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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 6 de julho de 2023

Capela de S. Sebastião

 
Esta capela fica perto, mas fora da cidade, ao nascente e dá o nome a 
uma avenida, largo ou passeio arborizado em comunicação com ela. Já existia no século XV(572), segundo se vê dos desenhos das fortificações de Duarte de Armas. A sua origem deve filiar-se no voto feito por D. Manuel, por causa da grande peste que em 1505 assolou o reino, de erigir nos arrabaldes de todas as vilas e cidades uma ermida dedicada a S. Sebastião, conforme diz José Avelino de Almeida no seu Dicionário Abreviado.
Porém, a Descrição Topográfica, de Borges, diz que se fundou por voto da cidade por causa da peste de 1569 e que nas guerras da Aclamação (1640) um engenheiro a mandou demolir por conveniências de táctica militar, sendo depois erigida a fundamentis pela câmara municipal e povo.
Parece que o prior de Santa Maria e o abade de S. João tinham nela igual jurisdição. Ver o que dissemos sobre a igreja de S. João a propósito desta capela, que pertence à câmara de Bragança.
Desta capela sai e a ela recolhe S. Jorge, pois não a tem própria, quando vai na procissão de Corpus Christi montado em cavalo branco, de lança em riste, acompanhado de um piquete de cavalaria e militares à laia de estado-maior de um general, cuja figura o santo representa nas suas funções públicas.

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(572) LOPO, Albino – Bragança e Benquerença, p. 35 e 90.
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Também da mesma maneira a Câmara de Bragança é obrigada, dizem que por voto antiquíssimo, a fazê-lo conduzir todos os anos no dia 23 de Abril a uma capela chamada de S. Jorge, situada na ribeira e perto de Vila Nova, a três quilómetros ou menos de Bragança, onde assiste à missa, mas fora da capela, guardado pelos moradores desta povoação, pois se passar para a outra margem da ribeira, onde há umas ruínas, não volta, diz a lenda: fica lá.
Ainda hoje se observa invariavelmente esta romaria do santo todos os anos, dia 23 de Abril, por mais tempestuoso que o dia esteja.
Eis como Cardoso nos dá a razão deste facto:
«Conta a tradição, diz ele, que no tempo de Ramiro II era conde de Ariães (573) D. Pelaio, o qual fazia suas entradas e assaltos por aquelas partes com venturoso successso, em gravo damno dos mouros.
De sorte que, molestados os de Bragança, com tão poderoso visinho, vieram com elle a partido, dizendo que lhe entregariam a dita cidade, se entrasse em campal desafio com hum valorosissimo mouro, em força e membros mui desigual. O intrepido conde, alegre o acceitou, entendendo, que como pelejava contra inimigos da fé, alcançaria victoria delles.
E muito mais sabendo que era dia de S. Jorge, a quem fez logo voto, juntamente com os seus, promettendo, se levasse a melhor do inimigo, levantar-lhe templo a que todos annos irião neste dia em procissão.
Com isto sahiu ao campo... e ao primeiro talho, prostou a seus pés cadaver, aquella inimada torre de carne, pela qual razão se chama ainda hoje o logar do desafio – Prado do Talho – que fica no limite da veiga de Ariães. Assistiu o nosso D. Pelaio, com outros condes e prelados de Portugal, na sagração da egreja compostellana a 7 de maio anno de 879, segundo Sampiro, Bispo de Astorga, na sua historia, pag. 56, onde assigna Pelagius Bregantiae Comes.

