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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 25 de junho de 2018

O exercício do poder pela Câmara Municipal de Bragança

As atribuições e competências da Câmara Municipal de Bragança, como dos seus Presidentes, integradas logicamente no quadro mais amplo da legislação aplicável às Câmaras Municipais, variaram significativamente entre 1820-2012, em função da perspetiva descentralizadora ou centralizadora com que os Governos encararam os municípios e do maior ou menor grau de autonomia que a legislação lhe concedeu.
A legislação de 1822, pela primeira vez, concedeu a Presidência da Câmara Municipal ao vereador mais votado, embora mantivesse o juiz de fora para as questões judiciais. Em 1823, na sequência da Vilafrancada, a presidência das câmaras municipais voltou a ser assumida, como era antes de 1822, pelos juízes de fora, nomeados pelo Governo, situação esta que se manteve até à instauração definitiva do liberalismo em Portugal. A legislação de 1832 reatou a doutrina estabelecida em 1822 da eleição do presidente e vereadores das câmaras municipais, mas converteu estas, praticamente, em órgãos consultivos do provedor/administrador do concelho.
Almeida Garrett, em 1854, na Câmara dos Pares do Reino, esclareceu as razões que levaram ao aparecimento do provedor/administrador do concelho. Segundo ele, “a Carta Constitucional, na superabundância do seu espírito liberal, por deferência com o nosso primeiro código político, a Constituição de 1822, por inevitável reação contra os abusos que tanto tinham despopularizado a antiga magistratura mista dos juízes de fora, deu ao vereador mais votado na eleição a presidência das Câmaras Municipais. Os legisladores de 1832, quando nos Açores se viram entalados entre este preceito a que não ousavam desobedecer, e a lei francesa que tinham assentado adotar, não acharam outro meio de sair da dificuldade, e de conciliar, na aparência ao menos, uma coisa com outra, senão a criação fatal dessas magistraturas anfíbias e impotentes para todo o bem, quanto são propensas e poderosas para todo o mal, a que primeiro se chamaram provedores de concelho, depois administradores, e que por todos os modos e métodos se tenta fazer menos obnóxias, sem jamais o conseguir”.
Ou seja, ao permitir a eleição dos Presidentes das Câmaras Municipais, o Governo entendia que nos Municípios devia existir um magistrado da sua confiança que, de certo modo, substituía o juiz de fora do Antigo Regime, zelando pelo cumprimento da legislação em vigor e fiscalizando, de modo formal ou informal, as atividades das Câmaras.
Entre 1834-1927, com maior ou menor autonomia, em função de uma tutela mais apertada ou mais liberal, a verdade é que as Câmaras se mantiveram controladas pelo Governo, através do provedor/administrador do concelho e, noutro plano, do governador civil, sem esquecermos a ameaça de dissolução que sempre pairou sobre elas, não raras vezes concretizada.
Embora a Constituição de 1822 tivesse conferido a governação económica e municipal às Câmaras, o Ato Adicional à Carta Constitucional de 1852 apenas lhes manteve a administração económica dos respetivos Municípios. A organização dos serviços municipais, a aquisição e alienação dos bens imobiliários, as obras públicas e planos de urbanização, a circulação de viaturas, a expropriação de terrenos e bens imóveis, as medidas de fomento, abastecimento público de águas, saneamento, assistência, escolas e cultura, isto é, as competências mais relevantes das Câmaras Municipais, dependiam sempre, em última instância, dos administradores concelhios, o que limitava sobremaneira a autonomia das Câmaras Municipais.
É certo que o decreto n.º 9 956, de 8 de janeiro de 1924, defendia já a extinção das funções dos administradores dos concelhos, mas considerando que tais magistrados não podiam ser extintos de momento, sem que se provesse à sua substituição “em termos mais profícuos e em condições de os libertar das nefastas influências do espírito de fação”, aconselhava a que o poder executivo pudesse atribuir o exercício das suas funções a “quaisquer entidades da sua confiança como agentes locais das vontades do poder central, sem dispêndio para o Município e para o tesouro público”.
Era extinto, assim, o cargo de administrador do concelho, permitindo-se contudo o exercício das suas funções, mediante o consentimento do Governo e de acordo com os governadores civis, sem qualquer tipo de direito a vencimento.
