segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

José Marques de Sampaio e Melo Constantino

...ou, melhor, Constantino, o «Rei dos Floristas», como é geralmente conhecido. Célebre artista; nasceu em Moncorvo a 18 de Agosto de 1802 e faleceu em França, na sua quinta de Tercy, junto a Paris, a 14 de Janeiro de 1873. Era filho bastardo de boa família que, para encobrir o seu nascimento, o mandou criar na povoação do Larinho, concelho de Moncorvo, indo depois passar a adolescência na vila da Alfândega da Fé, em casa do tendeiro António José Cândido, voltando em seguida para Moncorvo como criado grave para casa nobre. 
Foi um ano noviço no convento de S. Francisco de Moncorvo. Em 1820 assentou praça em caçadores n.° 5, que então estava em Viseu, chegou a cabo de esquadra e foi com o seu batalhão para as ilhas dos Açores, onde aprendeu a fazer flores, casou e teve baixa do serviço. Em 1828, entrando as tropas liberais nos Açores, veio para Portugal e assentou praça no batalhão de voluntários realistas de Vila Flor, sendo este o motivo porque alguns o fazem natural desta vila. Esteve no cerco do Porto em 1832 com o seu batalhão, sendo já primeiro sargento, promovido a porta-bandeira por distinção no combate de 29 de Setembro desse ano. 
Em 1833 foi com o seu batalhão para o cerco de Lisboa e, seguindo todas as fases da luta fratricida até à convenção de Évora-Monte, marchou com o seu rei para o estrangeiro, aportando a Génova (Itália) a 5 de Junho de 1834, onde se aperfeiçoou na factura das flores e aprendeu os segredos da confecção das tintas no estabelecimento de madame Vieillard.
Partiu depois para Paris, aspiração dos seus sonhos de artista, onde chegou a 13 de Dezembro de 1834, tendo visitado na jornada as fábricas de flores de Turim e Lyon. Mr. Flamet, célebre florista, em casa de quem se apresentou com uma carta recomendatária de madame Vieillard, para o experimentar,mandou-lhe fazer um ramo de flores de penas, que a Guarda Nacional comprou por quinhentos francos (90$000 réis) para o oferecer à rainha D. Amélia, esposa de D. Luís Filipe, que ficou encantada. «Desde então a fama de Constantino foi universal e com razão; imitava pasmosamente as flores naturais, tanto na flexibilidade, cor, aromas e frescura, como em todos os mais acidentes da natureza».
Quando, em 1844, casou a princesa D. Clementina, sua mãe, a rainha D. Maria Amélia, esposa de D. Luís Filipe, encomendou-lhe a coroa de laranjeiras. Constantino levou-lhe duas, uma artificial e outra de flores naturais, pedindo à rainha que escolhesse; e como esta estava perplexa, deixou-lhas ambas, dizendo que no dia seguinte iria buscar a rejeitada; mas quando voltou, a rainha diz-lhe estas palavras que os jornais repetiram por todo o mundo: «As suas flores teem apenas uma diferença das naturais: é que estas murcham e as suas não».
«A sua gloriosa alcunha nasceu no dia em que no Palais Royal se realizou uma kermesse promovida pela rainha. Perante as flores que Constantino offerecera, a côrte teve exclamações de enthusiasmo: Vive Constantin! Vive le roi des floristes! Foi uma acclamação solemne».
Associou-se em Paris com Mr. Isidore, e à sua fábrica, um dos mais famosos estabelecimentos dessa cidade, encomendavam flores as principais casas e cortes da Europa e algumas da América. As camélias de penas de aves feitas por Constantino foram consideradas verdadeiras maravilhas. Na exposição de 1844 obteve o primeiro prémio e o seu nome foi um dos primeiros proclamados por D. Luís Filipe, sendo depois condecorado com a Legião de Honra. Tão estrondosos aplausos não lhe amorteciam o amor pátrio, que o levava a colocar sempre nas exposições universais de Londres e Paris as suas manufacturas na secção portuguesa.
Em 1850 veio a Portugal, onde teve recepção estrondosa promovida pelos nossos escritores e artistas, que lhe deram um jantar no hotel de Itália, levantando à sua saúde um caloroso brinde o visconde de Almeida Garrett.
No Porto e outras terras, que visitou, foi muito festejado.
Regressando a Paris, voltou a Portugal em 1854 à procura de ares pátrios receitados pelos médicos à sua saúde deteriorada, e no ano seguinte estava já novamente naquela cidade, mas a guerra franco-prussiana e a Comuna, causando-lhe graves prejuízos, apressaram-lhe o termo da vida.
Há quem diga em Alfândega da Fé que Constantino nasceu nesta vila; fundando-se em que o respectivo município subsidiou a sua criação, quando pequeno (subsídio de lactação), o que só era concedido às crianças nascidas no concelho, filhas de pais incógnitos. Parece-nos de pequeno peso este argumento, pois muitos meios havia de o sofismar e até razões para o transgredir.

