sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

O Colégio do Santo Nome de Jesus em Bragança: Um quotidiano jesuíta*

 Os difíceis inícios do Colégio do Santo Nome de Jesus em Bragança

Cristina Osswald
Faculdade de Letras da Universidade do Porto
Via Spiritus, Revista de História da Espiritualidade e do Sentimento Religioso, CITCEM, nº 17, 2010, págs.261-272


O Colégio do Santo Nome de Jesus em Bragança, que foi fundado em 
1561, foi a oitava instituição da Companhia de Jesus a ser criada em Portugal.1
Um ano depois, foram abertas as aulas. A sua fundação foi financiada por D. Teodósio, Duque de Bragança, com 100,000 reis anuais e os rendimentos de algumas igrejas. D. Julião de Alva, terceiro bispo da Diocese de Miranda, após ter fundado em Bragança o Colégio de S. Pedro, anexou-o ao Colégio da Companhia de Jesus.2
A fundação do Colégio de Bragança ocorreu no período de maior expansão da Companhia de Jesus em Portugal (até 1597, foram fundadas dezassete instituições jesuítas). Trata-se de um colégio de pequena dimensão (tinha uma média de habitantes de dezoito jesuítas), se o compararmos com o Colégio de Coimbra (cento e noventa e seis jesuítas) ou o Colégio de Évora (cento e quarenta e dois jesuítas) durante o séc. XVI.3
As dificuldades iniciais vividas por esta comunidade levaram a que se ponderasse a sua supressão ainda durante a década de 1560, segundo lemos na crónica anónima da Companhia de Jesus do séc. XVII conservada na Biblioteca Pública Municipal do Porto.4 De igual modo, em uma extensa carta enviada pelo reitor P. Francisco Gomes ao Geral Everardo Mercuriano em 1576, as dificuldades sentidas pela comunidade vivendo neste colégio derivariam dos maus ares (amplitudes térmicas extremas) e duma alimentação de má qualidade (um sistema alimentar consistindo sobretudo em pão e carne de má qualidade, peixe seco e salgado). A mesma epístola refere ainda o facto do edifício não ter sido construído de raiz, mas ter sido uma adaptação dum convento de freiras.5
Por seu lado, em 1579, o mesmo padre considerava que o grande mal - estar generalizado sentido nesta instituição derivaria do facto dos seus membros se encontrarem aí contra a sua vontade.6 Segundo lemos na crónica jesuíta do séc. XVII antes mencionada, devido à penúria extrema do Colégio de Bragança nos seus inícios, os seus habitantes só teriam um lençol para se cobrirem durante as gélidas noites de Inverno. No Verão, careciam do fresco de árvores e de águas.7

A organização do quotidiano
O Colégio do Santo Nome de Jesus era formado por uma comunidade bastante variada. Para além dos sacerdotes, noviços, irmãos, estudantes, no Colégio de Bragança viviam ou, pelo menos, trabalhavam vários leigos com uma grande variedade de funções, incluindo a realização de tarefas manuais (cozinheiros, lavadores de roupa, sapateiros), o cuidado com os doentes (cirurgiões, médicos), com os animais (pastores, azagais, boeiros, guarda-porcos
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* A autora exprime o seu agradecimento a Ana Cristina Rodrigues, Biblioteca Brotéria, Lisboa, pelo apoio no que refere à pesquisa das fontes impressas incluídas na Monumenta Historica Societatis Iesu e a Fernando del Ser pela “introdução” à investigação na Biblioteca Nacional de España e ainda na Real Academia de História, também em Madrid.
1 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal: 1542-1759: cronologia, artistas, espaços. Porto: Universidade do Porto, I, 591. Tese de doutoramento e FERNANDES, Maria da Conceição Correia (2001) - Uma história da Diocese de Bragança - Miranda. Bragança: Diocese de Bragança - Miranda, 271-273.
2 BANDEIRA, Ana Maria Leitão e; QUEIRÓZ, Abílio (1997) - O Colégio do Santo Nome de Jesus de Bragança: formação do seu padroado e benfeitores que contribuíram para o seu engrandecimento, in Actas do Congresso Histórico Páginas da História da Diocese de Bragança - Miranda, 1545-1995. Bragança: Comissão de Arte Sacra Bragança Miranda, 430.
3 RODRIGUES, Francisco (1938) - História da Companhia de Jesus na Assistência de Portugal. Porto: Apostolado da Oração, II.I, 4.
4 Biblioteca Pública Municipal do Porto [BPMP], Ms. 162, Chronica dos P. Jesuitas de Portugal, f. 326.
5 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 605.
6 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 607-609.