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(573) A tradição deste conde é muito viva ainda, mas chama-lhe conde de Ariães e não D. Pelaio.
Na matriz do Castro de Avelãs há um túmulo que dizem conter os seus restos mortais e do qual a Bragança e Benquerença, p. 57, nos dá uma gravura. Pouco abaixo da povoação há uma ponte sobre o ribeiro que banha a mesma e é chamada ponto de Ariães. Segundo uma tradição que ouvimos, este conde, zangado contra a própria mãe, por lhe não ter o jantar feito quando voltava da caça, açulou-lhe os cães que a mataram. Em penitência foi-lhe imposto que tirasse um cabelo da sua própria cabeça e o metesse numa pia de cantaria com água, debaixo de uma pedra, até que se convertesse em cobra (ainda hoje o nosso povo dá a estes répteis idêntica origem) e depois a fosse criando até ser bastante grande e então se meteria numa tumba com ela até esta o devorar, para que assim, ele filho mau, que matou quem o gerou, de si mesmo criasse quem lhe fizesse outro tanto. A tumba em que o conde se meteu é o túmulo supra mencionado. Algo concorda esta lenda com o que dizem os Livros de Linhagens a propósito do braganção D. Fernão Mendes, o Bravo (Portugaliæ Monumenta Historica, tit. I, p. 165).
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Este voto cumprem hoje inviolavelmente os cidadãos de Bragança, em tanto que cahindo o dito santo no triduo da Paixão, ou em dia de Paschoa e por mais agua que chova e tempestade que faça, distando esta egreja (parochia agora de Villa Nova) meia legua da cidade, não falta o piedoso senado a sua votiva obrigação.
A mesma tem o logar de Samil, morada então do conde, no qual permanecem ainda ruinas de seus palacios» (574).
O nome de Pelágio dado ao conde da tradição acima referida por Cardoso talvez fosse arranjado com vista no conde de Bragança com nome idêntico, mencionado pelo Chronicon, de Sampiro, segundo Florez,
España Sagrada, tomo XIV, pág. 442; mas hoje, em Castro de Avelãs e imediações só vive a tradição do conde Ariães, a cujo nome ligam a lenda referida por Cardoso.
Borges (575) refere a lenda por outra forma. Segundo ele, Afonso IV de Leão, arrependido da abdicação ao trono, levantou divisões entre seus vassalos de onde proveio a guerra civil e a queda de Bragança em poder dos mouros em 931, voltando só a recuperá-la os cristãos a 23 de Abril de 1001, após monumental derrota infligida àqueles na ribeira de Vila Nova, cercanias de Bragança, depois chamada ribeira de S. Jorge, por razão da capela erigida a este santo como monumento, pois fora visto na batalha pelejando na vanguarda dos cristãos. O infante Alboazor Ramires, filho de Ramiro II, rei de Leão, e da celebrada Zara, era o capitão da hoste cristã. Para comemorar o feito, fez a Câmara de Bragança o voto que ainda hoje cumpre.
Em a Ilustração Transmontana, 1909, págs. 149 e seguintes, dedicou Daniel Rodrigues largo artigo a esta lenda, acompanhado de esplêndidas gravuras da parte ainda em pé desse monumento arquitectónico que foi o antigo mosteiro beneditino de Castro de Avelãs: monumento único no seu género em Portugal, que a estupidez dos nossos antepassados destruiu ou votou a abandono vandálico, em nada resgatado por nós que, impassíveis, como se as grandiosidades da arte não falassem ao nosso espírito, assistimos ao desmoronamento de uma das capelas laterais do seu templo à qual se seguirá a outra e depois a abside, tudo de tijolo formando arcaturas fenestradas sobrepostas em dois andares num espécimen soberbo de estilo românico.

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(574) CARDOSO, Jorge – Agiologio Lusitano, ao dia 25 de Abril. O Tombo dos Bens do Mosteiro de Castro de Avelãs, tratando de Gostei, ainda menciona o Prado do Talho. CASTRO, João Baptista de – Mapa de Portugal, 2.ª edição, tomo II, p. 257.
(575) BORGES – Descrição Topográfica…
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Ó vós que em Portugal tendes corregimento destas coisas: acudi a Castro de Avelãs! Por quem sois! Olhai que está exposto às injúrias, não dizemos do tempo porque as afrontou impávido durante oito séculos, mas do homem, do sonhador de tesouros, esse arco da capela lateral que é um primor! Nas suas arquivoltas e pés direitos soube o artista tirar tais efeitos de luz e sombra dos simples tijolos dispostos em saliências, reentrâncias e fiadas simétricas de grossura desigual, que nada cedem aos dos mármores e granitos quando o génio lhes dá expressão e vida.
A propósito do túmulo do conde Ariães, ver O Arqueólogo Português, tomo III, pág. 83, onde vem a fotogravura do mesmo, acompanhando um artigo que lhe é consagrado e no qual seu autor, Albino Lopo, refere a respectiva lenda por forma quase idêntica à nossa, e também José Leite de Vasconcelos, Religiões da Lusitânia, tomo III, pág. 17 em nota.
Devemos advertir que Daniel Rodrigues, fazendo sobre a lenda do Conde Ariães um trabalho literário, fantasiou bastante, ligando-lhe outras lendas referentes ao castelo de Rebordãos, pois na sua singeleza, como o povo a refere, é a que deixamos mencionada.
Coisa notável! Junto à igreja matriz de Malta, perto de Chacim, concelho de Macedo de Cavaleiros, há uma tumba de granito semelhante à de Castro de Avelãs, colocada sobre o dorso de dois leões da mesma matéria, e o povo adscreve-lhe lenda idêntica. Convém lembrar que uma vergôntea genealógica dos bragançãos, a que pertence o tal D. Fernão Mendes, o Bravo, teve o apelido de Chacim por aí fixar residência, como mostram os ditos Livros de Linhagens.
A Câmara de Bragança todos os anos metia em orçamento uma verba pouco mais ou menos de trinta mil réis para ocorrer a estas despesas da ida de S. Jorge a Vila Nova. Agora, as vereações republicanas não dão nada e fazem à lenda e interessante tradição o que o tempo edax e o homem edacissimus faz à veneranda relíquia arquitectónica de Castro de Avelãs.
Pinheiro (576) dá como provável, segundo o informaram, o começo desta procissão no tempo de D. Afonso III, época em que o santo seria transferido para Bragança, contra vontade dos de Vila Nova, mas com a condição de lho levarem lá todos os anos. Nós, porém, nos arquivos da câmara, cabido e Castro de Avelãs não encontramos base para tal asserção.

