Por: Ernesto Rodrigues
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Academia.edu informa-me, todos os dias, de artigos meus lidos ou citados. Eu devia pagar o acesso aos dados, mas não estou interessado, pois vejo-me pouco ao espelho e nunca desejei competir na investigação, que tomo como obrigação imperiosa e serviço útil a outrem. Será isto suficiente para um reconhecimento que faça singrar na carreira? Quem reconhece essa utilidade, capaz de a distinguir de jogadas de bastidores?
Venho de licenciaturas com cinco anos e quatro anos de mestrado. Hoje, o ensino à bolonhesa, feito de semestres de três ou quatro meses, faz licenciados num triénio e mestres com um ou dois anos. Saem doutores antes dos trinta, a uma velocidade tal, que esbarram no desemprego ou em caixa de supermercado. É possível ser doutor sem outros contributos que não seja uma tese; mas doutor por extenso ainda exije tese. Escrita pelo próprio?
Esta agitação vivia-se já nos anos 90, quando se multiplicavam dissertações e teses, sem o furor de hoje, em que se passou de uma investigação bibliográfica à web-bibliográfica. Aquela exigia bibliotecas, hemerotecas e arquivos, com riscos para a saúde; agora, não é preciso sair de casa. Despontavam, todavia, vícios cada vez mais comuns, antes dos programas antiplágio: mestranda brasileira ficou em lágrimas, e desistiu, quando denunciei cópia em capítulo sobre Camões; e um colega meu, assistente, quase via a tese aprovada em comissão científica, não fosse outro colega chegar atrasado à reunião, folheá-la e ver-se usurpado, sem mais aquelas. O sonho morreu ali, e o candidato instalou-se numa privada, decerto sem estados de alma.
Sem tempo para recolher dados, interpretá-los, criar conhecimento e, porque não?, alguma sabedoria, Bolonha matou a investigação nos trabalhos de longue durée. Nas literaturas, docentes inamovíveis repetem matérias; quando na pele de orientadores, aconselham as bibliografias-tipo, o que vai desaguar em discursos inócuos, raramente editados, nem sequer lidos online, tão pouco servem à comunidade. A primeira parte é sempre teórica, e todos os orientandos seguem a mesma bússola, em réplicas insossas, sem sobressaltos interpretativos. As fórmulas são: como diz este, segundo aquele, e, de citação em citação, nem sempre declarada, constroem-se edifícios vazios, tantas vezes comprados – pois há mercado para os trabalhos universitários, vendidos por milhares de euros.
Na minha novela “A morte do autor” (em Cruzeiro Literário, 2024), há uma catedrática que escreveu uma só vez sobre obra cujo título nem transcrevia correctamente, mas que, anualmente, retomava o assunto, remetendo para o ensaio anterior, como gato à volta da cauda. Não interessava o que dizia, mas o número de vezes que se citava: durante 25 anos, andou à volta do mesmo, aumentando, numa progressão lamentável, as autocitações, pois o vigésimo quinto capítulo do seu único livro, anualmente acrescentado, remetia, re-citando-se, para partes dos 24 anteriores, perfazendo milhares de presenças do próprio nome nos indexantes académicos… A novela parodia, ainda, a febre dos congressos com os títulos mais estranhos, de preferência internacionais (e basta que venha um estrangeiro), com participações e assistências pagas, de que sai um diploma conveniente para efeitos de bibliometria. A novela é mais do que isto, enquanto mostra a inanidade de certas humanidades.
Vamos, assim, concluindo dos riscos das fáceis bibliometrias que avaliam e fazem subir na carreira. Longe, porém, das bibliometrias fabricadas a metro, muito além da ficção, como a realidade veio provar.
