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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 5 de março de 2014

Fiolho, Carqueja e outras ervas

Herdeira de um saber que tem passado de geração em geração, Felisbina Rosa Fernandes, de Constantim, conhece bem as ervas que povoam as Terras de Miranda, bem como as suas propriedades benéficas para aquilo a que chama “males do corpo”.
Foto: Aida Sofia Lima

“Há testemunho de que as ervas já eram utilizadas na Grécia Antiga, onde eram conhecidas pelas propriedades aromáticas e constituíam a base do tratamento de numerosas doenças. Hipócrates, médico grego, descreveu centenas de medicamentos à base dessas plantas, cuja utilização se manteve ao longo de muitos séculos”. Sem conhecimentos na área da farmacologia, Felisbina Rosa Fernandes, de Constantim, Miranda do Douro, vale-se da sabedoria popular, e da ciência que herdou da sua avó, dominando o mundo das ervas e dos chás, que são resposta para todos os males do corpo. “Fui criada com a minha avó até aos onze anos e ela andava muito com isto dos chás. Aprendi com ela. Acompanhava-a pelo campo, com os animais, e ainda me lembro das primeiras ervas que apanhámos. Eram boas para as tromboses, chamadas “erva do ar”, com uma vagem comprida”, lembrou, sentada na pequena cadeira de madeira, arrumada no pequeno quintal da sua casa. Sob o sol de uma manhã de Setembro, Felisbina continuou, contando que observava atentamente a avó. “Eu via o que a minha avó fazia. Tínhamos umas hortas ali no monte, direito à raia, e tínhamos lá dois poços, onde apanhávamos ervas”. “Mas também tinha um quintal em casa, com muitas ervas, tal como eu tenho aqui o meu cheio de chás”, explicou, apontando os alinhados vasos e os pequenos canteiros onde o verde assumia as mais variadas tonalidades, próprias da identidade de cada espécie. Preparada para elencar o seu conhecimento, vai sublinhando que conheçe “bem tudo, dezenas de plantas”. Ao mesmo tempo, lamenta que as filhas e as cinco netas já nada saibam da sua arte, mas justifica que “é assim, porque andam a estudar”. Mas o testemunho fica no seu “caderno mal escrito”, como referiu, onde cada qualidade e cada utilidade estão religiosamente apontadas à sua maneira. De olhos azuis transparentes, com o brilho de quem está a falar daquilo que sabe e gosta, Felisbina vai enumerando as ervas que tão bem conhece. “Ainda ontem fui apanhar a alcária, chamada aqui nas Terras de Miranda de “erva loba”. Saí logo cedinho, mas encontrei pouquinha, pois não tem chovido e este sol tem comido as ervas todas. Mas é uma erva com muito valor e serve principalmente para as dores de estômago.
Agora só se podem deitar três folhinhas no chá, ou faz mal. Para curar uma chaga, mistura-se com poejo e aplica-se”, vai explicando.
Com orgulho de ter aparecido em muitos jornais e televisões, quer nacionais quer espanholas, de ser procurada por muitos para ensinar o seu ofício, Felisbina, sentada ao sol, não está para grandes interrupções e continua a elencar: “a corriola, planta silvestre de flor branca, muito boa para desarranjos intestinais. Quando criei as minhas duas filhas cozia corriola e silva e dava-lhes, pois resultava muito bem. Tomilho negro, que com cascas de cebola é bom para os constipados. E também para os constipados, as cascas de cebola com uma rodela de limão a ferver e tomar com uma colher de mel”. “Temos o canholeiro (sabugueiro) com a flor que é boa para cortar a febre do sarampo das crianças. O chá da Índia que é muito bom para as cólicas”, continuou. E, para o sangue, Felisbina tem duas receitas, que descreveu com entusiasmo: “temos a cevada com um bocadinho de milho, a que juntamos carvão, raiz de salsa e cozemos tudo junto em água. Toma-se durante 40 dias e tem a gente que o beber quente. Outro é, num litro de vinho caseiro, cozer a raiz de salsa, raiz de urtiga, raiz de arzola, pontas de freixo, casca de carvalho e um galho de rosmaninho caseiro. Toma-se este chá ao deitar, e bebe-se frio. Já tomei e fez-me muito bem, que logo que me pus boa”.