7 Biblioteca Pública Municipal do Porto [BPMP], Ms. 162, Chronica dos Jesuítas de Portugal, f. 326.
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 e guardas de perus), da quinta (quinteiros, cerqueiros, guardas da quinta, lavradores) e ainda dos estudantes (os chamados guarda - estudos).8
Para além das práticas espirituais, em particular, a oração mental diária, o desempenho de actividades religiosas era um aspecto principal do quotidiano.
Os jesuítas de Bragança tinham uma importante função, enquanto catequistas.
No séc. XVII, para além da catequese dominical, davam catequese aos pobres, quando estes iam receber diariamente alimentos no colégio durante a manhã.9
Também davam catequese em igrejas e conventos pertencentes a outras ordens, tais como o convento franciscano de Santa Clara.10 Por sua vez, o sábado era o dia destinado às pregações no exterior.11 Segundo nos informam as Lembranças para o Colégio de Bragança pelo Provincial P. Jerónimo Gouveia, os jesuítas de Bragança deviam empreender missões pelos lugares vizinhos cada oito ou quinze dias.12 Em 1633, o Provincial P. Pedro da Rocha ordenou que os mestres fizessem uma ou duas pregações semanalmente.13
No seu quotidiano, tanto os jesuítas já formados, como os jesuítas em formação deviam desempenhar várias tarefas manuais. Em Bragança, por exemplo, todos os membros da comunidade estavam obrigados a servir à mesa quinzenalmente e ainda a lavar os pratos e as tigelas três vezes por semana.
Estavam ainda encarregados de fazer as camas, quando se levantavam e da limpeza dos seus cubiculae.14
Naturalmente, as várias actividades do quotidiano da comunidade jesuíta brigantina seguiam o horário da Província Lusitana. Mais concretamente, Simão Rodrigues determinou, nas suas Regras para a Província Portuguesa (1548), que os habitantes e visitantes das casas e outras instituições acordassem às 4.30 horas da manhã. Seguir-se-ia a missa matinal às 5.30 horas. O jantar devia ser servido às 11 horas e a ceia às 18.30 horas.
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8 Guerra, Luís Bivar (1953) - A administração e contabilidade dos colégios da Companhia de Jesus nos séculos XVII e XVIII, in «Revista do Centro de Estudos Económicos», 13, Lisboa: Tip. Da Emp. de Publicidade, 176.
9 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 619.
10 Biblioteca Nacional de España [BNE], Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do Provincial Luís Lobo para o Colégio de Bragança em Junho de 1634, f. 37r.
11 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do P. Pedro da Rocha Provincial para o Colégio de Bragança em Outubro de 1635, f. 38r.
12 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Lembranças pera o Colégio de Bragança pelo Provincial Jerónimo Gouveia (1612), f. 115.
13 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Instruções do Provincial Pero Rocha para o Colégio de Bragança em 1633, f. 135.
14 BNE, Mss. 8557, Visitas dos Provinciais e Visitadores ao Colégio de Bragança entre 1598 e 1617, Instruções do Visitador Martim de Mello para o Colégio de Bragança em 1600, f. 58, e Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Instruções do Provincial José de Seixas em Novembro de 1683 para o Colégio de Bragança, f. 82v.
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O recolher obrigatório nos cubiculae estava marcado para as 22 horas.15 Todavia, em breve, foram instituídos um horário de Inverno e um horário de Verão. Em 1578, o Visitador Miguel de Sousa escreveu ao P. Francisco Gomes, reitor do colégio de Bragança, que era coisa muito desejada na província atrasar a ceia em uma hora. Ou seja, a ceia passaria a ser servida às 20 horas no Inverno e às 19 horas no Verão.16 Nas ordens enviadas no ano seguinte para a província, o P. Provincial Manuel Rodrigues instituiu três horários anuais. De 15 de Março a 15 de Setembro, a campainha para o despertar tangia às 4 horas, devendo o jantar e a ceia ser respectivamente servidos às 10 horas e às 18.45 horas. O exame de consciência seria realizado entre as 20 e as 20.45 horas. De 15 de Setembro até finais de Outubro, e do início de Fevereiro até meados de Março, o despertar seria às 5 horas, o jantar e a ceia seriam distribuídos às 11 horas e às 19.45 horas, respectivamente, e o exame de consciência seria realizado às 21.30 horas. Finalmente, entre 1 de Novembro e finais de Janeiro, a campainha para o despertar deveria tanger às 5.15 horas, o jantar e a ceia deveriam ser servidos às 11 horas e 20 horas, tendo sido ainda estabelecido iniciar o exame de consciência às 21.45 horas.17
O quotidiano das comunidades jesuítas em Portugal incluía períodos obrigatórios de recreação. Para além do assueto (dia feriado semanal), que normalmente calhava à quarta - feira, os padres tinham direito a quinze dias e os estudantes a oito dias de férias por ano. No caso da comunidade brigantina, os dias de lazer deviam ser passados em uma das duas quintas, as assim chamadas cercas na linguagem jesuíta coeva, e que eram pertença do Colégio, isto é, a Quinta do Paramio e a Quinta da Ricafé. Todavia, já em finais do séc. XVI, se observou a preocupação que os membros da comunidade, que não se pudessem deslocar a uma das duas cercas, descansassem em sítio recatado do colégio à tarde durante duas horas.18 De igual modo, a partir de finais do séc. XVI, foi instituído o hábito de uma hora de repouso após o jantar.19

Características do sistema alimentar
De acordo com a prática portuguesa, que vigorou entre a Idade Média e os finais do  séc.