O decreto n.º 14 812, de 31 de dezembro de 1927, extinguiu os serviços das administrações dos concelhos, mantendo-os porém nos que fossem sede de distrito, como era o caso de Bragança. A sua extinção definitiva foi regulada pelo Código Administrativo de 1936, continuando todavia estes magistrados a exercer as funções policiais que competiam ao Presidente da Câmara até 31 de dezembro de 1937.
Assim, com o Estado Novo (1926-1974), os administradores concelhios desapareceram, mas apenas porque o Governo passou a nomear os Presidentes das Comissões Administrativas numa primeira fase, e os Presidentes das Câmaras numa segunda fase, os quais eram da sua inteira confiança, podendo livremente exonerá-los sempre que assim o entendesse.
Com efeito, o Estado Novo reduziu fortemente a autonomia das Câmaras Municipais, invertendo uma certa tendência descentralizadora que se fez sentir durante a Primeira República, e intervindo concretamente nos assuntos municipais: entre 1926 e 1937, período das Comissões Administrativas nomeadas pelo Governo, a quem competia decidir os assuntos municipais, as Câmaras não tiveram a mais pequena autonomia; com o Código Administrativo de 1936-1940, as atribuições dos Municípios passaram a constar de uma “lista taxativa”, negando-se assim àqueles a possibilidade de “prosseguirem todos os interesses comuns, próprios e específicos” da sua população.
Efetivamente, os vereadores das Câmaras careciam de um verdadeiro cunho representativo, uma vez que não eram livre e diretamente eleitos pela população do Município; e a escassez de meios financeiros anulou a possibilidade da “emergência de um poder genuíno local”, já que “boa parte das obras públicas, mesmo as de reduzida dimensão financeira, com a incidência nos espaços geográficos municipais durante o Estado Novo, concretizou-se no âmbito dos Fundos de Melhoramentos Rurais, do Fundo de Desemprego ou através das comparticipações do Estado”.
O Presidente da Câmara passou a constituir um órgão simultaneamente municipal e governamental, tendo competência “para manifestar uma vontade direta e imediatamente imputável à autarquia, e representando o Governo, de quem dependia”. Na verdade, era um magistrado administrativo, o que contribuiu “para o apagamento da autonomia da administração autárquica e da representatividade daquele que mais emblematicamente a exercia” – assim se compreendendo que o Presidente da Câmara não fosse eleito. A acumulação destas duas funções e a latitude e importância das suas atribuições conforme à tradição dos juízes de fora do Antigo Regime conferiram às Câmaras Municipais um cunho demasiadamente “presidencialista”, logo denunciado durante o Estado Novo, mas que permaneceu intacto até 1974.
Só a partir de 1976, na sequência da Revolução de 25 de Abril de 1974, é que as Câmaras Municipais em Portugal, democraticamente eleitas através de um vasto corpo eleitoral formado no quadro do sufrágio universal, passaram a constituir uma emanação autêntica, genuína, da vontade dos habitantes dos Municípios, e a disporem de uma ampla autonomia, nomeadamente, autonomia patrimonial e financeira, autonomia regulamentar, autonomia administrativa e autonomia organizatória.
Esta autonomia, contudo, de índole administrativa, como Alves Correia bem escreveu, desenvolve-se no quadro de um Estado unitário, razão pela qual a atividade e gestão dos seus órgãos estão sujeitos à intervenção do Estado, que mantém a tutela administrativa para verificar o cumprimento da lei.
Em conclusão, podemos dizer que, sob o ponto de vista do território, o Concelho de Bragança, na Época Contemporânea, não mais recuperou a extensão que deteve no Antigo Regime. De qualquer modo, ao presente, o Município atinge uma dimensão largamente superior à maior parte dos municípios portugueses.
Quanto à organização do poder municipal em Bragança, os juízes de fora, após 1834, deram lugar ao Presidente da Câmara, embora o Governo, através da figura do administrador concelhio, continuasse a acompanhar e a fiscalizar a atividade da Câmara de Bragança – figura que aí, como em todos os municípios, foi extinta apenas com o Estado Novo, uma vez que, a partir de 1926, os Presidentes da Câmara passaram a ser nomeados pelo Governo.
Só após a restauração da Democracia em Portugal, em 25 de Abril de 1974, é que a Câmara Municipal de Bragança passou a ter uma autêntica representatividade e legitimidade, alicerçada no sufrágio universal dos seus munícipes, embora, como dissemos, a sua ação esteja sob a intervenção do Estado, no cumprimento da Constituição e das leis da República.

Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa

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