Estação de Torre de Moncorvo |
Este capitalista, cuja fortuna se elevava a perto de dez mil contos de réis, merece que façamos aqui especial menção da sua memória, pelo bom emprego que soube fazer de seus bens. Seixas foi para Lisboa em criança a chamamento de um irmão e adquiriu ali a fortuna no comércio. Nasceu em Moncorvo em Setembro de 1808 e faleceu em Lisboa às 8 horas da noite de 9 de Outubro de 1895. Era filho de Luís Gonçalves de Seixas e de D. Francisca Inácia de Seixas, natural de Moncorvo.
Foi par do reino em 1880.
Depois de chamar como herdeiros dos dois terços da sua grande fortuna seus dois filhos naturais (pois nunca havia casado) Júlio Henrique de Seixas e Henrique Júlio de Seixas, distribuiu largamente o outro terço por parentes, amigos e criados. Fala assim o seu testamento:
«Deixo ao hospital da villa da Torre de Moncorvo quatro contos de réis.
Deixo trinta contos de inscripções para o seu rendimento ser applicado á creação em Moncorvo de uma escola de instrucção primária ou secundaria, separando-se do rendimento cento e vinte mil reis para annualmente se distribuir em roupa e calçado pelos alumnos pobres, que por seu comportamento e applicação forem dignos d’esse beneficio. A camara municipal de Moncorvo, de accordo com o ministro do Reino, são os competentes para receber o legado e dar cumprimento á minha disposição.
Deixo quatro contos de reis para estabelecimentos pios e de caridade de Lisboa e dois contos de reis para os de Moncorvo, distribuidos ao prudente arbitrio dos meus testamenteiros.
Deixo dois contos de reis para esmolas a pobres de Lisboa e deixo quinhentos mil reis para os pobres de Moncorvo...... Deixo á Associação dos Albergues Nocturnos de Lisboa dois contos de reis».
Depois, em princípios de Janeiro de 1904, faleceu em Lisboa o capitalista Francisco António Meireles, também natural de Moncorvo, sobrinho de Manuel António Seixas, que igualmente deixou grande fortuna, adquirida no comércio daquela cidade, para onde fora de tenra idade. Era filho de Francisco António de Meireles e de Antónia Inácia de Seixas, irmã de Manuel António de Seixas.
É interessante esta cláusula do testamento de Seixas, que o guinda às culminâncias de benemérito de proveitosa e grata memória:
«Depois de pagos os legados acima mencionados, a remuneração aos meus testamenteiros adiante indicados, e bem assim todas as despezas que haja a fazer inherentes ao meu casal, ou que derivem das disposições d’este meu testamento, o remanescente que ficar, e esteja liquidado, se entregará ao Conselho Geral de Beneficencia, creado no ministerio do Reino, ou a qualquer outra entidade que o venha a substituir para o mesmo fim, para o dito Conselho de Beneficencia o applicar, sob as ordens e superintendencia do ministro do Reino, na fundação ou ampliação de algum estabelecimento de caridade, que mais util seja aos desvalidos, especialmente creanças desamparadas ou velhos impossibilitados; e se isto puder ser feito na villa da Torre de Moncorvo, onde nasci, é o que muito desejo, pois que é uma terra de muita miseria.
No caso de que haja impossibilidade, ou grandes difficuldades em realizar esta minha disposição, os meus testamenteiros, de accordo com o ministro do Reino, providenciarão o que tiverem por melhor, no sentido que mais se harmonise com os meus desejos acima expostos, e confio no seu bom criterio, attendendo a que o meu fim com esta disposição é ser util por forma duradoura aos desventurados, preferindo a villa de Moncorvo por muitas razões».
A 30 de Janeiro de 1916 inaugurou-se em Moncorvo o «Asilo Francisco António de Meireles» para crianças e inválidos pobres (Diário de Notícias).
As manigâncias políticas que houve com os legados Seixas e Meireles mostram bem a bandalheira que é a política entre nós e a falência que do bem geral têm os políticos.
A Câmara Municipal de Moncorvo, como legatária na parte respectiva, representou ao governo em 15 de Fevereiro de 1896 pedindo a criação de uma escola secundária com dois professores, indicando as cadeiras que cada um devia reger, sendo por decreto de 11 de Março seguinte criada a «Escola Seixas». Por outro decreto de 29 de Agosto de 1905 foram colocados três professores na escola, um director e pessoal menor serventuário, regendo-se nela as disciplinas gerais do curso dos liceus até ao terceiro ano, e, como o legado Seixas não chegava para tanto, apensaram-lhe indevidamente o legado Meireles.
Por decreto de 2 de Março de 1910 foi extinta esta nova fase da Escola Seixas, criando em sua substituição uma Escola Elementar de Comércio com um só professor, que ensinaria francês prático, correspondência e escrituração comercial, aritmética, geografia e economia elementar.
É de ver que todas estas reviravoltas gravitavam em torno da grossa maquia que os legados Seixas-Meireles prometiam e que na imprensa e no parlamento se esmurravam reciprocamente os contendores na ânsia do bem público, sempre admirável quando exercido pelos seus apaniguados e sempre detestável no caso contrário.
MemóriasArqueológico-Históricas do Distrito de Bragança
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