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15 Rodrigues, Simão, Regras para a Província Portuguesa (1548), in Epistolae Pp. Paschasii Broëti, Claudii Jajii, Joannis Codurii et Simonis Rodericii Societatis Jesu ex autographis vel originalibus exemplis (1903), Madrid: Typ. Gabrielis Lopez del Horno, 834-840.
16 BNE, Mss. 8558, Obediências de Roma, Instruções do Visitador Miguel de Sousa para o Colégio de Bragança em 1579, f. 16.
17 BNE, Mss. 8558, Obediências de Roma, Instruções do Visitador Miguel de Sousa para o Colégio de Bragança em 1579, f. 16v.
18 BNE, Mss. 8557, Visitas dos Provinciais e Visitadores ao Colégio de Bragança entre 1598 e 1617, Visita de Cristóvão de Gouveia em 1597, f. 5.
19 BNE, Mss. 8558, Obediências de Roma, Instruções do Visitador Miguel de Sousa para o Colégio de Bragança em 1579, f. 17.
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XVII, as principais refeições servidas nas casas da Companhia de Jesus, naturalmente, incluindo a de Bragança, eram o jantar e a ceia. Estas refeições, que eram antecedidas pelo antipasto, uma espécie de aperitivo de fruta, carne, peixe, ou queijo, eram servidas em dois turnos ou “mesas” na linguagem jesuíta da época. Para além destas duas refeições principais, os membros do Colégio de Bragança, que se encontravam a descansar ou de férias nas quintas de recreação, consumiam uma refeição mais ligeira, a merenda, que consistia em fatias de pão, fruta e/ou uma talhada de queijo. O almoço, que, à época precedia, de imediato, o acordar, estava praticamente limitado aos enfermos e à Quaresma.
Estas duas refeições eram servidas em pratos individuais, os assim chamados pratos de porção preparados antes pelo cozinheiro ou pelo porcionista na cozinha, segundo as instruções do reitor ou do vice-reitor, ou seja, as principais autoridades a nível local.20 Cada comensal devia ter um guardanapo porventura sobre prato próprio, uma faca, uma colher, e um copo individuais. Na mesa encontravam-se ainda jarros de água e vinho, galhetas para o azeite e para o vinagre, um saleiro, um pimenteiro e uma mostardeira. A louça mais comum era a louça de barro e de pau (madeira), pois tratava-se dos materiais mais económicos. Encontrámos ainda referência à difusão de louça de cobre e estanho.21 Por norma, os jarros para o vinho e para a água, assim como as galhetas do vinagre e do azeite eram de vidro.
A alimentação em Bragança era bastante rica em variedade e qualidade, como demonstra a importância da carne e do peixe nas listas de compras. A galinha era o tipo de carne mais consumido. No entanto, o cardápio do Colégio de Bragança também incluía carne de vaca, porco, leitão, carneiro, ovelha e coelho, e ainda, embora mais raramente, caça (perdiz e peru). Embora o bacalhau e a lampreia fossem os peixes de maior importância no regime alimentar da mesma comunidade, também há notícia do consumo de peixe de mar, como a pescada, peixe de rio (lampreia, enguia, truta), marisco e polvo. Entre os vegetais, destacavam-se as lentilhas, o grão, o feijão branco, o feijão fradinho, as ervilhas e o pepino. A maçã era o fruto mais popular, verificando-se ainda um consumo considerável de pêssegos, uvas, melão, melancia, peras, cerejas, figos frescos e figos secos. Para além de figos, também ameixas e peras secas eram muito populares nas dietas alimentares desta instituição durante a Idade Moderna. Os doces mais em voga eram o arroz de leite,
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20 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do P. Provincial Luis Lobo para o Colégio de Bragança em 1633, f. 35r.
