OPINIÃO - Jorge Lage
Somos um país pobre, mas a nossa maior pobreza está nas nossas cabeças. Isto foi demonstrado à saciedade com a renovação do Parque Escolar. Isto é demonstrado pela acção social escolar e pelas autarquias ao darem livros e outro material por tudo e por nada.Depois endividamo-nos até nos bater à porta a banca rota. Quem mais contribuiu para isso deu à sola, ou talvez ande a gerir contas chorudas em qualquer offshore.
Somos uns perdulários a gerir os dinheiros públicos dos nossos impostos e os casos de fraude e burla não são poucos.
Em contraponto, uma amiga escritora enviou-me o texto abaixo que faz lembrar um pouco o espírito de poupança do Estado Novo, porque quem não tem ou tem pouco deve pensar duas vezes antes de esbanjar.
Vejamos o que diz uma nossa emigrante de 42 anos, Helena Rico a viver em Groningen, na Holanda quando do regresso dos filhos à escola (30.09.2011):
“A propósito do desafio sobre os novos hábitos de poupança na abertura do ano lectivo, resolvi partilhar a minha experiência uma vez que vivo no norte da Holanda, onde tudo se passa de modo completamente diferente.
Em primeiro lugar, os livros são gratuitos. São entregues a cada aluno no início do ano lectivo, com um autocolante que atesta o estado do livro. Pode ser novo ou já ter sido anteriormente usado por outros alunos. No final do ano, os livros são devolvidos à escola e de novo avaliados quanto ao seu estado. Se por qualquer razão foram entregues em bom estado e devolvidos já muito mal tratados, o aluno poderá ter de pagá-los, no todo ou em parte.
Todos os anos, os cadernos que não foram terminados voltam a ser usados até ao fim. O contrário é, inclusivamente, muito mal visto. Os alunos são estimulados a reusar os materiais. Nas disciplinas tecnológicas e de artes, são fornecidos livros para desenho, de capa dura, que deverão ser usados ao longo de todo o ciclo (cinco anos). Obviamente que as lojas estão, a partir de Julho/Agosto, inundadas de artigos apelativos mas nas escolas a política é a de poupar e aproveitar ao máximo. Se por qualquer razão é necessário algum material mais caro (calculadora, compasso, por exemplo), há um sistema (dinamizado por pais e professores, ou alunos mais velhos) que permite o empréstimo, ou a doação, consoante a natureza do produto. Ao longo do ano, os alunos têm de ler obrigatoriamente vários livros. Nenhum é comprado porque a escola empresta, ou simplesmente são requisitados, numa das bibliotecas da cidade, todas ligadas em rede para facilitar as devoluções, por exemplo. Aliás, todas as crianças vão à biblioteca, é um hábito muito valorizado.
A minha filha mais nova começou as suas aulas de ballet. Não nos pediram nada, nenhum fato, nem sapatos especiais. Mas como é universalmente sabido, as meninas gostam do ballet porque é cor-de-rosa e porque as roupas também contam. Então, as mães vão passando os fatos e a minha filha recebeu hoje, naturalmente, o seu maillot cor-de-rosa com tutu, e uns sapatinhos, tudo já usado. Quando já não servir, é devolvido. E não estamos a falar de famílias carenciadas, pelo contrário. É assim há muito tempo.
O meu filho mais velho começará a ter, na próxima semana, aulas de guitarra. Se a coisa for levada mesmo a sério, poderemos alugar uma guitarra, ou, facilmente, comprar uma em segunda mão.
Este sistema faz toda a diferença porque, desde que vivo na Holanda, terminou o pesadelo do início do ano. Tudo se passa com maior tranquilidade, não há a febre do "regresso às aulas do Continente" e os miúdos e os pais são muito menos pressionados. De facto, noto que há uma grande diferença se compararmos o nosso país e a Holanda (ou com outros países do Norte da Europa, onde tudo funciona de forma idêntica). Usar, ou comprar, o que quer que seja em segunda mão é uma atitude socialmente louvável, pelo que existem mil e uma opções. Não só se aprende desde cedo a poupar e a reutilizar, como a focar as atenções, sobretudo as dos mais pequenos, nas coisas realmente importantes.”
E nós, mesmo em tempo de crise? Protestamos e exigimos novo, por tudo e por nada, em vez de reaproveitarmos. A crise vai-nos obrigar a sermos mais modestos e mais poupados em vez de andarmos a querer parecer aquilo que não podemos ser.
O país não pode pagar aos polícias ou ao exército ou aos maquinistas aquilo que não tem, sob pena de passarmos de pobres a miseráveis. Mas, quem ocupa lugares públicos tem de dar o exemplo e, por exemplo, deixar de utilizar as viaturas do Estado em proveito próprio, porque o dinheiro é pago por todos nós.
in:jornalnetbila.net
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