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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

domingo, 19 de junho de 2011

HEAVY METAL- ANOS DE PESO

O movimento metaleiro nacional nem sempre foi tão prolífero como nos dias que correm. Em finais da década de 70, eram muito poucos aqueles que sabiam o significado da expressão Heavy Metal, as bandas portuguesas eram poucas ou nenhumas e o mercado discográfico demonstrava zero interesse pelo género. Nesses tempos não era fácil arranjar discos de grupos estrangeiros
e, no que toca ao produto caseiro, as edições eram praticamente nulas.
Como eram poucas as lojas que vendiam os álbuns que eram editados nessa altura lá fora, os interessados em adquirir discos dos Led Zeppelin, Black Sabbath, AC/DC, Deep Purple ou UFO tinham de recorrer a vendas postais estrangeiras e alfarrabistas. Estamos na viragem da década de 70 para a de 80 e as bandas nacionais de rock pesado são muito poucas, sendo impossível falar de um verdadeiro movimento. Desses anos será impossível não mencionar dois nomes saídos do famoso «boom» do rock português dos anos 80 – NZZN e Roxigénio -, não tanto pelo peso do seu som, mas pela influência posterior que demonstraram ter sobre todos os colectivos que lhe seguiram as pisadas.
 Para começar, os NZZN são vistos por muitos como a banda pioneira do metal português e as suspeitas confirmam-se ao perceber que foram eles os primeiros a lançar um single nacional do género. «Vem Daí» foi lançado em 1980 e transforma-se num sucesso relativo, chegando à primeira posição do top de preferências do programa Rock em Stock . Era precisamente através das emissões de Luís Filipe Barros – e também das de António Sérgio . que chegavam aos interessados as novidades fonográficas editadas lá por fora.
Cá dentro começavam também a dar que falar os Roxigénio, que se estreiam com um concerto no Pavilhão Académico do Porto a 9 de Maio de 1980. A nova aventura de António Garcez – que tinha feito parte dos Arte & Ofício – foi recebida de braços abertos e, já no final do ano, é editado o primeiro trabalho da banda, o álbum «Roxigénio» . Este é também o primeiro registo gravado em estúdio a contar com a participação de Filipe Mendes (ex-Chinchilas e Heavy Band), considerado o melhor guitarrista nacional da altura. A formação do grupo ficava completa com as participações do baixista José Aguiar e do baterista brasileiro Betto Palumbo. Apesar de explorarem um som claramente heavy metal e cantado em inglês, no ano seguinte o disco começa a tocar nas rádios. A seguir ao álbum é editado o single «Song at Middle Voice» e o grupo sofre algumas mudanças de formação. Tocam em Vilar de Mouros, editam o disco «Rock’n’Roll Men» e acabam por separar-se pouco tempo depois.
Ainda em 1981 formam-se no Porto os Mac-Zac (liderados pelos irmãos Paulo e Luís Barros), tocando também na zona norte do país os Xeque-Mate, Ferro & Fogo e Jarojupe. Por esta altura, em Lisboa já começavam a dar os primeiros passos grupos como os Valium, STS Paranoid e Sepulcro. A explosão do New Wave of of British Heavy Metal transforma-se na principal fonte de inspiração para as primeiras bandas de heavy metal português e, nos anos que se seguem, alguns destes grupos alteram a sua sonoridade ou, em alternativa, decidem cessar funções.
Nas ondas do éter, António Sérgio vai para o ar aos Sábados à tarde com o célebre Lança Chamas. À volta do programa ergue-se imediatamente um pequeno culto, Paulo Fernandes e Gustavo Vidal são dois dos principais impulsionadores. A Comercial tenta cortar o programa por duas vezes, mas é inundado de cartas. Em Lisboa a catedral Rock Rendez Vous já albergava matinés dedicadas às sonoridades mais pesadas, e quando tocavam os STS Paranoid (cujo nome significava Satan Take Our Souls) mostravam ser a banda mais popular da capital.