21 Visitando em 1598 o Colégio de Bragança, o P. Provincial Cristóvão de Gouveia ordenou que a comida distribuída diariamente aos pobres devia ser servida numa panela em cobre e estanhada destinada exclusivamente a esse fim. (MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 619)
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os ovos reais (doce à base de ovos e açúcar) e o manjar branco (sobremesa feita com leite, amêndoas, açúcar e farinha de arroz). Por fim, o pão era amassado sobretudo com farinha de centeio e farinha de trigo.22
Naturalmente, o tema do sistema alimentar era tanto mais pertinente, quanto se tratava de uma comunidade de religiosos. Todavia, pelo menos no início do séc. XVIII, a prática da abstinência parece ter sido muito liberal. Mais precisamente, em 1702, o P. Provincial Miguel Dias estranhou o facto de, nesse colégio, não ser obrigatório o jejum ao Sábado, como era costume em toda a Província Portuguesa.23
De acordo com o “nuestro modo de proceder” seguido nesta Província, após o toque da campainha, os comensais deviam sentar-se à mesa nos lugares que lhes eram destinados. Em 1610, nas suas Instruções para a Província, o Visitador João Álvares determinou que o vice-reitor do respectivo colégio ocupasse o primeiro lugar, seguindo-se, por esta ordem, o conselheiro, e ainda os colegiais mais graduados. No caso de haver alunos com o mesmo grau, a prioridade seria dada aos mais velhos.24 Alguns anos antes, mais precisamente, em 1598, o Provincial Cristóvão de Gouveia tinha decretado que as refeições fossem servidas a partir da cabeceira.25 Após terem terminado a refeição, os comensais deviam levantarse da mesa, não esperando que os restantes comensais acabassem de comer.26
À semelhança do que era costume instituído nas restantes casas da Companhia em Portugal, em Bragança, as refeições deviam ser tomadas em silêncio e acompanhadas pela leitura de livros religiosos, tais como o Martirológio. De acordo com as determinações do Provincial Francisco de Gouveia de 1596, após a visita a esta instituição, a vida dos santos padroeiros devia ser lida nas vésperas das suas festividades. Quando só se encontrassem quatro ou cinco comensais, bastaria ler um capítulo dos escritos de Gersão ou de qualquer outro livro pio.27
Em 1612, o P. João Álvares decretou que fosse feita a leitura dum capítulo do Contempus Mundi, quando os membros desta comunidade se encontrassem de férias na Quinta do Parâmio, e quando estivessem mais de oito pessoas à mesa.28
Em 1627, foi decretada a leitura das regras da modéstia.29 Por sua vez, em 1633,
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22 ALDEN, Dauril (1996) - The making of an enterprise: the Society of Jesus in Portugal, its empire, and beyond 1540-1750, Stanford (California): University Press, 627.
23 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Instruções do Provincial Miguel Dias em Junho de 1702, f. 101v.
24 ANTT, Armário Jesuítico 5, Visita do P. João Álvares à Província Portuguesa (1610), f. 7.
25 BNE, Mss. 8557, Visita do P. Provincial Cristóvão de Gouveia ao Colégio de Bragança em 1598, f. 45.
26 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 911.
27 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 619.
28 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 631.
29 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do P. Luis Brandão para o Colégio de Bragança em Outubro de 1627, f. 31.
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o P. Provincial Luís Lobo decretou que se passasse a ler as regras dos irmãos coadjutores, quando se liam as regras dos irmãos estudantes, ou seja, duas vezes ao ano.30
O vestuário Para Inácio de Loyola, o mais importante era os jesuítas vestirem de modo honesto, respeitando o voto da pobreza religiosa e tendo em conta a saúde, como foi prescrito pelas regras do Colégio Romano em 1551.31 Em Espanha e em Portugal, os jesuítas usavam a veste clerical com o barrete.32 Ou, como escreveu o P. Araoz de Almeirim a Inácio de Loyola em 1546:
Andam todos vestidos de negro, com sotanas largas, manteos com capillas y bonetes, segun el uso de aqui, muy modestos.33
Usavam os jesuítas inicialmente barretes de configuração redonda, pois este era o traje dos clérigos seculares à chegada dos primeiros membros da Companhia de Jesus a Portugal. Todavia, no início do séc. XVII, os sacerdotes seculares, assim como os jesuítas, começaram a trocar os barretes redondos por barretes quadrados designados por “barretes de cantos”.34
Em 1610, João Álvares decretou que na Província Lusitana as roupetas dos irmãos deviam ser mais compridas que o peito do pé e os mantos deviam ser um pouco mais curtos que as roupas.35 Entre finais do séc. XVI e os inícios do séc. XVII foi introduzido o uso de vestuário realizado em estamenha (tecido de lã de má qualidade confeccionado ao fuso ou o burel usado nos hábitos dos frades)36 e de outros panos finos.37 De acordo com as instruções do Visitador João Álvares em 1610, os jesuítas deviam trajar a mesma roupa dentro e fora de casa.38
Compreensivelmente, a legislação específica para o Colégio de Bragança reflectia uma preocupação com os extremos rigores climáticos que caracterizavam esta região.
