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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 22 de março de 2013

Linguagem Regional e Linguagem Popular no Romance Regionalista Português


[…] Por entre Fraguedos, de MANUEL ANTÓNIO RIBEIRO, é um exemplo extremo de obra que foi escrita para documentar exaustivamente as particularidades de uma terra, neste caso a terra transmontana, e em especial o concelho de Mirandela. O subtítulo do livro – «Romance de costumes transmontanos» – indicia desde logo os propósitos do autor, que são, conforme palavras do prefácio, fazer a «publicação descritiva da maneira como vive, fala, canta e se diverte o povo transmontano, desde as cidades às aldeias, desde as aldeias aos recôncavos onde só chega a rusticidade».
Tais propósitos foram conseguidos, com prejuízo embora do valor estético da obra. Na verdade, Por entre Fraguedos é um repositório vastíssimo de informações sobre hábitos de Trás-os-Montes que se relacionam com o trabalho, vida doméstica e divertimentos. Por exemplo, a obra esclarece como se efectuam, em lugares mirandelenses, as ceifas – «as segadas» –, as vindimas, a apanha da azeitona. Descreve os jogos que entretêm pessoas durante os serões nas longas noites de Inverno.
Também na obra se encontram anotações sobre instrumentos agrícolas e refeições típicas, especialmente as que solenizam o Natal e as que acompanham a matança do porco. Esta cerimónia é explicada ponto por ponto, inclusivamente no que diz respeito ao aproveitamento das diversas partes do corpo do animal (ver Por entre Fraguedos, pp. 46-54).
Este «romance de costumes trasmontanos» fala também de velhas usanças relacionadas com as várias quadras do ano: a fogueira de Natal, o jantar dos Reis, o «repartir do burro» no Carnaval, a Quinta-feira das comadres e a Quinta-feira dos compadres, a «burzigada» de Terça-feira de Entrudo, a «serração da velha» nos meados da Quaresma, etc. (ver Por entre Fraguedos, pp. 198, 212, etc.).
Tantos dados foram coligidos sobre a província, que muitas das páginas do livro parecem as de um roteiro turístico muito completo.
Assim acontece designadamente quando são indicados o número e o nome de freguesias do concelho de Mirandela, o número de olhais das pontes que atravessam a vila e quando se mencionam os seus monumentos: capelas, igrejas, conventos, solares. Aliás, o autor incluiu no volume algumas fotografias de certas localidades (ver, por exemplo, pp.
261 e 271). Além disso, transcreveu a música de canções regionais (ver, por ex., p. 19).
O enredo e as personagens, que não têm verdadeira dimensão romanesca, parecem ser um mero pretexto para o autor desfiar de forma variada e atraente os elementos informativos sobre Trás-os-Montes.
[…] Em Por entre Fraguedos o léxico mirandelense abrange diversos domínios.

Neste romance encontram-se entre outros os seguintes nomes regionais de ou para animais:
bicho-lobo (p. 140) – barata
cadela-beira (p. 278) – espécie de bicho de traça
canhona (p. 112) – cabra ou ovelha velha
goubela (p. 243) – galinha de pescoço pelado
larego (p. 50) – leitão
mico (p. 321) – nome carinhoso com que se chama o gato
parreco (p. 116) – pato
parrica (p. 142) – pata

Manuel António Ribeiro registou as designações que as partes do corpo do suíno, quando morto, recebem em Mirandela. 

Alguns exemplos:
couracha (p. 51) – pele
enguião (p. 53) – tira de toucinho do centro do lombo folho, redanho, suventre (p. 51) – nomes para diferentes espécies de carne gorda
lombelos (p. 53) – lombinhos
peituga (p. 53) – peito
suã (p. 53) – ossos da espinha
ubre (p. 51) – estômago

Designam espécies ou produtos da vegetação local, entre outros, os seguintes vocábulos:
botelha (p. 112) – abóbora amarela
cano (p. 40) – ramo, tronco de árvore
carvalha (p. 62) – crisântemo
chícharos (p. 112) – feijões-frades
ervanço (p. 112) – grão-de-bico
fiolho (p. 173) – funcho
galela (p. 309) – uva esquecida durante a vindima
guiços (p. 26) – paus, pedaços de lenha

Manuel António Ribeiro anotou vocábulos relacionados com trabalhos agrícolas. É o caso dos que dizem respeito às cegadas ou ceifas.

