(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Os que, efectivamente, se dedicam à investigação, seja em quem âmbito for (daqui excluindo aqueles que se consideram investigadores por terem lido uma página da Wikipédia...), facilmente reconhecerão esta frase aprendida desde muito cedo: «a ausência de provas, não é prova da sua ausência» ou, versão outra, «ausência de evidência não é evidência de ausência». Também deverão reconhecer «o que hoje é verdade, amanhã pode ser mentira». São inúmeros os exemplos, ao longo da história, que provam isso. Bastará recordar os que morreram por defender o «heliocentrismo» em contraponto ao «geocentrismo». Ainda assim, parece haver quem persista em acreditar que «a Terra é o centro do Universo», ou no designado «terraplanismo»… É o que vou verificando com esta questão da presença, ou não, de Mouros por «terras de Bragança»…
Já tive a felicidade e o privilégio de participar em algumas escavações arqueológicas na região de Bragança. Já tive na mão materiais do Neolítico, do Calcolítico, da Idade do Bronze, da Idade do Ferro, de época Romana… Também já tive a regalia de ter na mão moeda Visigoda, bem como inúmeros materiais da Alta e da Baixa Idade Média. Todas estas épocas abrangem milhares de anos de História! Poderão perguntar-me: «E materiais atribuídos aos Árabes?»… “Peis, nium”! «Nicles, pataticles», “nim ua muedinha, sequera”!… «Mas os Mouros estiveram aqui!» - afirmam, peremptoriamente, alguns! “Dez’de sempre oubi d’zere, q’inté têmus terras cum nome árabe!”… É verdade, sim senhor! Alfândega, Soeima, Alfaião, assim, de repente me lembrando… Não significando, porém, que sejam prova da presença árabe ou de que tenham sido fundadas por Árabes. “E tamém têmus palabras árabes!” – argumentam outros. Pois, é verdade, sim senhor. Mas também temos palavras Gregas, e os Gregos nunca aqui estiveram… E também temos a tão nossa batata! Nome originário, supõe-se, do «taino» ou do «quíchua», línguas sul-americanas, o que não significa que os Incas tenham estado por cá. E também temos o tomate, palavra originária do «náuatle», não equivalendo isso a que tenhamos por cá tido Aztecas… Os exemplos não acabariam…
E também temos o caso raro da azeitona, que não provém da «azeitoneira», como vulgar seria. Provém da oliveira, designação a partir do Latim «olivaria». Porém, a nossa oliveira, «zaytun» em Árabe, dá «azzaytúna», palavra provinda do Árabe dialectal já falado em Espanha. Significando isto que os Árabes estiveram aqui, mas não estiveram em Espanha... Porque em Espanha, a azeitona é «oliva», embora também haja a forma «aceituna». Por isso, em Espanha, o «aceite», que também significa «óleo», quando é azeite, não é «aceite de aceituna», mas «aceite de oliva». Quer dizer, se nós temos azeitona e os espanhóis têm «oliva», é irrefutável que os Árabes estiveram em Bragança, onde se diz a «azzaytúna» árabe, mas não estiveram em Espanha, onde há «olivas» latinas…
E porque atrás mencionei Alfândega da Fé, e ainda ontem fui questionado sobre este topónimo. Dirão os «terraplanistas» que é uma prova inequívoca da presença Árabe… Talvez os «terraplanistas» não saibam quando surgiu Alfândega da Fé documentada pela primeira vez… Mas eu digo-vos: 580 anos depois de os Mouros terem entrado na Península! 45 anos depois de os Mouros terem deixado, definitivamente, o actual território português, com a «Conquista do Algarve»! Antes disso, não há Alfândega da Fé para ninguém. Mas continua a ser uma prova de que os Árabes estiveram cá… Palavra puxa palavra, de Alfândega da Fé, que apenas surge documentalmente quando os Árabes já não estavam cá, foi inevitável não me lembrar de uma célebre lenda, a dos «cavaleiros das esporas douradas», mais a «mesquita» que houve em Balsamão… Conhecem, mesmo, a História da magnífica Balsamão? E, já agora, também conhecerão a de Balsemão, em Lamego, onde se situa a considerada capela mais antiga existente em Portugal? E a do Castro que é Vicente porque, diz a lenda, venceram uma batalha? E a de Chacim, onde, diz a lenda, ocorreu uma «chacina dos Mouros»?
Amanhã já cá trago essas «estórias»… Até lá, deixo um desafio aos «terraplanistas»: leiam as crónicas árabes… Se encontrarem por lá alguma menção a estas terras, ficar-vos-ei grato. Porque, das três crónicas árabes que já li, o mais próximo que detecto é Zamora. Cidade onde, naturalmente, já se encontraram imensos vestígios a atestar essa presença. Por vestígios mencionar, também ficaria grato caso encontrassem, uma «peçazinha» de cerâmica que fosse, ou uma «moedinha», que pudesse atestar essa presença Árabe por terras bragançanas. Tenho a certeza de que o Museu Abade de Baçal ficaria extremamente agradecido…
(Foto: Inequívocos vestígios de uma «mesquita dos mouros», em Balsamão...................)
Rui Rendeiro Sousa – Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer.
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas.
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana.
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros.
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.

Sem comentários:
Enviar um comentário