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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 3 de março de 2023

Investigadores descobrem surpreendente registo de castores a 5 quilómetros de Portugal

 Um tronco de salgueiro roído nas margens de um afluente do rio Douro foi um dos sinais de uma população de castores em Salamanca, perto da fronteira com o Douro Internacional. Investigador acredita que a espécie possa regressar a Portugal em poucos anos. ICNF está a acompanhar a situação.

Castor-europeu (Castor fiber). Foto: Philipp Blank/Wiki Commons

Uma equipa de investigadores espanhóis reportou, num artigo publicado recentemente na revista Hystrix – the Italian Journal of Mammalogy, a nova presença de castores-europeus (Castor fiber) no lado espanhol da área protegida internacional Parque Natural Arribes del Duero – Parque Natural do Douro Internacional.

Os indícios de castor – o maior roedor da Europa, com os seus 25 quilos – foram encontrados no rio Tormes, afluente que desagua no troço internacional do rio Douro, perto da povoação da Bemposta (Mogadouro). O registo dista da fronteira portuguesa 11 quilómetros ao longo do rio, mas apenas 5 a 6 quilómetros em linha recta, segundo os investigadores Alfonso Balmori de la Puente e Teresa Calderón, dois dos autores do artigo.

“A presença de castor foi identificada por sinais nas margens do rio Tormes (…). O principal sinal é o de um tronco roído de salgueiro (Salix atrocinerea)”, explicam os autores do artigo. “Outros sinais encontrados foram troncos com marcas de dentes e vegetação ripária movida perto da água.”

Indícios de castor nas margens do rio Tormes. (A) Tronco de salgueiro roído;
(B) troncos de árvores com marcas de dentes e roídos;
(C) pequena árvore (Alnus sp.) com tronco roído; (D) vegetação movida.

Até à data da publicação do artigo, a equipa ainda não tinha conseguido ver nenhum castor. Tal se explica com “o facto de o rio ser quase inacessível a partir de terra, sendo um local de grandes canhões e raras as praias ou áreas abertas, o que torna difícil observar os animais”.

Contactado pela Wilder, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) afirmou ter conhecimento da presença de castor próxima da fronteira com Portugal, através deste artigo científico.

O Parque Natural do Douro Internacional está atento a possíveis incursões de castores. “O ICNF executa um programa de monitorização de mamíferos nas áreas protegidas de âmbito nacional, no caso na região Norte, que inclui o Parque Natural do Douro Internacional e, por isso, será possível detetar a expansão da espécie para território nacional, caso esta venha a ocorrer”, acrescentou este instituto.

“Este surpreendente registo em Salamanca pode resultar, em poucos anos, numa nova adição para a nossa biodiversidade”, comentou à Wilder Francisco Álvares, investigador do BIOPOLIS/CIBIO – Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos/ InBIO Laboratório Associado, Universidade do Porto, especializado em mamíferos. “Com efeito, caso se confirme serem indivíduos de castor euro-asiático, significaria o regresso de mais um mamífero que se encontrava extinto em Portugal, à semelhança do que aconteceu nas últimas décadas com o esquilo-vermelho, a cabra-montês e o urso-pardo.” 

O regresso do castor

Tempos houve em que o castor vivia por toda a Europa, incluindo nos grandes rios da Península Ibérica, e era considerado uma espécie chave.

“De acordo com a toponímia atribuída a esta espécie (como “Fiber/Biber”, “Castor” e “Veiro”), o castor deveria ocorrer nas principais bacias hidrográficas do noroeste de Portugal, incluindo o vale do rio Douro, onde as condições ambientais são mais compatíveis com a sua ecologia”, lembrou Francisco Álvares.

Em Portugal, o castor ter-se-á extinguido no século XV devido à destruição de zonas húmidas e à caça excessiva. No resto da Europa, o desaparecimento deste mamífero chegou mais tarde, no final do século XIX. A espécie viu-se reduzida a poucas populações fragmentadas devido, principalmente, à caça intensiva (por causa da carne, pêlo e óleo de castor).

A sorte do castor começou a mudar no início do século XX graças a projectos de reintrodução e translocação (movimentação de indivíduos de uma área para outra, para ajudar a restabelecer populações e recuperar territórios históricos).