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(576) PINHEIRO, José Henriques – Estudo da Estrada Militar Romana de Braga a Astorga, p. 66.
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A capela de S. Jorge, no termo de Vila Nova, fica numa veiga sulcada por um pequeno ribeiro, e ao sul, defronte dela, a pequena distância, fica uma colina chamada devesa de Vila Nova onde têm aparecido fragmentos de telha, tijolo, argamassa e cerâmica romana e também algumas moedas dessa nação e lápides funerárias (577). Nestas ruínas localizou Pinheiro(578) a antiga Brigantia ou presumiu que ficasse perto, e para explicar a ida do santo à capela, de acordo com Martins Sarmento, a quem consultou sobre o caso, disse que neste local se adoraria o deus Brigo, e como «um dos meios a que a Egreja se soccorreu para destruir a religião pagã, enraizada nos aldeões (pagani), foi christianisar os seus loca sacra, os seus deuses», mudada a sede da antiga Brigantia para o local da actual Bragança e com ela o seu deus Brigo, este, cristianizado em S. Jorge, por haver entre eles identidade de atributos, ficou visitando anualmente as ruínas já consagradas ao culto cristão por uma capela, pois com isto se contentaria o povo acostumado aos actos externos do culto sem entrar muito no âmago das questões teológicas.
Quer dizer: encarnaram-se nos santos do cristianismo os atributos dos deuses pagãos, que neste caso mudavam apenas de nome, e foi continuando tudo na mesma.
Não estamos longe de crer que os templos nos despovoados e lugares altos representam a tradição cultual de uma mitologia extinta. As ruínas luso e pré-romanas, que quase sempre lhe ficam perto, assaz o demonstram; mas daí à explicação de Pinheiro e Sarmento vai muito.
As ruínas da devesa de Vila Nova não podiam ser uma posição militar, pois estão dominadas completamente por outras colinas mais elevadas; são demasiadamente pequenas em área para supormos que nelas existiu povoado de alguma importância, e nem mesmo apresentam vestígios de grandes obras defensivas que os guardassem, o que tudo nos inibe de localizar aqui a primitiva Brigantia.
Demais, a existência do deus Brigo não é indicada aqui por vestígio algum a não ser que queiramos vê-lo na raiz da palavra Brigantia, primevo da actual Bragança.

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(577) LOPO, Albino – Bragança e Benquerença, p. 55. O Arqueólogo Português, tomo III, p. 127 a 148, tomo XIII, p. 314, e tomo XIV, p. 151.
(578) PINHEIRO, José Henriques – Estudo da Estrada Militar Romana…, p. 59 e seguintes.
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A existência desse deus apenas consta de uma lápide do museu de Guimarães encontrada na freguesia de Delães, concelho de Famalicão(579), e por conseguinte a muito grande distância das nossas ruínas. Nada de averiguado sobre os predicados de tal divindade, e nem mesmo os filólogos estão de acordo para nos dizer se o nome é céltico, pré-céltico ou ligúrico.
De resto, o caso em si pouco tem de extraordinário porque no bispado de Bragança encontram-se templos e capelas em povoados ou fora deles, que são visitados procissionalmente por seis e mais povoações de cruz alçada e santos em andores, como diremos noutra parte.
Perto das ruínas da devesa de Vila Nova e a menos de trezentos metros delas, fica um local chamado Britelo, onde ainda em 1461 existia a povoação deste nome (580), já desabitada em 1691, segundo vemos pelo Tombo dos Bens do Cabido de Miranda, feito neste ano.

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(579) VASCONCELOS, José Leite de – Religiões da Lusitânia, vol. II, p. 325.
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MEMÓRIAS ARQUEOLÓGICO-HISTÓRICAS DO DISTRITO DE BRAGANÇA

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