O diário El País denunciou, em alguns artigos, o actual reitor da Universidade de Salamanca, Juan Manuel Corchado, catedrático de ciências da computação, «uno de los científicos más citados del mundo gracias a miles de autocitas, a apremiar a sus propios trabajadores para que le citasen y a decenas de perfiles falsos dedicados a mencionarle» (30-V-2024). Eis como, em 2021, este senhor era o quarto melhor cintista espanhol e um dos 250 melhores do mundo no campo da informático. Através de um «cartel de citas», uns tantos citam-se entre si, e a maioria, subordinada, cita o chefe a torto e direito, mesmo que o assunto esteja a léguas: «El matemático Roberto Casado Vara firmó el 9 de enero de 2019 una publicación sobre la seguridad informática en redes de distribución eléctrica. El 94% de las referencias (29 de 31) eran citas a trabajos de Corchado, aunque no tuviesen nada que ver: estudios sobre el riesgo de cáncer de vejiga, el CO₂ en el océano, vertidos de petróleo, mareas rojas de microalgas.»
Estas práticas fraudulentas chegam a extremos ridículos – e risíveis: «El 7 de junio de 2017, una ayudante de Corchado escribió a sus subordinados este mensaje: “Recopilad todo lo que tengáis (trabajos de fin de máster, proyectos de fin de carrera, trabajos de fin de grado, tesis, etcétera) e incluid en los mismos 20 referencias de entre las que os adjunto en el documento Word y 10 artículos de ADCAIJ”, seja, Advances in Distributed Computing and Artificial Intelligence Journal, revista editada por Corchado. «El archivo adjunto incluía casi medio centenar de publicaciones de Corchado. La colaboradora insistió un rato después: “Como sé que andamos todos ahora a tope, para que sea más fácil, os adjunto las referencias ya solo para copiar y pegar”.»
Um súbdito conquistou o principado deste modo: «Solo el 9 de enero de 2019, Roberto Casado Vara publicó tres trabajos en los que entre el 97% y el 100% de las referencias eran citas a Corchado o a ADCAIJ. El catedrático, nacido en Salamanca hace 53 años, es uno de los científicos más citados del mundo según el ranking elaborado cada año por la Universidad de Stanford. Lo más sorprendente es que Casado Vara, mucho más joven, también entró en esa prestigiosa clasificación en 2022, apenas tres años después de presentar su tesis doctoral, dirigida por Corchado.»
Este «ha utilizado las actas de congresos publicadas en la editorial Springer como coladero para incluir ristras de citas a sí mismo. Informado por este periódico, el director de integridad científica de Springer Nature, Chris Graf, afirma que van a examinar “minuciosamente” el caso del catedrático salmantino. “Si corresponde, tomaremos medidas editoriales una vez que esta investigación haya concluido”, asevera Graf. Otra editorial, Elsevier, ya retiró un estudio de Corchado y tres colaboradores en 2019 por plagiar un trabajo de fin de máster.
El investigador hacía distintos tipos de trampas para amañar diferentes rankings. Publicaba en el repositorio científico de la Universidad de Salamanca documentos plagados de autocitas, para que los registrase el motor de búsqueda de Google Académico, de cuyos indicadores se nutrían rankings como Guide2Research, en el que Corchado rozaba el podio nacional. […] Corchado llegó a publicar un único párrafo con 227 citas a sí mismo y otras 139 a su revista ADCAIJ.
[…] El catedrático de Salamanca, además de añadir miles de autocitas a sus propias publicaciones y de exigir a sus trabajadores que también le citasen, se ha beneficiado de multitud de perfiles falsos de científicos inexistentes, como Devika Rout y Marcus Ress, dedicados a mencionar compulsivamente sus estudios en el repositorio ResearchGate. […]
Uno de los referentes internacionales en métodos de evaluación de los científicos, Ismael Ràfols, señala al sistema. “Esta corrupción ocurre porque hay un determinado sistema de evaluación, que valora publicar mucho y que te citen. En Europa hemos empezado una reforma y España tiene muchos deberes por delante”, afirma Ràfols, de la Universidad de Leiden (Países Bajos).» Portugal, também.
Eis no que dão as bibliometrias, que interessam às principais editoras comerciais - Elsevier, Wiley, Taylor & Francis, Springer Nature e SAGE -, cujas receitas anuais estão nos milhares de milhões. Será mais conhecida a Web of Science (WoS) da Thomson Reuteurs, principal ferramenta para análise de citações; mas a Scopus da Elsevier e Google Scholar entraram na dança, esta com a única vantagem de ser gratuita.