Lamentando as pernas já não obedecerem como dantes, e os olhos azuis já não a deixarem ver tão claro, a senhora de 81 anos diz andar sempre pendurada nas suas bengalas, que tem espalhadas pela casa, recordando os dias em que “dantes estava aqui em Constantim e logo a seguir em Moveros. E as ervas é porque as conheço bem, porque estou muito treinada, se não não era capaz”. Segura dos benefícios dos chás, Felisbina, que toma cinco compridos diferentes diariamente, tem consciência que a medicina tem o seu papel, e que não pode ser desvalorizada. “Já estou tão cheia de remédios. Se eu soubesse que os medicamentos que eu estou a tomar pudessem ser substituídos pelos chás, eu não os tomava. Ainda no ano passado queria deixá-los e tomei dia sim e dia não, mas fiquei pior”, referiu.
E continua o rol de chás e suas propriedades: “a folha do castanheiro enxertio, que é boa para a tosse; a folha do limonete para o estômago; o tomilho branco para curar azeitonas, para a comida e as pontas do preto para chá; a flor de malva roxa, que a branca não presta, os orégãos, amoreira e maçanilha (camomila) para o estômago; os toros das cerejas para as cólicas; fiolho (funcho) para o fígado, fel da terra e malvela para os rins; silva para os intestinos; tília e pericão para os nervos...”. Mas nem só os chás ajudam a cura. Para venenos de “bicharada”, uma reza que Felisbina nunca realizou, mas que sabe cantar em forma de lengalenga. “Nunca pus as rezas ao serviço.
Tenho medo de tentar e que me resulte mal. Uma das que sei é para venenos de cobra, ratos, sapos ou lagartos. Primeiro a gente benze-se e depois, com a navalha na mão (e vai exemplificando), diz-se: eu te corto aranha, aranhão, rato, ratão, sapo, sapão, cobra, cobrão, lagarto, lagartão, foge daqui bicho da maldição. E depois a gente reza a quem mais devoção tiver”, elucidou. Já para chagas e outras feridas, pomadas caseiras à base de ervas são a solução, segundo Felisbina Rosa: “pomada muito boa é a seiva porcos. Deita-se uma colher ou duas de azeite numa sertã, uma colher de unto, três dentes de alho cortados em sete pedaços e quatro ou cinco ervas da chamada seiva porcos. Depois frita-se bem e tiram-se as ervas. Deita-se o pingo num frasco pequenino e fica pomada”. E chás, como defende, só para maleitas físicas, e “não para a alma”, sublinhou, lembrando um episódio em que uma rapariga uma vez a procurou e lhe pediu que lhe ensinasse palavras para namorar: “eu respondi, olha, minha filha, palavras sei poucas, que não estudei, e tenho pouco tempo de escola”.
Deixando o quintal, Felisbina mostra a pequena divisão onde muitos sacos e frascos de ervas alinham ao lado dos santos da sua devoção. Conhece todos e sabe para que servem, mas mesmo quando a memória falha, em todos existe um papelinho escrito à sua maneira, com as indicações que precisa guardar, bem como o ano da colheita, pois as ervas “não se querem de um ano para o outro e é preciso estar sempre a renovar”. E o renovar implica regras, como referiu: “as ervas só se podem apanhar pelo São João, Junho, até meados de Outubro, pois, depois, quanto mais sumo tiverem, mais venenosas se tornam. Colho-as de manhã cedo, lavo-as bem lavadas, escorro-as bem escorridinhas e deixo-as secar em cima de um lençol, sem sol, durante oito dias. Depois parto-as bem partidinhas e ponho em frascos”. E a comprovar, no pequeno quarto onde desfilam as fotografias da família, a alcária repousa no lençol listado estendido na cama de ferro. Já de volta ao quintal solarengo, e para fim de conversa, Felisbina Rosa Fernandes aponta orgulhosa cada espécie que habita nos vasos e canteiros, tratados religiosamente, pois são muitos os que a procuram em busca de ensinamentos e cura para males do corpo. “Ajudo sempre as pessoas e não tenho problema nenhum em ensinar como se faz, pois até gosto que aprendam”, concluiu.

Por: Aida Sofia Lima

4 comentários:

  1. Por um simples acaso ,a procura da palavra fiolho encontrei esta página adorei e muito obrigada por partilhar Gostaria imenso de conhecer a Senhora e tenho pena de não ser de mais perto sou da. Maia e aí encontrei um senhor de Bragança que utilizou o nome daí a minha procura Adorava conhecer a pessoa contanto saber espero que ainda esteja bem deixo contacto duarte.mjose@gmail.com

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  2. Gosto muito de estas coizas admiro jente como esta señora


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  3. Também gostava de saber se a senhora tem algum chá para a diabetes, obrigado. Maria José

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