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Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço.
A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)
(Henrique Martins)
COLABORADORES LITERÁRIOS
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.
sexta-feira, 22 de março de 2013
Linguagem Regional e Linguagem Popular no Romance Regionalista Português
[…] Por entre Fraguedos, de MANUEL ANTÓNIO RIBEIRO, é um exemplo extremo de obra que foi escrita para documentar exaustivamente as particularidades de uma terra, neste caso a terra transmontana, e em especial o concelho de Mirandela. O subtítulo do livro – «Romance de costumes transmontanos» – indicia desde logo os propósitos do autor, que são, conforme palavras do prefácio, fazer a «publicação descritiva da maneira como vive, fala, canta e se diverte o povo transmontano, desde as cidades às aldeias, desde as aldeias aos recôncavos onde só chega a rusticidade».
Tais propósitos foram conseguidos, com prejuízo embora do valor estético da obra. Na verdade, Por entre Fraguedos é um repositório vastíssimo de informações sobre hábitos de Trás-os-Montes que se relacionam com o trabalho, vida doméstica e divertimentos. Por exemplo, a obra esclarece como se efectuam, em lugares mirandelenses, as ceifas – «as segadas» –, as vindimas, a apanha da azeitona. Descreve os jogos que entretêm pessoas durante os serões nas longas noites de Inverno.
Também na obra se encontram anotações sobre instrumentos agrícolas e refeições típicas, especialmente as que solenizam o Natal e as que acompanham a matança do porco. Esta cerimónia é explicada ponto por ponto, inclusivamente no que diz respeito ao aproveitamento das diversas partes do corpo do animal (ver Por entre Fraguedos, pp. 46-54).
Este «romance de costumes trasmontanos» fala também de velhas usanças relacionadas com as várias quadras do ano: a fogueira de Natal, o jantar dos Reis, o «repartir do burro» no Carnaval, a Quinta-feira das comadres e a Quinta-feira dos compadres, a «burzigada» de Terça-feira de Entrudo, a «serração da velha» nos meados da Quaresma, etc. (ver Por entre Fraguedos, pp. 198, 212, etc.).
Tantos dados foram coligidos sobre a província, que muitas das páginas do livro parecem as de um roteiro turístico muito completo.
Assim acontece designadamente quando são indicados o número e o nome de freguesias do concelho de Mirandela, o número de olhais das pontes que atravessam a vila e quando se mencionam os seus monumentos: capelas, igrejas, conventos, solares. Aliás, o autor incluiu no volume algumas fotografias de certas localidades (ver, por exemplo, pp.
261 e 271). Além disso, transcreveu a música de canções regionais (ver, por ex., p. 19).
O enredo e as personagens, que não têm verdadeira dimensão romanesca, parecem ser um mero pretexto para o autor desfiar de forma variada e atraente os elementos informativos sobre Trás-os-Montes.
[…] Em Por entre Fraguedos o léxico mirandelense abrange diversos domínios.
Neste romance encontram-se entre outros os seguintes nomes regionais de ou para animais:
bicho-lobo (p. 140) – barata
cadela-beira (p. 278) – espécie de bicho de traça
canhona (p. 112) – cabra ou ovelha velha
goubela (p. 243) – galinha de pescoço pelado
larego (p. 50) – leitão
mico (p. 321) – nome carinhoso com que se chama o gato
parreco (p. 116) – pato
parrica (p. 142) – pata
Manuel António Ribeiro registou as designações que as partes do corpo do suíno, quando morto, recebem em Mirandela.
Alguns exemplos:
couracha (p. 51) – pele
enguião (p. 53) – tira de toucinho do centro do lombo folho, redanho, suventre (p. 51) – nomes para diferentes espécies de carne gorda
lombelos (p. 53) – lombinhos
peituga (p. 53) – peito
suã (p. 53) – ossos da espinha
ubre (p. 51) – estômago
Designam espécies ou produtos da vegetação local, entre outros, os seguintes vocábulos:
botelha (p. 112) – abóbora amarela
cano (p. 40) – ramo, tronco de árvore
carvalha (p. 62) – crisântemo
chícharos (p. 112) – feijões-frades
ervanço (p. 112) – grão-de-bico
fiolho (p. 173) – funcho
galela (p. 309) – uva esquecida durante a vindima
guiços (p. 26) – paus, pedaços de lenha
Manuel António Ribeiro anotou vocábulos relacionados com trabalhos agrícolas. É o caso dos que dizem respeito às cegadas ou ceifas.