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30 BNE, Mss. 8239 Cartapáceo Novo das visitas dos Pes. Provinciais e Visitadores de Bragança de 1619 a 1756, Ordens do P. Provincial Luis Lobo para o Colégio de Bragança em 1633, f. 36.
31 O artigo 8º deste texto diz para no vestir se ter cuidado com a saúde corporal e a decência, a descrição verá o que convém nos particulares. (Regras do Colégio Romano (1551), in Monumenta paedagogica Societatis Iesu, edidit, ex integro refecit novisque textibus auxit (1965), Roma: Institutum Historicum Societatis Iesu, 268.
32 SCADUTO, Mario (1972) - Il Goberno di San Francesco Borgia, in «Archivum Historicum Societatis Iesu», Roma: Institutum Historicum Societatis Iesu, 61, 162.
33 Carta de António de Araoz a Inácio de Loyola, Almeirim, 26 de Abril de 1546, in Epistolae mixtae ex variis Europae locis ab anno 1537 ad 1556 scriptae, nunc primum in lucem editae (1898, Madrid: Avrial e A. Fortanet, I, 162.
34 RODRIGUES, Francisco (1944), História da Companhia de Jesus na Assistência de Portugal, III, 93-94.
35 ANTT, Armário Jesuitíco, n.º 5, Visita da Província de Portugal pelo Padre João Alvarez, 1610, f. 94.
36 Portas Adentro – Glossário: Modos de habitar do séc. XVI a XVIII em Portugal, http://www.portasadentro. ics.uminho.pt/resultados.asp?termo=estamenha
37 BORRÁS, Antonio (1967), En torno a la indumentária de los jesuitas españoles, in «Archivum Historicum Societatis Iesu» 72, Roma: Institutum Historicum Societatis Iesu, 294-295.
38 ANTT, Armário Jesuitíco, n.º 5, Visita da Província de Portugal pelo Padre João Alvarez, 1610, f. 63r.
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esta região. Nesse sentido, em 1597, o Visitador Cristóvão de Gouveia determinou que, para a conservação da saúde, os companheiros de Bragança usassem jaquetas e calças que os defendessem do frio, calçassem escarpins (panos colocados debaixo das meias), dormissem sobre enxergões (colchões de palha usados pelos pobres) e com a cabeça pousada sobre uma tábua.39 Em 1664, após ter visitado o Colégio de Bragança, o Provincial Luis Lopez determinou que se dessem mantos de pano e não de estamenha ou sarja (tecido de seda, lã ou algodão entrançado),40 por considerar que estes dois tecidos não defendiam do frio, da chuva ou do calor e serem ainda de pouca durabilidade.41 De igual modo, em meados do séc. XVII, para melhor se protegerem do frio, os jesuítas de Bragança usavam luvas, mangas com peles de cabra ou cordeiro e meias de lã (outras vezes, meias de estamenha). No início do séc. XVIII, aparece documentada a popularidade de palmilhas de branqueta (estofo de lã). Naturalmente, também os extremos calores do estio brigantino influíram no vestuário da comunidade jesuíta local. Durante o Verão, usavam calções em linho e ainda chapéus de fitas.42

A preocupação com a saúde
Naturalmente, a acomodação aos rigores climáticos para melhor conservar a saúde, que era um dos princípios fundamentais da concepção da Companhia de Jesus, também teve importantes reflexos para além do vestuário. Referimos a construção dum aposento designado de casa de fogo para os habitantes e visitantes do colégio se aquecerem, de varandas viradas a Sul, a instalação de soalhos de ladrilho nas salas de aula e a colocação de panos nas grades nos confessionários onde os padres encostavam a cabeça ou de tábuas no pavimento para as pessoas sentadas pousarem os pés.43
A mesma preocupação espelhava-se naturalmente na procura de cuidados especiais com a alimentação, com a água, e com a limpeza. No que se refere ao primeiro aspecto, mencionamos as prescrições emitidas respectivamente pelo Visitador Cristóvão de Gouveia
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39 BNE, Mss. 8557, Visita de Cristóvão de Gouveia ao colégio de Bragança no ano de 1597, f. 2v.