Em Portugal, não há nenhuma editora indexada A; poucas são B, e as C, onde encontramos universidades prestigiadas, não interessam. Indexar uma revista é um calvário; publicar um artigo lá fora, ou entrar em índices A, só se forem pagos. Em princípio, um artigo vale mais do que um livro; o mesmo para um capítulo em obra colectiva, razão pela qual certas teses não saem: é preferível ir saindo aos pedaços, qual matéria nova e actual. Algumas editoras multiplicam números especiais, tanta é a procura. Sem falar nos professores que, adstritos à casa-mãe, vendem o nome às sauditas e outras em troca de milhares, as quais, contabilizando também a produção alheia, sobem nos rankings. A revisão de pares é, muitas vezes, uma piada.
Não admira, assim, que um gato tenha publicado 12 artigos científicos. Veja-se La Repubblica de 4 de Agosto: «A leggere il suo profilo online su Google Scholar, Larry Richardson è un giovane e stimato accademico angloamericano.
Matematico di talento, negli ultimi quattro anni ha pubblicato 12 articoli scientifici sulla piattaforma online del gigante di Mountain View e ben 11 sono stati citati da altri professori o ricercatori.»
Acontece que este cientista é um gato inventado por dois académicos, um dos quais sobrinho da senhora que tem o gato Larry. Percebedo que se forjam currículos com dinheiro por sob a mesa, testaram o sistema, provando quão fácil é enganar quem acredita piamente (e, depois, cita) em artigos sem fundamento e citações falsas. Carregaram os ensaios em ResearchGate e o Google Scholar reconheceu não só como veraddeiros os 12 falsos do gato Larry Richardson, como 12 outros artigos de autores inventados que citavam os de de Larry, um gato feliz, que contabilizou 132 citações científicas na plataforma. Mas era tudo falso.
O impacto de um texto avalia-se pelo número de vezes que é citado, mesmo que nunca se venham a descobrir falsificações laboratoriais, nas áreas científicas, em que há mais publicações, ou se perceba a inocuidade de alegadas pesquisas em Humanidades. SCImago Journal Rank (SJR) indexa os periódicos destes universos em circulação.
Além de uma avaliação científica, pedagógica e administrativa cada dois anos, para melhoria salarial, os concursos exigem (ou exigiam, nos meus anos universitários), entre outras alíneas, umas tantas produções indexadas num certo lapso temporal. As decisões continuam a ser, todavia, maioritariamente, aleatórias, isto é, dirigidas a um alvo preferencial. Escolhas a dedo têm levado muito concurso a tribunal, aqui e lá fora.
Esta engrenagem toca de perto os centros de investigação, cujos membros, só remunerados se bolseiros, produzem à atenção da FCT e das equipas estrangeiras que nem sempre lêem ou falam Português. O domínio abstruso do Inglês, também determinando a bibliometria, seria outra conversa. Ora, o dinheiro do contribuinte nem sempre tem o melhor uso em centros que pouco ou nada produzem.
A ensaísta da minha novela escrevia sobre um autor que julgava conhecer, porque retratado na badana do único livro. Mesmificando os seus textos, queria combater o primeiro e decisivo ensaio sobre essa obra-prima. Vai pagando ao autor, até que o arrasta à faculdade, para conferência muito badalada e concorrida. Por ironia, ele lê essa prosa interpretativa primordial, que a senhora combatia há 25 anos e 25 capítulos. Pior: aparece morto na faculdade. É um inquilino na antiga casa do verdadeiro autor, colega da infeliz catedrática. Não é o último descaso que acontece à senhora, cuja carreira se fez mordendo a própria cauda e quem não lhe caía no goto.
A Universidade deixou de pensar e de se pensar. Em certos domínios, tornou-se inútil à sociedade. Sem uma parceria entre ambas, não se vai longe: continuará o abandono, enquanto estudar fica cada vez mais caro, ao próprio e ao Estado. É uma selva de dados à mão de semear, lançados em terreno grandemente árido, infecundo. Com mais de mil cursos disponíveis, é hora de, a frio, rever a matéria, evitando futuras práticas concorrenciais que desaguam na fraude e no negócio de poucos.