Alguns exemplos:
cornijoula (p. 258 ) – grão negro de cereal
cuanho ou palhiço (p. 257) – palha moída
medouchas (p. 257) – pequenos montes de cereal ceifado
meroiços (p. 257) – idem
rabeira (p. 258) – moinha do grão depois de joeirado
seitoura (p. 256) – foice
vencelho (p. 257) – palha de cereal, em regra centeio, com que se ata cada molho de cereal ceifado.
O escritor retém nomes relacionados com o fabrico do pão, isto é, do trigo (p. 47), que é feito com farinha de trigo passada pela peneira várias vezes, e do charrão (p. 145), feito com a farinha mais grosseira.
Assim, refere ranhadouro (p. 29), que designa o pau com que se remexem as brasas e cinza que aquecem o forno do pão, e raspadoura (p. 229), que nomeia uma espécie de espátula de madeira que, tal como o próprio nome indica, serve para raspar a massa do pão que adere às paredes do recipiente onde se amassa a farinha.
Além disso, Manuel António Ribeiro reteve os nomes locais de vários objectos que integram o universo rural e doméstico dos aldeões mirandelenses.
Exemplos:
albaneira (p. 280) – cano de água
alquitarra (p. 280) – alambique
badil (p. 28) – pequena pá de ferro
carreto (p. 256) – cabana com rodas onde dorme o pastor
chaspa (p. 34) – tacho de ferro ou de esmalte
cravelho (p. 27) – fecho de madeira nas portas
lançador (p. 322) – espécie de concha com que se põe a comida nos pratos
lareiros (p. 53) – varas do fumeiro
masseirão (p. 48) – vasilha grande de madeira onde por vezes comem os porcos
pêto (p. 93) – mealheiro
raposa (p. 27) –fecho de madeira na porta, que produz o efeito de uma mola
remeia (p. 32) – bilha de folha de flandres que comporta seis litros de líquido
xarega (p. 243) – enxerga
A nomenclatura local de candeia de azeite também é referida, quando uma personagem, depois de ter pegado num desses objectos, diz: «–Tem o espelho, a varela, a tijela e tampa, o bico e bicheiro, o pé, o gancho, o espevitador, a tanaz e corrente e até a respectiva torcida» (p. 25).
Alguns exemplos de adjectivos que qualificam pessoas, recolhidos em Por entre Fraguedos:
acandilada (p. 110) – exausta, prostrada
escalafrada (p. 244) – magricela
bèdeira (p. 93) – bisbilhoteira
biganau (p. 44) – marau; maroto
curjidosa (p. 107) – diligente
firfantona (p. 167) – respondona; atrevida
fistora (p. 44) – pessoa sabida
lafardo (p. 44) – malvado, patife
marraxa (p. 43) – atarracada
nacho (p. 300) – diz-se da pessoa que tem o nariz achatado
piléu (p. 44) – maroto
pròsmeira (p. 107) – manhosa
remisga (p. 15) – palerma
zanarga (p. 167) – amalucada
Exemplos de verbos:
abondar (p. 45) – chegar algum objecto a alguém
anassar (p. 36) – amassar o pão
degranhar (p. 37) – tirar o grão, debulhar ou abrir pinhas
embarrar (p. 142) – bater em alguém
empechinar (p. 176) – ficar envergonhado
esmichar (p. 16) – bater violentamente em alguém; partir alguma coisa em pedaços pequenos
lançar (galinhas) (p. 242) – pôr as galinhas a chocar ovos
uliar (p. 298) – uivar.
Por: Evelina Verdelho
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