarizados com os provérbios», vinca Rui Soares.
A associação tem vindo a associar os provérbios a outras áreas artísticas como a pintura, fotografia, e música, com exposições por vários locais do país, e tem promovido várias conferências dedicadas ao tema. «Promover o diálogo entre gerações é um dos grandes objectivos da nossa associação e queremos incentivar este tipo de diálogo nas conferências que realizamos», afirma Rui Soares.
«Pilar da identidade nacional»:
O presidente da AIP realça também a importância da cooperação internacional, «e que temos de fomentar», já que «somos a única entidade, a nível mundial, que estuda cientificamente os provérbios».
No que respeita à importância da preservação dos provérbios, Rui Soares garante que «estamos perante um património imaterial único» e que constitui «um dos pilares da identidade nacional».
«Somos muito influenciados por uma matriz que vem desde os tempos bíblicos. Na Europa encontramos provérbios nas mais variáveis variantes, e que concentram toda uma experiência de vida ao longo de vários anos. Se não mantivermos a sua memória, pouco falta para já ninguém se lembrar deles», alerta.
O responsável salienta ainda que, para além dos especialistas mundiais que contribuem com trabalho científico para algumas obras já publicadas pela AIP, há estudiosos e autarquias, um pouco por todo o país, que têm feito trabalho de campo, documentação e registo deste património oral.
Por fim, Rui Soares recorda que «não basta o reconhecimento a nível internacional», e sustenta que «é fundamental partilhar a informação com vista à união entre povos».
Ana Clara
in:cafeportugal.net
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