Venho de licenciaturas com cinco anos e quatro anos de mestrado. Hoje, o ensino à bolonhesa, feito de semestres de três ou quatro meses, faz licenciados num triénio e mestres com um ou dois anos. Saem doutores antes dos trinta, a uma velocidade tal, que esbarram no desemprego ou em caixa de supermercado. É possível ser doutor sem outros contributos que não seja uma tese; mas doutor por extenso ainda exije tese. Escrita pelo próprio?
Esta agitação vivia-se já nos anos 90, quando se multiplicavam dissertações e teses, sem o furor de hoje, em que se passou de uma investigação bibliográfica à web-bibliográfica. Aquela exigia bibliotecas, hemerotecas e arquivos, com riscos para a saúde; agora, não é preciso sair de casa. Despontavam, todavia, vícios cada vez mais comuns, antes dos programas antiplágio: mestranda brasileira ficou em lágrimas, e desistiu, quando denunciei cópia em capítulo sobre Camões; e um colega meu, assistente, quase via a tese aprovada em comissão científica, não fosse outro colega chegar atrasado à reunião, folheá-la e ver-se usurpado, sem mais aquelas. O sonho morreu ali, e o candidato instalou-se numa privada, decerto sem estados de alma.
Sem tempo para recolher dados, interpretá-los, criar conhecimento e, porque não?, alguma sabedoria, Bolonha matou a investigação nos trabalhos de longue durée. Nas literaturas, docentes inamovíveis repetem matérias; quando na pele de orientadores, aconselham as bibliografias-tipo, o que vai desaguar em discursos inócuos, raramente editados, nem sequer lidos online, tão pouco servem à comunidade. A primeira parte é sempre teórica, e todos os orientandos seguem a mesma bússola, em réplicas insossas, sem sobressaltos interpretativos. As fórmulas são: como diz este, segundo aquele, e, de citação em citação, nem sempre declarada, constroem-se edifícios vazios, tantas vezes comprados – pois há mercado para os trabalhos universitários, vendidos por milhares de euros.
Na minha novela “A morte do autor” (em Cruzeiro Literário, 2024), há uma catedrática que escreveu uma só vez sobre obra cujo título nem transcrevia correctamente, mas que, anualmente, retomava o assunto, remetendo para o ensaio anterior, como gato à volta da cauda. Não interessava o que dizia, mas o número de vezes que se citava: durante 25 anos, andou à volta do mesmo, aumentando, numa progressão lamentável, as autocitações, pois o vigésimo quinto capítulo do seu único livro, anualmente acrescentado, remetia, re-citando-se, para partes dos 24 anteriores, perfazendo milhares de presenças do próprio nome nos indexantes académicos… A novela parodia, ainda, a febre dos congressos com os títulos mais estranhos, de preferência internacionais (e basta que venha um estrangeiro), com participações e assistências pagas, de que sai um diploma conveniente para efeitos de bibliometria. A novela é mais do que isto, enquanto mostra a inanidade de certas humanidades.
Vamos, assim, concluindo dos riscos das fáceis bibliometrias que avaliam e fazem subir na carreira. Longe, porém, das bibliometrias fabricadas a metro, muito além da ficção, como a realidade veio provar.
O diário El País denunciou, em alguns artigos, o actual reitor da Universidade de Salamanca, Juan Manuel Corchado, catedrático de ciências da computação, «uno de los científicos más citados del mundo gracias a miles de autocitas, a apremiar a sus propios trabajadores para que le citasen y a decenas de perfiles falsos dedicados a mencionarle» (30-V-2024). Eis como, em 2021, este senhor era o quarto melhor cintista espanhol e um dos 250 melhores do mundo no campo da informático. Através de um «cartel de citas», uns tantos citam-se entre si, e a maioria, subordinada, cita o chefe a torto e direito, mesmo que o assunto esteja a léguas: «El matemático Roberto Casado Vara firmó el 9 de enero de 2019 una publicación sobre la seguridad informática en redes de distribución eléctrica. El 94% de las referencias (29 de 31) eran citas a trabajos de Corchado, aunque no tuviesen nada que ver: estudios sobre el riesgo de cáncer de vejiga, el CO₂ en el océano, vertidos de petróleo, mareas rojas de microalgas.»
