(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
(Nota prévia: Terei todo o gosto em responder a todos os comentários, desde que feitos com educação e elevação, concordem ou discordem com o que está escrito. Aos desagradáveis «cromos sabetudólogos» que aqui apenas vêm para destilar as suas frustrações, apesar de também ter formação em Psicossociologia, não sou Psicólogo. Ficarão, como tal, a falar sozinhos...)
Muitos já deverão ter percebido de onde sou originário. Terra essa cujo nome, “dez’de que m’alembru’e”, era justificado através de uma batalha entre Mouros e Cristãos (vou ficando a perceber, afinal, que os Mouros já cá andavam há muito tempo...). Na qual uns cavaleiros, quando os Cristãos estavam a ser devastados, irromperam pela batalha empunhando as suas maças, distribuindo traulitada pelos Mouros, tendo estes fugido. Na euforia da vitória, o «rei», que entre aspas vem por incógnito ser, terá gritado «Maça, Macedo!», dando o nome à minha terra. Parece bonito… Mas não é! Porque entretanto cresci, e descobri que havia um Macedo do Mato (Bragança), um Macedo do Peso (Mogadouro) e um Macedinho (Vila Flor). E logo aí, espírito crítico à flor da pele, pensei que seria muita coincidência ter havido, noutros lados, mais gritos «Maça, Macedo!». Ainda mais crescido, também descobri uma «Maceda», em Ovar.
Mais tarde, «dores do crescimento», haveria de descobrir, do lado de lá, uns quantos «Manzanedo» e «Manzaneda». “E impeçou a tcheirar-m’a sturru’e”… E, de facto, aqui trago este exemplo para tipificar as falácias históricas e toponímicas acerca de Mouros, vigentes na memória popular. Porque «Macedo» e os seus congéneres não passam de um fitotopónimo, ou seja, uma designação derivada de um nome vegetal. Isto é, «Macedo» é a evolução do vocábulo latino «mattianetum», a partir de «mattiana» (maçã - «manzana», em Castelhano, daí o equivalente «Manzanedo»), e não de «mattea» (maça). Ou seja, «Macedo» corresponde à «terra abundante em macieiras», da mesma forma que «Espadanedo», cuja explicação também metia Mouros pelo meio («Espada nele»), não passa de um nome colectivo que significa «terra abundante em espadanas». Aqui trouxe estes casos para exemplificar as tantas histórias falaciosas associadas a Mouros…
Mas regressemos a factos cronológicos, no que respeita, especificamente, à nossa região… Os Mouros chegaram ao norte peninsular no século VIII, cerca do ano 720. Rapidamente, a partir da revolta dos Berberes, em meados desse século (cerca de 740/745), que interesse não tinham em ficar nas regiões «mais pobres» do Norte que lhe foram confiadas, foram «expulsos» desse mesmo Norte peninsular, aí incluído o actual Norte de Portugal, crendo-se que, em meados desse século, pós-750, já teriam sido «varridos» das terras a norte do Douro. Ora, se por «terras de Bragança» estiveram, foi por meros 30 anos… Sem deixarem vestígio algum, nem nas próprias crónicas Árabes (para os que duvidarem, aconselho a lê-las – há traduções muito bem feitas…).
No século seguinte, o IX, já estava a ser feita a «presúria» de Chaves… Como tal, se os Mouros por estas terras passaram ou permaneceram, como disse numa apresentação, pouco tempo tiveram para fazer um «xixi no Azibo ou no Sabor». E, efectivamente, como já apontado, não deixaram por cá vestígio algum dessa pretensa passagem… Nem no nome das terras, como alguns afirmam, peremptoriamente (se dúvidas tiverem, façam o favor de as elencar – antecipadamente alertando que as minhas imunoglobulinas, mais os eosinófilos, estão hiperactivos pelos efeitos desencadeadas pela «sabetudologia»)…
Não obstante essa ausência, subsistiram «Lendas de Mouros», bem como as de «Mouras Encantadas» (as quais, dizem as novas correntes, eram celtas...)… E por que foram criadas lendas populares acerca daquilo que, de facto, o Povo não conhecia? Essencialmente, por três vias. A primeira delas proveniente dos nossos cavaleiros, particularmente os célebres «Bragançãos», que até teriam participação activa na conhecida Batalha de Ourique… Outros tendo havido, nomeadamente de outra grande família «bragançana», que até participariam na última «conquista» do Algarve, por meados do século XIII, alguns dos seus membros por lá tendo permanecido. Outros ainda tendo havido que andaram por terras actualmente espanholas, nas quais, conquistas feitas, até participariam nos «repartimientos».
Sabe-se que, nessa época, a designada «Reconquista» foi, maioritariamente, feita de avanços e recuos. Ou seja, havia imensas algaras, incursões militares feitas em território inimigo com o objectivo maior de acções de pilhagem e de desgaste dos adversários. Isto é, criava-se uma algara, ia-se a território inimigo, destruíam-se as suas fortificações e plantações, e regressava-se com os despojos. Sabe-se, igualmente, da grande atracção que havia pelo exostismo dos Árabes, especialmente em relação aos seus metais preciosos e aos seus tecidos. Com os referidos despojos, também se traziam histórias fantásticas que ajudavam a elevar os feitos dos cavaleiros. Estão a imaginar o efeito produzido na medieval mentalidade do Povo, dado a crendices, a superstições, a medos?
Entretanto, isto não deverá ter crédito algum junto de alguns sectores, que parece haver novas correntes que ramificam os Mouros, e as Princesas Mouras, e os Reis Mouros, e os Castelos dos Mouros, e todas as Lendas associadas, a um rebuscado mundo celta, que nem sequer está ainda muito bem estudado... Ao contrário da dita «Reconquista», expressão criada ao abrigo da «cartilha» das «conquistas aos infiéis», a que estudos mais recentes, de uma nova vaga de historiadores com outro espírito crítico, têm dado uma nova luz e uma nova visão. Que não trarei aqui, para não me arriscar a ataques dos que permanecem arreigados aos princípios de «pátria, una e indivisível», criados pela Historiografia do Estado Novo… Mesmo que, inconscientemente, desconheçam o que estão a apoiar...
Amanhã, ou “passadu manhã”, já cá “boltu outra bêze”…
(Foto: Casa Martins Sarmento)
Rui Rendeiro Sousa – Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer.
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas.
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana.
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros.
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.

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