Em 15 de Dezembro de 1984, em Santo António dos Cavaleiros, realiza-se o primeiro festival português de heavy metal com as participações de Tarantula, Xeque-Mate e STS Paranoid, entre outros. A 4 de Outubro de 1986 acontece o Metal Stage, no Cine Plaza na Amadora com Cruise, Valium, Satan´s Saints e STS Paranoid.
É também por volta desta altura que surgem as chamadas rádios piratas, que normalmente tinham programas que divulgavam o metal. «Todas as vilas ou cidades tinham pelo menos duas rádios», confirma Emanuel Ferreira que continua a realizar o seu Blast! Na RUM. «Cada rádio tinha o seu programa. Geralmente eram feitos por curiosos que rodavam aquilo que era rodado por cá ou a importação ocasional. Com o boom das bandas portuguesas passaram a rodar maquetas de bandas nacionais». A influência das rádios, e especialmente do Lança Chamas, leva à criação de muitas bandas, que só tinham dinheiro para gravar um tema. Essas gravações eram reproduzidas em cassetes de computador ou fornecidas pelos interessados em conhecer a banda em questão. Os géneros eram muitos e passavam pelo glam rock dos Ibéria, speed/trash dos Satan´s Saints, black metal dos Black Cross, doom dos Vasco da Gama (gravam um álbum em 1988), rock FM dos Cruise (que chegam a gravar um single) e power metal linha Judas Priest dos Alkateya, considerada pelos especialistas a melhor banda da época.
Formados por Beto, que anteriormente fazia parte dos Sepulcro, os lisboetas Alkateya gravam três maquetas entre 1985 e 1989, chegando a fazer uma digressão a nível nacional. «Ao lançarmos a terceira maqueta surge a possibilidade de um contrato», afirma o vocalista João Pinto. «E é essa situação que acaba por contribuir para o final da banda. A pessoa que tinha mostrado interesse nos Alkateya abandonou pouco tempo depois a editora em questão e a possibilidade de gravarmos foi por água abaixo. Já tínhamos tudo preparado para entrar em estúdio, sentimo-nos desiludidos e com muito pouca força para continuar. A banda acabou por se separar».
Por esta altura os grupos já eram mais que muitos: Tao, Valium (hoje conhecidos por Casablanca), Comme Restus, W.A.D.S., Devil Across, Ibéria, Procyon, Massive Roar. A norte apareceram os Dove, Web e Metal Brains.
À medida que surgiam novas bandas e o volume de concertos ia aumentando apareciam também os fã-clubes. Para além da Feira da Ladra – onde apareciam as novidades em vinil – estes clubes eram pontos de encontro de eleição para trocas de informações e gravações. Todos eles tinham anexados uma publicação em formato de fanzine, que ia espalhando as últimas novidades em relação ao que se ia fazendo dentro e fora do país.
Pioneiros neste espectro são o Purgatório do Heavy Metal, Defensores da Fé (liderado por Pedro Cardoso), Heavy Metal Zombies Paranoid (todos em Lisboa) e Brigada Metal Power (a norte). Nelson Santos – o ex-editor da fanzine Warning!, realizador do programa Pesos Pesados e actual animador da TSF – revisita a época: «Em meados de 80 já era fácil arranjar material estrangeiro, até já havia lançamentos mais importantes que eram objecto de edição nacional. O grande mistério eram as bandas nacionais, porque a divulgação em termos radiofónicos era pouca e na televisão nula. Primeiro lia-se qualquer coisa sobre um grupo numa fanzine e só posteriormente é que se conseguia arranjar a muito custo um suporte sonoro. Foi através de publicações como O Templo do Som Eterno, Último Massacre e a Legião Metálica que se descobriram muitas coisas novas».
Em 1987 começa a crescer um movimento relativamente forte na margem sul do Tejo, com Braindead, Thormentor e The Coven.
Os Braindead formam-se em Almada, tocam trash metal bastante agressivo mas acabam por separar-se pouco tempo depois por falta de interesse. Com experiência acumulada noutros grupos voltam a reunir-se dois anos depois e gravam um disco de estreia que, por razões dúbias, nunca chega a ser editado. Assinam com a EMI-VC e é editado «Blend», onde o colectivo adopta uma sonoridade funk metal próxima de uns Red Hot Chilli Peppers em início de carreira. «Cry Alone» torna-se um êxito, mas o segundo trabalho de originais («Room Landscapes, de 1994») não chega a atingir os objectivos a que se propunha. João Nobre liga-se aos Da Weasel e o grupo dá por encerrada a sua carreira em 1996, com um concerto de despedida na Costa da Caparica.