40 Portas Adentro – Glossário: Modos de habitar do séc. XVI a XVIII em Portugal, http://www.portasadentro. ics.uminho.pt/resultados.asp?termo=sarja
41 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Lista das coisas particulares determinadas pelo P. Luis Lopez ao Colégio de Bragança, f. 70v.
42 BNE, Mss. 8243, Livro de Assentos das compras e vendas do Colégio de Bragança, Assento do Reitor Francisco Pinto, 22 de Abril de 1639, f. 2v; Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Visita ao Colégio de Bragança em Maio de 1642, f. 44v; Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Assento do Colégio de Bragança do Reitor Manuel Luís em 1715, f. 45; Ms. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Instruçoes do P. António Esteves para o Colégio de Bragança em Outubro de 1745, f. 135v;
43 MARTINS, Fausto Sanches - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 624.
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em 1597 e pelo Visitador João Álvares em 1612. De acordo com o texto mais antigo, deviam os responsáveis do Colégio de Bragança evitar o consumo de fruta verde, pepinos e azeitonas. De igual modo, os responsáveis deviam assegurar que o queijo fosse de boa qualidade, mas consumido em pouca quantidade e que o toucinho fosse também de boa qualidade, sem ranço. O carneiro, que poderia ser substituído pela vitela, não devia ser cozido em panelas de cobre. Quando o peixe não fosse fresco, recomendava-se a pescada seca e porventura as sardinhas, o sável e o bacalhau.
Devia-se prestar atenção para que o vinho servido não estivesse nem azedo nem turvo. O vinho velho devia ser servido até à Páscoa, enquanto, no Verão, se devia preferir o vinho branco e o vinho palhete (vinho obtido a partir de castas de uvas tintas e brancas, e, por isso, de cor pouco carregada). O pão de trigo, que devia ser amassado e cozido com cuidado, não devia ser assado em recipientes de cobre, mas sim em recipientes de madeira ou em alguidares de barro.
Compreensivelmente, a alimentação dos enfermos suscitava cuidados especiais.
Como tal, a botica deveria estar bem fornecida de conservas, águas destiladas, açúcar, frutos secos (ameixas, figos, amêndoas) e especiarias. No mesmo texto, o visitador determinou ainda que água para beber fosse trazida da Fonte dos Alfaiates ou de outra fonte com água de boa qualidade. Por sua vez, em 1612, o P. João Álvares determinou que, no Colégio de Bragança, a água fosse guardada em talhas grandes fechadas com uma tábua e tapadas com um pano limpo nas bocas. Estas toalhas teriam que ser lavadas uma vez por mês. A água devia ser coada, antes das refeições.44
Uma preocupação idêntica com a limpeza reflecte-se no cuidado posto na sua manutenção, em especial, no que se referia à cozinha (por exemplo, em 1639, o P. Gouveia recomendou que se tivesse o maior cuidado com a louça do refeitório e da cozinha para que estivesse sempre limpa, devendo, por isso, a louça de estanho do refeitório ser areada várias vezes ao ano),45 à piscina e às latrinas. Também incluímos neste contexto a construção de uma casa de despejo para os restos do refeitório.46
Em 1633, o Provincial P. Rocha relembrou os companheiros de Bragança acerca da proibição de trazer cingidouros na Província. Por esta razão, o mesmo responsável proibiu ainda que se tomassem de fora, se mandassem fazer ou se enviassem cingidouros para outros colégios.
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44 BNE, Mss. 8557, Visitas dos Provinciais e Visitadores ao Colégio de Bragança entre 1598 e 1617,Visita do P. João Álvares em 1612, f. 127.
45 BNE, Ms. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Capítolos que o P. Gaspar de Gouvea deixou copiados visitando o Colégio de Bragança em 1639, f. 42v.
46 MARTINS, Fausto Sanches (1994) - A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 621 e 624.
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Ainda o mesmo texto ordenava que fosse o reitor a decidir o castigo dos moços (ajudantes) da casa.47 Esta e várias outras prescrições exemplificam uma concepção moderada dos castigos e práticas de mortificação e pode ser facilmente relacionada com uma preocupação com a saúde.
Hábitos nocivos (abusos alimentares e problemas disciplinares).