Alguns exemplos:
cornijoula (p. 258 ) – grão negro de cereal
cuanho ou palhiço (p. 257) – palha moída
medouchas (p. 257) – pequenos montes de cereal ceifado
meroiços (p. 257) – idem
rabeira (p. 258) – moinha do grão depois de joeirado
seitoura (p. 256) – foice
vencelho (p. 257) – palha de cereal, em regra centeio, com que se ata cada molho de cereal ceifado.

O escritor retém nomes relacionados com o fabrico do pão, isto é, do trigo (p. 47), que é feito com farinha de trigo passada pela peneira várias vezes, e do charrão (p. 145), feito com a farinha mais grosseira.
Assim, refere ranhadouro (p. 29), que designa o pau com que se remexem as brasas e cinza que aquecem o forno do pão, e raspadoura (p. 229), que nomeia uma espécie de espátula de madeira que, tal como o próprio nome indica, serve para raspar a massa do pão que adere às paredes do recipiente onde se amassa a farinha.
Além disso, Manuel António Ribeiro reteve os nomes locais de vários objectos que integram o universo rural e doméstico dos aldeões mirandelenses. 

Exemplos:
albaneira (p. 280) – cano de água
alquitarra (p. 280) – alambique
badil (p. 28) – pequena pá de ferro
carreto (p. 256) – cabana com rodas onde dorme o pastor
chaspa (p. 34) – tacho de ferro ou de esmalte
cravelho (p. 27) – fecho de madeira nas portas
lançador (p. 322) – espécie de concha com que se põe a comida nos pratos
lareiros (p. 53) – varas do fumeiro
masseirão (p. 48) – vasilha grande de madeira onde por vezes comem os porcos
pêto (p. 93) – mealheiro
raposa (p. 27) –fecho de madeira na porta, que produz o efeito de uma mola
remeia (p. 32) – bilha de folha de flandres que comporta seis litros de líquido
xarega (p. 243) – enxerga

A nomenclatura local de candeia de azeite também é referida, quando uma personagem, depois de ter pegado num desses objectos, diz: «–Tem o espelho, a varela, a tijela e tampa, o bico e bicheiro, o pé, o gancho, o espevitador, a tanaz e corrente e até a respectiva torcida» (p. 25).

Alguns exemplos de adjectivos que qualificam pessoas, recolhidos em Por entre Fraguedos:
acandilada (p. 110) – exausta, prostrada
escalafrada (p. 244) – magricela
bèdeira (p. 93) – bisbilhoteira
biganau (p. 44) – marau; maroto
curjidosa (p. 107) – diligente
firfantona (p. 167) – respondona; atrevida
fistora (p. 44) – pessoa sabida
lafardo (p. 44) – malvado, patife
marraxa (p. 43) – atarracada
nacho (p. 300) – diz-se da pessoa que tem o nariz achatado
piléu (p. 44) – maroto
pròsmeira (p. 107) – manhosa
remisga (p. 15) – palerma
zanarga (p. 167) – amalucada
Exemplos de verbos:
abondar (p. 45) – chegar algum objecto a alguém
anassar (p. 36) – amassar o pão
degranhar (p. 37) – tirar o grão, debulhar ou abrir pinhas
embarrar (p. 142) – bater em alguém
empechinar (p. 176) – ficar envergonhado
esmichar (p. 16) – bater violentamente em alguém; partir alguma coisa em pedaços pequenos
lançar (galinhas) (p. 242) – pôr as galinhas a chocar ovos
uliar (p. 298) – uivar.

Por: Evelina Verdelho

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