Pioneiros no espectro death metal, os Thormentor tornaram-se conhecidos graças às suas três maquetas iniciais. O grupo liderado pelo guitarrista/vocalista Miguel Fonseca sofre constantes mutações, mas em 1991 edita o single «Dissolved in Absurd» através da independente Slime Records que posteriormente edita também «The Shades Behind» dos Sacred Sin. Em 1994 é lançado o álbum «Abstract Divinity», mas devido a problemas editoriais e instabilidade, a banda acaba por manter-se em silêncio, quebrado apenas por aparições ocasionais nos palcos de Almada.
Sérgio Duarte ainda liderou os The Coven durante algum tempo mas passa o testemunho ao irmão Rui, que fundou os RAMP em 1988.
Ainda em 1987, Rui Fingers, Raf Maya, Paulo Ossos, Zé Paulo e Beto Garcia fundam os V12, gravando imediatamente uma maqueta de cinco temas. As reacções são positivas, mas o colectivo desaparece durante algum tempo. Reaparecem em 1990 com um novo vocalista e um álbum homónimo de estreia, editado pela Polygram.
Em 1988 terminaram oficialmente os Cruise, Sepulcro e Blizzard. Moribundos estavam os STS Paranoid, Satan’s Saints e Devil Across.
Das cinzas dos Cruise formaram-se os Tao. O nome deriva da alcunha do vocalista: Paulo «Tao» Fernandes, que nos Cruise se chamava Paulo Scorp. O baixista era o ex-Satan’s Saints Samuel Lopes, que mais tarde viria a formar os Crush e a fundar a editora Música Alternativa.
Mesmo no início da década de 90 é criada pelos irmãos Barros a Rock’n’School, a escola de música dos Tarantula. Paralelamente aos estúdios Rec’n’Roll, cria-se em torno deste colectivo um movimento a norte do país, que acaba por gerar o aparecimento de grupos como os W.C.Noise, Dove, Genocide e Gangrena. «Essa ideia surge por uma necessidade de sobrevivência», responde Paulo Barros quando questionado em relação à influência que a sua escola teve no panorama musical. «O objectivo era viver da música e tínhamos consciência que nunca conseguiríamos sobreviver tocando apenas nos Tarantula. Ao criar a escola e o estúdio conseguimos educar uma série de músicos, que mais tarde vieram a formar bandas novas e a dar um enorme impulso ao movimento nacional».
Em 1990, tudo muda, com o aparecimento da segunda geração do metal português. As maquetas tornam-se mais profissionais, as fanzines underground e as condições muito diferentes. No entanto, é só em 1991, com o lançamento do mini-álbum «Thoughts» dos RAMP, através da Polygram, que se dá o ponto de viragem mais importante na cena metaleira nacional. «Em termos de heavy nacional, a estreia dos RAMP foi o primeiro grande momento de orgulho para todos aqueles que estavam envolvidos no movimento», diz o radialista António Freitas. «Os Ramp mostraram uma desenvoltura impressionante e tocavam um trash metal com bastante personalidade. Já nesse tempo, tinham potencial para competir com o que era feito no estrangeiro». Os brasileiros Sepultura vêm ao nosso país pela primeira vez e quem abre para eles é o quinteto da margem sul; pela primeira vez uma banda portuguesa consegue tocar com uma estrangeira e portar-se à altura, suscitando uma reacção efusiva por parte do público.
(...)

Esse concerto [1º Festival Heavy Metal de Santo António de Cavaleiros] foi excelente, pelo menos até aparecer a Polícia e acabar com aquilo tudo. Foi a primeira vez que aconteceu algo do género a um nível maior, em termos de afluência de público as coisas correram em pleno e a sala estava composta. Se me pedirem [ Paulo Barros, Tarantula] para apontar uma altura em que as coisas se tornaram mais sérias para o metal português, vou mencionar sempre esse festival.

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL BLITZ EM 26.12.2000

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