As múltiplas tentativas de combater hábitos alimentares considerados pouco próprios de religiosos demonstram, quanto estes hábitos estavam enraizados. Por exemplo, em 1620, o P. António Mascarenhas ordenou que os visitantes da Quinta do Paraimo tomassem juntos e a horas certas as refeições (almoço, merenda, ceia, e jantar). O mesmo padre proibiu ainda os costumes dos padres prepararem ou mandarem preparar alimentos e de darem carne e peixe em simultâneo.48
Em 1623, o P. Provincial António Mascarenhas proibiu os seus companheiros locais, incluindo o reitor, de guardarem doces nos cubículos.49 Todavia, esta proibição foi letra morta. Dez anos depois, o Provincial Luis Lobo proibiu que os seus companheiros em Bragança levassem coisas de comer ao refeitório ou as guardassem nos seus cubículos.50 Também em Bragança seria comum comer-se carne nos dias de peixe em meados do séc. XVII. Pois, o artigo 3º das Instruções (1637) pelo mesmo padre dizia: “Não haja facilidade em dar carne aos nossos nos dias proibidos”.51 Finalmente, as hierarquias procuravam ainda combater a prática dos jesuítas trazerem alimentos para o colégio que lhes eram oferecidos durante as suas pregações fora.52
Os problemas disciplinares dos membros do Colégio de Bragança datavam de longa data. Em 1575, na sua Informação, o Provincial Manuel Rodrigues refere que o Colégio de Bragança estava “falto de orden en el proceder de casa”.53
Neste contexto, tem que ser feita menção às notórias dificuldades sentidas pelos membros do Colégio de Bragança em manterem o voto do silêncio, como vemos nas inúmeras prescrições. Por exemplo, em 1619, o Visitador Luis Brandão Sénior limitou o espaço para
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47 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Instruções do P. Provincial Pero Rocha para o Colégio de Bragança em Outubro de 1633, f. 39.
48 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do P. Provincial António Mascarenhas para o Colégio de Bragança no ano de 1620, f. 20.
49 BNE, Mss. 8239, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Memoria das ordens do P. Provincial Antonio Mascarenhas para o Colégio de Bragança em 1623, f. 24v.
50 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do P. Provincial Luis Lobo para o Colégio de Bragança em 1633, f. 36v.
51 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do P. Provincial Pero Rocha para o Colégio de Bragança em 1637, f. 41.
52 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Visita ao Colégio de Bragança em Maio de 1642, f. 44.
53 MARTINS, Fausto Sanches, A arquitectura dos primeiros colégios jesuítas de Portugal, I, 603.
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as conversas entre os membros do Colégio e os visitantes ao corredor dos mapas.54 Em 1631, o P. Matias de Sá ordenou que todos se recolhessem em silêncio, quando o repouso e a recreação terminavam. Apenas três anos depois, em 1634, o Provincial Luís Lobo abordou o tema, determinando que se guardasse melhor o silêncio, ou seja, se falasse em voz baixa durante as horas do repouso.55
De igual modo, a documentação demonstra que a hierarquia se debatia frequentemente com comportamentos contrários à manutenção da privacidade.
Referimos contactos considerados demasiado próximos com mulheres, descansar e conversar em locais onde os membros da Companhia podiam ser vistos por externos, como janelas dando para o exterior, visitas sem controlo dos cubiculae de outrem ou de externos aos jesuítas enfermos, ou ainda deslocações sem companhia. No que se refere ao último aspecto, citamos, a título de exemplo, a instrução nr. 8 do P. Pedro Rocha em 1633:
Não vão os nossos sós à quinta de Ricafé, nem aos moinhos, nem ao Parameo, nem a arrecadar as rendas pelos lugares do Parameo; e havendo falta de companheiro, vão a cavalo, nem bastará irem a pé com um moço.56
O tema do lazer ou da recreação era seguramente um tema problemático no Colégio jesuíta de Bragança durante a Época Moderna. A repetição de éditos demonstra a sua ineficácia no combate a luxo e uma imponência excessiva colocada na organização e na celebração das principais festividades, entre as quais, se destacava o dia de Santo Inácio de Loyola a 31 de Julho.57
Na concepção jesuíta, os jogos, enquanto elemento recreativo, desempenhariam um papel importante para a conservação da saúde. Entre outros aspectos, significou este princípio que, em Bragança, existia um espaço próprio para a prática do jogo do truque (jogo com paus e bola). No entanto, alguns jogos e algumas práticas a estes ligados foram rapidamente consideradas excessivos e, por isso, combatidos. Por exemplo, estava esta comunidade proibida de jogar xadrez, por este jogo requerer uma grande concentração.58 De igual modo, a prática de certos jogos, entre eles, o próprio jogo do truque, que parece ter tido uma
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54 BNE, Ms. 8554, Liber Ordinatum, sécs. XVI-XVIII, Ordens do P. Luís Brandão para Colégio de Bragança em 1619, f. 19.
55 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Ordens do Provincial Luís Lobo para o Colégio de Bragança em 1634, f. 38.
