Ao mesmo tempo tinha que andar nos pastos com o gado e por lá ia esquecendo as preocupações de uma criança que tinha sido adulta demasiado cedo. “Eu e os meus três irmãos dormiam juntos numa cama, um dormia para os pés outros dormiam para cima. E outra caminha para o meu pai e as raparigas dormíamos também as duas mas tínhamos uma cama no chão. Só tínhamos dois quartinhos pequeninos e deitávamo-nos no chão, na salinha. Púnhamos a roupa para nos deitarmos”.
Depois que casou a vida que conheceu foi a mesma de menina. Não teve filhos mas ainda criou quatro sobrinhos. “Cheguei a guardar o gado, com um nas costas e traçado com um xaile atado assim atrás”. Ainda se lembra da primeira jeira que ganhou, à azeitona, 25 tostões. E de quando a água chegou a Freixo, “Deus tenha o Senhor Almirante lá no reino da Glória”, diz.
A vida sempre foi de muito trabalho, para por vezes só se comer “um bocado de pão”. Era o que tinha que ser que a vida havia de melhorar. “Trabalhei muito. Andava pela rua a apregoar o leite, a vender às pessoas. Vinha duas horas de caminho com um cântaro de leite à cabeça para casa, depois fazia o queijo, secava-o e vendia-o ao povo a quem mo comprava, cheguei a fazer oito e nove queijos. E a segar, era muita coisa, foi uma vida muito escrava senhor”.
Tem quase 90 anos, já está no Lar. Diz que ainda não há muitos anos que a vida viu melhoras. Hoje já não come pão enresinado. Mas há muita fartura que se estraga, “um pecado”, diz. As horas de caminho a conhecer tudo quanto a rodeava também já vão longe. Agora a vida é de descanso e as horas já não são de preocupação.
Texto: Joana Vargas
(abril de 2015)
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