Falar em Izeda, sobretudo no contexto histórico e sócio-cultural, e esquecer Raul Morais, é como “amputar” a conversa e desvalorizar um dos izedenses com mais identidade que, com postura invulgar, lutou pelas suas ideias, pela sua terra, pela sua região e pela razão. Diria que não conhecer o Raul Morais e a sua obra no contexto histórico literário da região de Izeda e até do Nordeste Transmontano é revelador de falta de qualidade formativa e sensibilidade cultural.
Sete anos após a sua morte, não poderia deixar de o evocar e relembrar neste espaço mediático que ele, empenhadamente, serviu e promoveu.
Raul Morais mereceria dos seus conterrâneos um pouco mais. Pelo que foi, pelo que lutou, pelo que conseguiu e pela forma simples e desprendida como sempre se comportou.
Não há dúvidas que nem sempre a terra que o viu nascer, sendo em Izeda que, até à morte, decidiu viver, lhe reconheceu, devidamente, o seu mérito ao nível literário. E, neste domínio, o Raul era singularmente um artista da escrita e da palavra. Do pensamento e da indignação, principalmente contra poderes instituídos que não potenciavam a verdadeira liberdade, nem promoviam o desenvolvimento equilibrado do país, muito menos da região.
Convivi de perto com este distinto homem da escrita de Izeda e não raras vezes percebi a sua angústia, o seu sofrimento, o seu desconforto e a sede de justiça a todo o momento. Na sua luta pela vida, nem sempre foi materialmente bem-sucedido, e até ao nível da saúde acabou por ser durante muito tempo desfavorecido e, finalmente, traído. Mas deixou amigos e um produto literário que sustenta exemplarmente a sua memória e também o suficiente motivo pelo qual nunca será esquecido e ficará na história.
Sem formação académica superior, o Raul Morais deixou uma obra ao nível da poesia e da prosa, que bem pode ser o orgulho de Izeda e do Nordeste Transmontano. Ácido Canto (1974), Tempo Justiceiro (1976), Auto de Penúria da Vida do Povo (1978), Que Deus Exista (1984), Canto Insubmisso (1992), Izeda no Passado e no Presente (1969),Figuras Populares de Izeda (1987), Izeda Pedaços da Sua História (1996), Sermões às Fragas (2000), Álbum de Saudades (2001), Sementeira de Palavras de Terra Dura (2004) e Augusto Manuel Alves Veiga: Chefe Civil da Revolta do Porto de 31 de Janeiro de 1891 (2007), são testemunho reveladores de um poeta do povo, escritor autodidata, que na sua simplicidade abria a sua alma escrevendo, sem orgulho nem vaidade.
Esquecida, também, não será a sua intervenção como diretor dos jornais, Verde Planura e Sineta, colaborando, ainda com muitas outras publicações regionais e nacionais, bem como o seu importante contributo como cofundador e entusiasta de atividades cívicas izedenses, como o Movimento de Elevação de Izeda a Vila, Criação da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários, Construção da Escola C+S, do Novo Quartel da GNR, Movimento da Criação da Corporativa de Azeite, Fundação do Grupo Desportivo, Construção do Centro de Saúde, etc.
Entre outros cargos públicos, foi, durante três mandatos, presidente de Junta de Freguesia de Izeda, tendo, ainda, assumido o lugar de secretário durante uma mandato.
Por tudo isto e muito mais, nascido em Izeda a 24 de Abril de 1947, falecendo prematuramente, não podemos deixar de recordar, Raul Morais, hoje e SEMPRE, sobretudo pela frontalidade e entrega na defesa dos interesses da sua terra em particular e da região transmontana em geral, nunca esquecendo o sofrimento e as carências das suas gentes, assumindo-se, com particular humildade, como um lutador por causas nobres, principalmente pelas promotoras da melhoria das condições de vida do “seu” povo.
Nuno Pires
in:mdb.pt
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