O castor regressou à Península Ibérica em 2003, quando 18 animais foram libertados, de forma não oficial, no rio Aragão (comunidade de Navarra), vindos do Norte e Sudoeste da Europa. Em 2018, a Comissão Europeia declarou o castor uma espécie historicamente nativa e, depois disso, o Governo espanhol declarou o castor como espécie protegida.

Desde então, a espécie expandiu-se em “muitas áreas da bacia do Ebro e colonizou áreas das bacias do Douro e Tejo”, indicam os autores do artigo. Agora, o registo descoberto perto da fronteira com Portugal surpreendeu os investigadores, pois aconteceu a 332 quilómetros de distância do seu território conhecido mais próximo.

Dizem haver duas explicações para esta nova população: dispersão natural ou introdução humana, sendo que se inclinam mais para esta última, ou seja, uma libertação não oficial de animais mantidos em cativeiro. Tendo em conta a taxa de expansão de 15 quilómetros/ano ao longo da bacia do Ebro, a equipa diz que teriam sido precisos cerca de 40 anos para os animais percorrerem os 611 quilómetros que separam esta nova população da outra mais próxima conhecida.

Castor fiber. Foto: Bohuš Číčel/WikiCommons

Francisco Álvares considera “muito provável” a expansão natural do castor até Portugal, depois deste novo registo. “O castor é uma espécie com uma elevada capacidade de dispersão natural através dos rios. Tal é claramente demonstrado pela sua recolonização em Espanha, onde foram reintroduzidos 18 individuos em 2003 na comunidade de Navarra e, em pouco menos de 20 anos, a espécie já ocorre numa grande parte da bacia hidrográfica do rio Ebro e colonizou as regiões adjacentes das bacias do rio Tejo e rio Douro.”

Um futuro Portugal com castores?

Poderá ser uma questão de tempo até o castor atravessar a fronteira com Portugal, mas terá a região do Douro Internacional condições para a espécie? Este investigador português acredita que “sim, embora essas condições possivelmente não sejam perfeitas e seja importante desenvolver estudos para avaliar a adequabilidade e conectividade do habitat em Portugal”.

“O castor é uma espécie associada, principalmente, ao troço médio-inferior dos rios, em planícies aluviais com bosques ripícolas extensos e bem desenvolvidos, ou seja, necessita da presença de floresta nativa a rodear massas de água. Pelo contrário, o troço do rio Douro a juzante da Barragem da Bemposta forma um vale encaixado com bosque ripícola pouco desenvolvido e encontra-se sujeito a oscilações irregulares do nível da água. No entanto, alguns afluentes a jusante – como os rios Sabor, Tua ou Tâmega – poderão ter condições mais adequadas para suportar uma população reprodutora.”

Francisco Álvares considera “necessário sensibilizar a sociedade sobre o – esperado – regresso deste simpático roedor, e criar bases legais para assegurar uma coexistência pacífica, tendo em conta os seus benefícios para uma paisagem mais sustentável e biodiversa”.

Isto porque os castores são considerados “engenheiros de ecossistemas”, provocando profundos efeitos nos cursos de água e suas margens. “Ao construirem barragens e abrigos com os troncos de árvores, criam pequenas lagoas e açudes, assim como clareiras desprovidas de árvores, que contribuem para a regulação do fluxo e qualidade da água, assim como para a criação de micro-habitats que beneficiam uma multitude de outras espécies, animais e vegetais. Assim, numa perspectiva da crescente necessidade de restauro ecológico e mitigação dos efeitos das alterações climáticas, o regresso do castor a Portugal poderia ser o nosso melhor aliado para alcançarmos as metas ambientais impostas pela União Europeia”, sublinha o mesmo investigador.

Castor fiber. Foto: Jerzy Strzelecki/WikiCommons

No entanto, quando ocorre em grandes densidades, o castor pode causar alguns impactos socio-económicos, provocando inundações em campos agrícolas e estradas, ou prejuízos na produção florestal.

Neste momento, outros países europeus debatem o regresso deste mamífero aos seus territórios. Itália, de onde o castor se extinguiu em cerca de 1500, apresenta hoje pequenas populações na Toscânia e Umbria, originadas de libertações não oficiais em 2017 e 2018. Em França, a espécie tem vindo a colonizar os rios do país desde os anos 1970.

Na verdade, o castor-europeu é uma das espécies que registou os regressos mais expressivos à Europa nos últimos 40 a 50 anos, segundo o relatório “European Wildlife Comeback”, divulgado em Setembro de 2022.

Helena Geraldes

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