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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues, João Cameira e Rui Rendeiro Sousa.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2025

Os incríveis festejos de Natal dos nossos antepassados… «Galhofas», «Loas», «Pandorcas» e «Pastoradas»…

Por: Rui Rendeiro Sousa
(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")


 «Esta condenação foi o golpe de misericórdia dado em tais festejos». Assim se refere o insuspeito Abade de Baçal à última Pastoral a condenar a forma como era festejado o Natal pelo Nordeste, cumpriram-se, exactamente, 130 anos, no passado dia 16. Nesta eram ameaçadas de interdito as igrejas e capelas onde continuassem a praticar-se tais actos, bem como seriam suspensos todos os párocos que participassem ou consentissem nos mesmos. Tempos outros...

Será difícil imaginar que, ao longo dos tempos, até finais do século XIX, era vulgar ver os locais sagrados, tais como igrejas, capelas e, até, cemitérios, invadidos pelas gentes em ousados festejos, nos quais se incluíam «danças por mortos», devidamente acompanhadas por «comida e bebida», naturalmente em excesso. Mais difícil será imaginar que nesses atrevidos festejos entravam, como parte integrante, os próprios párocos, diáconos e subdiáconos, os quais também se disfarçavam, inúmeras vezes, de mulheres, noutras se investindo como bispos, troçando com as hierarquias eclesiásticas. Sempre na companhia de «Mascarados», «Gaiteiros» e «Tamborileiros». Grupos que entravam, nesta época, e sem despudor, em diversas igrejas. 

Nestas celebrações entravam as «Galhofas», algumas vezes mencionadas, mas sempre referidas como ocorrendo entre «mancebos e moças», facto que originava o «pecado original». O que não é de espantar, para quem percorra os assentos paroquiais, alguns desde o século XVI, nos quais o que mais abunda são os «filhos de pai incógnito» ou os «expostos», popularmente conhecidos, respectivamente, como «zorros» e «enjeitados». Alguns dos quais eram descendentes dos próprios párocos… Que também, e eram inúmeros os casos, cometiam o «pecado original». Embora hoje o conceito de «Galhofa» se refira a um tipo de luta corpo-a-corpo entre «mancebos», mencionada noutras Pastorais, ou ao baile que se segue a determinados festejos, conhecido como «Baile da Galhofa». Parece que estas versões vêm, nos últimos anos, sendo reabilitadas, quer na sua forma de luta, quer na alternativa forma de baile. 

Igualmente há a menção às «Loas», que numa fase original eram declamações com um marcado cariz religioso, sendo ao longo do tempo deturpadas, transformando-se em autênticas sátiras sociais, nas quais se iam «descompondo muitas pessoas», aí incluídas «muitas ofensas a Deus», segundo a versão contida nas referidas Pastorais. Inúmeras vezes vêm referidas as «Pandorcas», ou «Pandorcadas». Parece tratar-se de festejos essencialmente levados a cabo durante a noite, que incluíam a inevitável música, ruidosa e em permanente algazarra, percorrendo as ruas da aldeia, com bailes e danças, com «ajuntamentos de homens e mulheres», e com comida e bebida em excesso, o que resultava, variadas vezes, em rixas e, inclusive, mortes. “Rais’parta”! Os nossos antepassados eram “lubadus da breca”!... 

Por fim, as «Pastoradas», ou «Ramos de Natal», que incluíam «Embaixadas», tratando-se de representações de carácter popular, onde os personagens principais eram o «Anjo» e os «Pastores». Também estas seriam adulteradas, transformando-se em «comédias» ou, até, em «missas cantadas por lavradores», sem a presença de qualquer clérigo. Isto é, nesta época, parece que as igrejas eram tomadas pelo Povo, sem quaisquer regras, cantando-se, dançando-se, bebendo-se e comendo-se dentro dos templos, sem o estabelecimento de qualquer fronteira entre o religioso e o pagão. O nosso Povo, onde entravam, inclusive, alguns Párocos, sempre foi dado a excessos…

Excessos esses que culminariam no «golpe de misericórdia dado em tais festejos», expressão do Abade de Baçal já anotada anteriormente. Felizmente, novos os tempos, com mais moderação e «bons costumes», algumas das manifestações festivas dos nossos antepassados vêm sendo recuperadas, particularmente no que respeita às chamadas «Festas dos Rapazes». E assim se vai mantendo ou reavivando a «Galhofa», seja através da versão luta, seja pela opção baile. E assim se vai mantendo o «culto ao pão», quer por via do «Pão de Santo Estêvão», quer pela do «Charolo». E, de alguma forma, com a presença dos milenares «Mascarados», devidamente acompanhados por instrumentos musicais tradicionais, se vão mantendo as «Pandorcas». Parece, no entanto que, salvo algumas raras excepções, as «Loas» e as «Pastoradas» terão desaparecido de vez…

Um Santo e Feliz Natal para todos! 

(Foto: lendasetradicoes)


Rui Rendeiro Sousa
– Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer. 
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas. 
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana. 
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros. 
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.

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