Estas práticas fraudulentas chegam a extremos ridículos – e risíveis: «El 7 de junio de 2017, una ayudante de Corchado escribió a sus subordinados este mensaje: “Recopilad todo lo que tengáis (trabajos de fin de máster, proyectos de fin de carrera, trabajos de fin de grado, tesis, etcétera) e incluid en los mismos 20 referencias de entre las que os adjunto en el documento Word y 10 artículos de ADCAIJ”, seja, Advances in Distributed Computing and Artificial Intelligence Journal, revista editada por Corchado. «El archivo adjunto incluía casi medio centenar de publicaciones de Corchado. La colaboradora insistió un rato después: “Como sé que andamos todos ahora a tope, para que sea más fácil, os adjunto las referencias ya solo para copiar y pegar”.»
Um súbdito conquistou o principado deste modo: «Solo el 9 de enero de 2019, Roberto Casado Vara publicó tres trabajos en los que entre el 97% y el 100% de las referencias eran citas a Corchado o a ADCAIJ. El catedrático, nacido en Salamanca hace 53 años, es uno de los científicos más citados del mundo según el ranking elaborado cada año por la Universidad de Stanford. Lo más sorprendente es que Casado Vara, mucho más joven, también entró en esa prestigiosa clasificación en 2022, apenas tres años después de presentar su tesis doctoral, dirigida por Corchado.»
Este «ha utilizado las actas de congresos publicadas en la editorial Springer como coladero para incluir ristras de citas a sí mismo. Informado por este periódico, el director de integridad científica de Springer Nature, Chris Graf, afirma que van a examinar “minuciosamente” el caso del catedrático salmantino. “Si corresponde, tomaremos medidas editoriales una vez que esta investigación haya concluido”, asevera Graf. Otra editorial, Elsevier, ya retiró un estudio de Corchado y tres colaboradores en 2019 por plagiar un trabajo de fin de máster.
El investigador hacía distintos tipos de trampas para amañar diferentes rankings. Publicaba en el repositorio científico de la Universidad de Salamanca documentos plagados de autocitas, para que los registrase el motor de búsqueda de Google Académico, de cuyos indicadores se nutrían rankings como Guide2Research, en el que Corchado rozaba el podio nacional. […] Corchado llegó a publicar un único párrafo con 227 citas a sí mismo y otras 139 a su revista ADCAIJ.
[…] El catedrático de Salamanca, además de añadir miles de autocitas a sus propias publicaciones y de exigir a sus trabajadores que también le citasen, se ha beneficiado de multitud de perfiles falsos de científicos inexistentes, como Devika Rout y Marcus Ress, dedicados a mencionar compulsivamente sus estudios en el repositorio ResearchGate. […]
Uno de los referentes internacionales en métodos de evaluación de los científicos, Ismael Ràfols, señala al sistema. “Esta corrupción ocurre porque hay un determinado sistema de evaluación, que valora publicar mucho y que te citen. En Europa hemos empezado una reforma y España tiene muchos deberes por delante”, afirma Ràfols, de la Universidad de Leiden (Países Bajos).» Portugal, também.
Eis no que dão as bibliometrias, que interessam às principais editoras comerciais - Elsevier, Wiley, Taylor & Francis, Springer Nature e SAGE -, cujas receitas anuais estão nos milhares de milhões. Será mais conhecida a Web of Science (WoS) da Thomson Reuteurs, principal ferramenta para análise de citações; mas a Scopus da Elsevier e Google Scholar entraram na dança, esta com a única vantagem de ser gratuita.
