quinta-feira, 4 de novembro de 2021

A HISTÓRIA DAS TRÊS PRIMEIRAS RAINHAS DO SOL

Era uma vez um vendedor de azeite que percorria as aldeias com uma mula, mas um belo dia o homem teve um acidente com a mercadoria, rebentou-lhe uma das bilhas em que transportava o azeite. Como não podia fazer nada com o azeite derramado exclamou:
- Agora que o apanhe quem quiser que eu não o quero.
Vivia naquele lugar uma bruxa, ao saber o que tinha acontecido, pegou num ovo fez um furo retirando-lhe o interior, indo todos os dias encher o ovo de azeite acartando-o na cabeça. De regresso a casa passava sempre por um grupo de estudantes, ao verem que a cena se repetia, um estudante decidiu quebrar o ritual e disse:
- O raio da velha passa por aqui todas as manhãs com um ovo à cabeça, amanhã vou-lhe atirar uma pedra e deito-lhe o ovo ao chão. Assim fez, mas a bruxa voltou-se e praguejou:
- Oxalá Deus queira que não tenhas nem descanso nem sossego sem saber das três primeiras rainhas do sol.
O rapaz não mais teve descanso, passado um tempo pediu ao pai que lhe arranjasse um cavalo bravo para ir em busca das três primeiras rainhas do sol. O pai acedeu ao pedido e o rapaz andou a galope durante dias e noites seguidas, parando num alto monte onde nada se avistava, no entanto viu ao longe uma luz. O rapaz correu em direcção à luz e ao alcançá-la bateu à porta de uma casa, dela saiu uma senhora de idade (mãe da lua) que lhe perguntou:
- Então que faz por aqui um menino a esta hora?
- Ando à procura das três primeiras rainhas do sol.
- Oh! Isso não encontras sem falar primeiro com a minha filha.
- E quem é a tua filha?
- É a lua! Só que não podes estar aqui quando ela chegar, porque se ela cheira carne humana é capaz de te devorar. Mas deixa estar que vou ver se encontro um quarto escuro para lá ficares.
Quando a Lua chegou junta da mãe logo observou:
- Mamã, cheira-me muito a carne humana …!
- Ah filha! Foi um rapazinho que passou por aqui à procura das três primeiras rainhas do sol.
- Para isso ele tem de levar três papas minhas.
A Lua explicou, depois, tudo à mãe e quando esta compreendeu para que eram as papas apressou-se a dar-lhe de comer para obter dela o que o rapaz precisava.
Enquanto a filha comia a mãe perguntou:
- O que estás a comer minha filha?
Sem responder atirou-lhe uma papa para a cara, que mais tarde ela guardou. A mãe fez-lhe a mesma pergunta à noite e de manhã obtendo a mesma resposta das duas vezes, conseguindo, assim, a velhinha as três papas para o rapaz, explicando a este:
- Para atravessares o rio atiras uma papa, o rio seca e tu passas. Depois aparece-te um leão atiras-lhe outra papa e ele adormece, tu pegas nas chaves e abres o ouvido direito do leão tirando de lá as três caixinhas que lá estão. Para regressar secas novamente o rio com a última papa.
Andou no caminho de regresso e parou junto de uma fonte com curiosidade de abrir uma das caixas, ao abrir a caixa saiu de lá uma menina que lhe pediu:
- Dá-me pente e água ou eu morro.
O rapaz assim fez, mas enquanto a rapariga se penteava a fonte secou e ela morreu.
Ele seguiu caminho sentando-se num tanque de água, abrindo a segunda caixa de onde saiu outra menina fazendo o mesmo pedido. Ele deu-lhe o pente e a água, mas aconteceu com esta menina o mesmo que com a segunda e morreu. Mais adiante o rapaz parou à beira de um rio, ao abrir a última caixa saiu uma menina com o mesmo pedido:
- Dá-me um pente e água senão morro.
O rapaz assim fez e desta vez a rapariga preparou-se seguindo caminho com o rapaz. Passado muito tempo chegaram a casa do rapaz já com um filho no colo, mas ao outro dia o rapaz teve de sair deixando a mãe e o filho ao sol, ao passar a bruxa pediu para que a menina recostasse a cabeça no seu regaço e dormisse. Apesar da menina não querer obedecer, a bruxa insistiu e ela acedeu ao pedido, a bruxa picou-a com uma agulha e transformou-a numa pomba que logo levantou voo. A bruxa tomou, então, o lugar da menina e esperou que o rapaz regressasse. Ao chegar o rapaz ela apresentou-se como a sua mulher, mas o rapaz não queria acreditar que ela fosse a sua esposa, no entanto ela alegou que fora o sol que a tinha transformado, ele lá a aceitou e ficou com ela uns dias. Os criados andavam a lavrar uma propriedade e na hora da merenda vem uma pombinha que pousou no jugo dos animais e meteu conversa com eles:
- Boas tardes lavradores.
- Boas tardes pombinha.
- Então o papá e a mamã como andam?
- Bem!
- E então o menino canta ou chora?
- Umas vezes canta, outras chora!
A pomba bateu asas e exclamou:
- Pobre mãe por estes montes agora.
Os lavradores ao chegar a casa contaram ao patrão o que estava a acontecer há dois dias. Então, o patrão ordenou que levassem pez para espalhar no jugo, para apanharem a pomba viva. A velha quando a viu fez-se de doente dizendo que queria um bocadinho da pomba. Assim, o rapaz ordenou que matassem a pomba, mas ao irem-na matar acharam o alfinete que a bruxa lhe tinha espetado e deram o alarme. O marido retirou-lhe o alfinete o que a fez voltar a ser humana, perguntando-lhe o que se tinha passado com ela, ao que esta lhe explicou tudo o que a bruxa tinha feito:
- O que havemos de fazer agora com esta bruxa?
A menina respondeu:
- A carne rija-la em azeite e dos ossos faremos umas escadinhas para subirmos para a nossa cama.
Assim aconteceu e cada vez que ela subia para a cama os ossos chiavam, ao que a menina respondia:
- Padece que eu já padeci!!!

RECOLHA 2005 SCMB, CASIMIRO PARENTE, Idade: 66.
Localização geográfica: PAÇO DAS MÓS – ORIGEM + 60 anos.

FICHA TÉCNICA:
Título: CANCIONEIRO TRANSMONTANO 2005
Autor do projecto: CHRYS CHRYSTELLO
Fotografia e design: LUÍS CANOTILHO
Pintura: HELENA CANOTILHO (capa e início dos capítulos)
Edição: SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE BRAGANÇA
Recolha de textos 2005: EDUARDO ALVES E SANDRA ROCHA
Recolha de textos 1985: BELARMINO AUGUSTO AFONSO
Na edição de 1985: ilustrações de José Amaro
Edição de 1985: DELEGAÇÃO DA JUNTA CENTRAL DAS CASAS DO POVO DE BRAGANÇA, ELEUTÉRIO ALVES e NARCISO GOMES
Transcrição musical 1985: ALBERTO ANÍBAL FERREIRA
Impressão e acabamento: ROCHA ARTES GRÁFICAS, V. N. GAIA

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