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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Sobre a expressão “Entre quem é”

Em Trás-os-Montes e Alto Douro cultivava-se a hospitalidade que consistia em as pessoas receberem sem reservas na sua morada (ethos em grego) o conterrâneo ou o passante que batessem à porta. Esta, durante o dia e até à hora de deitar, estava sempre encostada ao batente, sem recurso à língua da fechadura ou, quando muito, apenas com cravelho ou trinco manejáveis por fora.

Explicar tanta confiança não é tão fácil como parece. Virtudes da terra-mãe que é de todos e todos partilham ou devem partilhar sem animosidades. O instinto do sagrado a revelar-se na comunhão necessária com os outros, o outro de si? Ou somente o hábito da vida simples em que o dar e o receber fazem parte dos olhos nos olhos da vida comunitária? Estas questões conduzem-nos amavelmente ao mundo do paraíso perdido ou das grandes utopias. A ser assim, a comunidade não é só dos que vivem numa localidade, perto uns dos outros, mas alarga-se (alargava-se mais do que se alarga) ao nosso semelhante que em princípio é portador da mesma fiabilidade. As más intenções e velhacarias são excepção que confirma a regra.

A porta de entrada tanto podia ficar ao rés-do-chão como no primeiro piso, ao cimo das escadas. Quem batia nesse tempo era porque ia por bem, precisando de ser atendido e por isso, se estava alguém dentro, ouvia logo: entre quem é. Camilo, o escritor, conta que beneficiou algumas vezes dessa bondade, até em casas bem pobres, e o próprio Zé do Telhado, o salteador, ou “repartidor público” como ele se considerava, foi recebido prontamente em terras de Penaguião, numa noite tempestuosa.

Hoje, em tempos socialmente irrequietos (e frustrantes para os saudosistas), o costume vai rareando, ainda que haja zonas onde neste caso a pureza de espírito, quase sempre aliada à pobreza ou ao espírito da pobreza, exclui medos e temores. A porta da rua sempre encostada (cerrada ou çarrada, segundo também se diz e escreve) permite dizer, assim floridamente, a quem bate: entre quem é.

António Cabral
(Em memória do poeta, ficcionista, cronista, ensaísta, dramaturgo, etnógrafo e divulgador da cultura popular portuguesa)

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