Em Portugal, não há nenhuma editora indexada A; poucas são B, e as C, onde encontramos universidades prestigiadas, não interessam. Indexar uma revista é um calvário; publicar um artigo lá fora, ou entrar em índices A, só se forem pagos. Em princípio, um artigo vale mais do que um livro; o mesmo para um capítulo em obra colectiva, razão pela qual certas teses não saem: é preferível ir saindo aos pedaços, qual matéria nova e actual. Algumas editoras multiplicam números especiais, tanta é a procura. Sem falar nos professores que, adstritos à casa-mãe, vendem o nome às sauditas e outras em troca de milhares, as quais, contabilizando também a produção alheia, sobem nos rankings. A revisão de pares é, muitas vezes, uma piada.
Não admira, assim, que um gato tenha publicado 12 artigos científicos. Veja-se La Repubblica de 4 de Agosto: «A leggere il suo profilo online su Google Scholar, Larry Richardson è un giovane e stimato accademico angloamericano.
Matematico di talento, negli ultimi quattro anni ha pubblicato 12 articoli scientifici sulla piattaforma online del gigante di Mountain View e ben 11 sono stati citati da altri professori o ricercatori.»
Acontece que este cientista é um gato inventado por dois académicos, um dos quais sobrinho da senhora que tem o gato Larry. Percebedo que se forjam currículos com dinheiro por sob a mesa, testaram o sistema, provando quão fácil é enganar quem acredita piamente (e, depois, cita) em artigos sem fundamento e citações falsas. Carregaram os ensaios em ResearchGate e o Google Scholar reconheceu não só como veraddeiros os 12 falsos do gato Larry Richardson, como 12 outros artigos de autores inventados que citavam os de de Larry, um gato feliz, que contabilizou 132 citações científicas na plataforma. Mas era tudo falso.
O impacto de um texto avalia-se pelo número de vezes que é citado, mesmo que nunca se venham a descobrir falsificações laboratoriais, nas áreas científicas, em que há mais publicações, ou se perceba a inocuidade de alegadas pesquisas em Humanidades. SCImago Journal Rank (SJR) indexa os periódicos destes universos em circulação.
Além de uma avaliação científica, pedagógica e administrativa cada dois anos, para melhoria salarial, os concursos exigem (ou exigiam, nos meus anos universitários), entre outras alíneas, umas tantas produções indexadas num certo lapso temporal. As decisões continuam a ser, todavia, maioritariamente, aleatórias, isto é, dirigidas a um alvo preferencial. Escolhas a dedo têm levado muito concurso a tribunal, aqui e lá fora.
Esta engrenagem toca de perto os centros de investigação, cujos membros, só remunerados se bolseiros, produzem à atenção da FCT e das equipas estrangeiras que nem sempre lêem ou falam Português. O domínio abstruso do Inglês, também determinando a bibliometria, seria outra conversa. Ora, o dinheiro do contribuinte nem sempre tem o melhor uso em centros que pouco ou nada produzem.
A ensaísta da minha novela escrevia sobre um autor que julgava conhecer, porque retratado na badana do único livro. Mesmificando os seus textos, queria combater o primeiro e decisivo ensaio sobre essa obra-prima. Vai pagando ao autor, até que o arrasta à faculdade, para conferência muito badalada e concorrida. Por ironia, ele lê essa prosa interpretativa primordial, que a senhora combatia há 25 anos e 25 capítulos. Pior: aparece morto na faculdade. É um inquilino na antiga casa do verdadeiro autor, colega da infeliz catedrática. Não é o último descaso que acontece à senhora, cuja carreira se fez mordendo a própria cauda e quem não lhe caía no goto.
A Universidade deixou de pensar e de se pensar. Em certos domínios, tornou-se inútil à sociedade. Sem uma parceria entre ambas, não se vai longe: continuará o abandono, enquanto estudar fica cada vez mais caro, ao próprio e ao Estado. É uma selva de dados à mão de semear, lançados em terreno grandemente árido, infecundo. Com mais de mil cursos disponíveis, é hora de, a frio, rever a matéria, evitando futuras práticas concorrenciais que desaguam na fraude e no negócio de poucos.
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