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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 13 de outubro de 2018

Colheita de 2018: provavelmente a melhor deste século

Após o Inverno, já se saberá com mais certeza se a colheita de 2018 é, como tudo indica, realmente fabulosa. A única verdade inquestionável que já se pode avançar é que as castas que melhor resistiram aos fenómenos climatéricos deste ano e ao míldio foram as castas tradicionais.

DATO DARASELIA

Se em Portugal existisse a tradição das vendas de vinhos en primeur (ainda antes de serem engarrafados e chegarem ao mercado), valia a pena fazer já algumas compras de vinhos da colheita de 2018. Em algumas regiões ainda se vindima, mas do que se conhece pode afirmar-se com segurança que o ano de 2018 vai ter um lugar reservado na galeria das colheitas antológicas em Portugal. Sobretudo nos tintos. Com alguma probabilidade, poderá ser mesmo a melhor deste século — e nestes 18 anos já houve várias colheitas extraordinárias.

Falo de qualidade. Em quantidade, foi menor. Houve muitos problemas um pouco por todo o país, como queda de granizo, ataques severos de míldio e escaldão. No início de Agosto, quando as temperaturas se aproximaram dos 50 graus durante alguns dias, o cenário era quase catastrófico. As uvas mais expostas cozeram e secaram e o que se começou a ver em muitas vinhas — cachos ressequidos ao pendurão — fez aumentar ainda mais o ambiente depressivo que se havia instalado com as trovoadas da Primavera e o avanço do míldio. Mas, curiosa ironia, a vaga de calor dos primeiros dias de Agosto acabou por ter algo de providencial, porque permitiu estancar o míldio (a partir de certa temperatura, a doença deixa de progredir) e poupar os viticultores a mais tratamentos fitossanitários.

Ao contrário do oídio, o míldio não afecta a qualidade do vinho, apenas influi na quantidade. Depois de atacadas, as uvas ou não nascem ou secam. Ora, menos uvas é quase sempre sinónimo de maior qualidade. No Douro, o povo diz que “ano de míldio é ano vintage”. Claro que ano “vintage” para uns é ano horribilis para outros, sobretudo para aqueles que dependem da venda de uvas. Houve gente que perdeu quase tudo nesta colheita. Esses, e foram muitos, não terão boas recordações de 2018, nem merecem que se fale em vindima gloriosa. Seria gloriosa se fosse genericamente muito produtiva e de grande qualidade.

Vindimas dessas acontecem muito raramente. E, com as alterações climáticas, a probabilidade de acontecerem é, em boa verdade, mais diminuta. Há cada vez mais fenómenos climáticos extremos e os ciclos da vinha tornaram-se mais imprevisíveis.

Neste ano agrícola, o Inverno foi frio e seco, o que é sempre bom para a necessária dormência da vinha. Mas foi também pouco chuvoso (68% abaixo do valor médio). No final da estação, 84% do território nacional estava em seca severa e extrema. Na colheita de 2017, as vinhas já chegaram ao final do seu ciclo em completo stress hídrico. Uma Primavera pouco chuvosa e um Verão novamente seco e seria uma tragédia. A videira, apesar de muito resistente, também tem os seus limites. Mas a Primavera prolongou o frio do Inverno e trouxe muita chuva (e muito míldio, como já foi dito). Foi a terceira Primavera mais chuvosa desde 1931. Encheram-se as barragens e as terras de água e o frio foi atrasando a rebentação da vinha. Em 2017, quando chegámos a Agosto, as uvas estavam prontas a vindimar, apanhando toda a gente de surpresa. Este ano, o Verão chegou tarde e a maturação foi-se alongando no tempo certo, arrastando o grosso da vindima para Setembro e Outubro, como antigamente. A partir de Setembro, a amplitude térmica também foi aumentando (dias quentes e noites mais frescas) e o fim da maturação decorreu nas condições ideais, com tempo seco.

Foi uma vindima sem chuva e isso é sempre um factor determinante na qualidade da produção. Mas o que verdadeiramente distingue a colheita de 2018 é o extraordinário equilíbrio dos vinhos. No Douro, por exemplo, as uvas chegaram perfeitas à adega, sãs e com um equilíbrio pouco comum em termos de acidez e álcool provável. “Em tintos, é uma vindima muitíssima boa, das mais equilibradas que tenho visto. Tanto para DOC Douro como para Porto. Nos brancos, é uma colheita boa, não extraordinária”, assegura Luís Sottomayor, o director de enologia da Casa Ferreirinha.

Nos Vinhos Verdes, em particular em Monção-Melgaço, “a vindima de 2017 já tinha sido a melhor desta década, mas esta ainda vai ser melhor”, garante Anselmo Mendes. “Os brancos de Loureiro estão fabulosos e os Alvarinho não perderam tanta acidez como no ano passado. Estão menos tropicais. Têm o perfume antigo do Alvarinho, mais a flores e menos a peras e outras frutas”, acrescenta.

Na Bairrada, a única queixa é para a quebra na produção. Luís Pato, por exemplo, perdeu 70% da produção de Touriga Nacional, que usa para os seus vinhos de entrada de gama. “A qualidade é muito boa porque, com as perdas, concentrou mais. Colhemos Baga com 13 de álcool e 6,5 de acidez, o que é fantástico. Há um maior equilíbrio álcool/açúcar em relação a 2016, por exemplo. As colheitas de 2017 e de 2015 também foram muito boas”, diz.

Paulo Nunes faz vinhos no Dão (Casa da Passarella), Bairrada (Casa de Saima) Douro (Costa Boal) e Trás-os-Montes (Palácio dos Távoras) e o que tem visto em todas as adegas onde trabalha “é muito, muito bom”. “No Dão, vinhos com este equilíbrio só me lembro dos de 2008 e mesmo esses não sei se chegam ao nível dos deste ano”, afirma. 

Onde parece haver mais dúvidas é no Alentejo. Joana Roque do Vale, enóloga da Roquevale, diz que está a ser um ano difícil na adega, por causa dos problemas que ocorreram na vinha com o escaldão e o míldio e também alguma podridão, embora, regra geral, os vinhos sejam “muito bons”. Por seu lado, Rui Reguinga fala num cenário a duas cores: “Os brancos estão belíssimos, com boa fruta e boa acidez. Mas os tintos são mais difíceis de entender. No Alentejo, costumamos acabar a vindima com os tintos quase prontos a ir para a garrafa. Este ano estão mais austeros, mais ácidos e um pouco mais duros.”

Os vinhos precisam de tempo para se mostrarem. Após o Inverno, já se saberá com mais certeza se a colheita de 2018 é, como tudo indica, realmente fabulosa. A única verdade inquestionável que já se pode avançar é do domínio da viticultura: as castas que melhor resistiram aos fenómenos climatéricos deste ano e ao míldio foram as castas tradicionais. As castas “novas”, estrangeiras ou nacionais plantadas fora da região tradicional, “levaram um porradão”, como bem observava Luís Pato. Não vale a pena querer contrariar a natureza, nem muito menos ignorar a sabedoria dos antigos.

Pedro Garcias
FUGAS
Jornal Público

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