«Sua Magestade que Deus guarde hé servido mandar dizer a V. Ex.ª que foi muito do seu real agrado que á primeira surpreza de Miranda se retirasse V. Ex.ª do Mogadouro tão cuidadosa e aceleradamente que não tivesse o mais leve perigo sua pessoa; porque ainda que com aquelle successo e fugida de V. Ex.ª hé certo que se consternarão os Povos e ao seu exemplo desertavão os lugares temendo a furia do inimigo que facilmente poderião rebater; todavia Sua Magestade preza mais a segurança da pessoa de V. Ex.ª e a certeza de que se tirou sem mais lezão que a sua antiga manqueira do que sente toda a ruina que nessa provincia pela invazão dos castelhanos experimentarão seus vassallos com injuria da sua Coroa. E portanto lembra a V. Ex.ª que sempre que houver semelhantes occazioens se ponha em cobro sem risco seu porque hé muito necessaria a sua pessoa para authoridade da nobreza, para credito da Nação e para ornamento da sua real capella de que tem feito a V. Ex.ª superintendente com exercicio de prioste. Cá se dice que achando-se V. Ex.ª nessa provincia em que hé tão grande senhor que com poder despotico e absoluto uza do seu e do alheio devia deixar-se inflamar de algum eroico espirito que como filho de seu pay conservase para acudir pela reputação portugueza; e que pondo-se a cavallo podéra convocar os seus vassallos e os mais povos que a seu exemplo correrião voando e em caminhos tão apertados com facilidade poderião disputar o passo ao inimigo e impedir-lhe os progressos, hostelidades, estragos, violencia e confusão que padecerão as terras que elle talou [e] destruhio: e hé certo que intentando V. Ex.ª huma façanha tão gloriosa poderia sem dificuldade grande consegui-la; mas porque poderia tãobem haver algum perigo em tal empreza foi mais seguro o arbitrio de fugir. E visto que V. Ex.ª preza tanto a vida que a antepoem ao credito e á honra Sua Magestade lhe faz merce de mais duas vidas nas terras da Coroa e ordens. Huma só couza manda estranhar e hé que estando ha tantos annos na provincia ainda achassem nella que levar os inimigos quando se entendia que a madura ambição de V. Ex.ª e as ligeiras rapazias do senhor conde de S. João (358) seu filho terião em melhor arrecadação os erarios particulares como descendentes daquelle antigo leão do qual posto que lhe deixou a coroa sempre conservão as garras.
Deus Guarde a V. Ex.ª muitos annos. Paço 20 de Julho de 1710.
Diogo de Mendonça Corte Real».
----------
(356) E alcaide-mor de Miranda.
(357) Esta carta vem no códice n.° 476, fl. 239, da colecção pombalina existente na Biblioteca Nacional de Lisboa.
(358) Francisto Xavier de Távora, que morreu doido?
----------
MEMÓRIAS ARQUEOLÓGICO-HISTÓRICAS DO DISTRITO DE BRAGANÇA
Sem comentários:
Enviar um comentário