56 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Instruções do Provincial Pero Rocha para o Colégio de Bragança em 1633, f. 39.
57 Por exemplo, o artigo 2º das ordens supra referidas do P. Luis Brandão Sénior de 1619 ordenava que no dia de Santo Inácio de Loyola não houvesse folia nem danças, mas se celebrasse a festa na forma comum, com responsos, missa cantada e pregação. Prescrições semelhantes repetiram-se até ao final do séc. XVIII. (BNE, Mss. 8554 Liber Ordinatum, sécs. XVI-XVIII, Ordens do P. Luís Brandão para Colégio de Bragança em 1619, f. 19 e Mss. 8239, Cartapáceo Novo da Visita dos Padres Provinciais e Visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Advertências do Vice Provincial para o Colégio de Bragança em 1629, f. 31v.
58 ANTT, Armário Jesuitíco, n.º 5, Visita da Província de Portugal pelo Padre João Alvarez, 1610, f. 86.
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grande popularidade entre esta comunidade, foi restringida a certos horários. Em 1610, foi proibido que se jogasse o truque antes da missa dos irmãos. Dois anos depois, o Provincial Gouveia proibiu aos jesuítas e restantes membros do Colégio de Bragança de jogarem o truque antes do jantar, quando se encontrassem de férias ou durante o período de descanso semanal na Quinta do Parâmio.59 Em 1642, perante a evidência que a proibição de 1633 de se jogar o truque durante o tempo de repouso continuava a ser desrespeitada em Bragança, foi decidido limitar a sua prática ao repouso da manhã.60
Sem dúvida, a prática de jogos era tão popular, até em demasia, na perspectiva das hierarquias. Pelo contrário, a prática de mortificações e o exercício de humildade pareciam ser deficientes, em especial, durante os períodos de recreação, pelo que, no texto da sua visita a este colégio em 1633, o P. Luís Lobo ordenou:
Pratiquem-se nas férias as mortificações e exercícios de humildade que nos outros colégios se costumam fazer.61

Conclusões
Do estudo do quotidiano do Colégio jesuíta de Bragança, depreendemos, que, sobretudo nos primeiros anos, esta comunidade teve que lutar contra uma série de adversidades ligadas a dificuldades económicas e também aos rigores climáticos. Os principais responsáveis hierárquicos procuraram responder a estes problemas, estabelecendo um sistema alimentar rico e através da acomodação aos mesmos rigores, assim como pela introdução de práticas moderadas de castigos físicos e práticas disciplinares.
Naturalmente, o quotidiano da comunidade jesuíta brigantina seguia, na sua organização, o calendário da Província Portuguesa. Para além da realização de todas as tarefas religiosas inerentes ao seu estatuto, os membros do Colégio do Santo Nome de Jesus de Bragança deviam igualmente realizar uma série de outras tarefas, nomeadamente tarefas de carácter manual.
Debateu-se esta comunidade com dois tipos principais de problemas ou abusos. Destacavam-se os abusos de carácter alimentar e ainda abusos disciplinares. A repetição de decretos e prescrições procurando pôr cobro a estas práticas consideradas abusivas demonstra, todavia, a sua ineficácia.
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59 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756,Lembranças para o Colégio de Bragança pelo P. Provincial Jerónimo Gouveia em 1612, f. 125. 60 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo das visitas dos Pes. Provinciais e Visitadores de Bragança de 1619 a 1756, Ordens do P. Provincial Luis Lobo para o Colégio de Bragança em 1633, f. 27 e Mss. 8239, Cartapáceo Novo da visita dos padres provinciaes e visitadores de Bragança entre 1619 e 1756, Visita do Colégio de Bragança de 1642, f. 44.
61 BNE, Mss. 8239, Cartapáceo Novo das visitas dos Pes. Provinciais e Visitadores de Bragança de 1619 a 1756, Ordens do P. Provincial Luis Lobo para o Colégio de Bragança em 1633, f. 36v.
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ABSTRACT
This text deals with some main features that marked the everyday of the community living in the Jesuit College of Bragança. The foundation of this college occurred in the period of the biggest increase of the Society of Jesus in Portugal. However, its beginnings were particularly difficult (climatic and food difficulties, the undesirability of the Jesuits to live in peripheral areas) so much that the possibility to close the institution was considered.
The fulfillment of religious activities was naturally a main aspect of the everyday of these religious. However, all members of the community were compelled to accomplish manual tasks. The timetables were the same as the timetables of the rest of the assistancy. The food was varied and the dressing habits respected the local specific characteristics.
The concern with health was another fundamental element that marked the everyday of this community. To conclude, this community was affected by two main noxious habits: food abuses and disciplinary problems.

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