A CONSTANTINO REI DOS FLORISTAS

Ergue a fronte altiva e nobre
Ergue a fronte, oh génio-rei
A ti sim, a ti me curvo
A ti só me curvarei.
Que m’importam reis da terra,
Debatendo-se na guerra
Das mais túrbidas paixões?
Podem outros dar-lhes cantos,
Eu, por mim, maldigo quantos
Rojam vis adulações.
O poeta nasceu livre
Como é livre o imenso mar;
Os cantos da minha lira
Não os sei mercadejar.
– À sob’rana inteligência,
À sã virtude na essência,
Só meus cultos prestarei.
Constantino! A ti um brado,
A ti meu canto enlevado,
A ti sim, oh génio-rei.
Rival de Deus sobre a terra,
Quem te nega adoração,
Quando a França te saúda
– Novo rei da criação?!
Quando a Europa d’espantada
Curva a fronte laureada
Ante o teu génio imortal?!
Quando colhes d’entre os louros
O mais rico dos tesouros:
– Um triunfo a Portugal?!
Constantino! Como é grande
O teu génio criador,
Quando vertes o perfume
No cálix da TUA flor!
Quando imitas a beleza
Da risonha natureza
Com teu mágico pincel!...
Quem ao ver tão belas flores
Não as crê próprios verdores
Do mais ameno vergel?
No tapete d’esmeraldas,
Que alcatifa o TEU jardim,
Brinca meiga a branda aragem
Embalando alvo jasmim,
Fascinada a mariposa
Lá doudeja em torno à rosa,
Nela poisa, mas em vão;
Na seiva o gozo procura,
Não a encontra... e na tortura
Morre, ali duma ilusão!
Constantino! A ti me curvo,
A ti só me curvarei,
És um astro luminoso,
És do mundo o génio-rei!
Quando a Europa os seus primores,
Variados de mil cores,
Na Bretanha apresentou,
Quis a França disputar-nos
Alta glória; – quis roubar-nos
O teu nome que assombrou...
Mas tu d’altivo bradaste:
«Sou filho de Portugal!
Embora eu viva na França,
É minha terra natal».
Oh! bem haja o homem nobre,
Que ama ainda a pátria pobre
Rica outrora tanta vez...
Bem haja o filho valente
Nesta acção de português!
Constantino! Vinga a pátria
Que foi grande entre as nações;
Enobrece-a enobrecendo
Mais e mais os teus brasões:
Génio raro! Ergue-te ovante!
O teu futuro é brilhante;
Será teu nome imortal!
Viverás na lusa história,
Qual lá vive inda a memória
Do nome de Portugal!
Porto, 25 de Novembro de 1851

ANTÓNIO PINHEIRO CALDAS
——————
Portugal! Portugal que de grandezas
não procria o teu âmbito apertado!
Que musa excede as musas portuguesas?
Qual deu pelo orbe mais faustoso brado?
Aos teus heróis de máximas empresas
tinha-os de palmas teu Camões coroado;
às belas tuas e às do mundo, agora
cinge teu Constantino os dons de Flora.
Antes de Constantino só Favónio
Cibele e Febo produziram flores,
Constantino as produz não menos belas
e de mais viço e de mais vida que elas.

Sobre este nosso conterrâneo ilustre imprimiu-se em Paris um grosso volume intitulado Mémoires Historiques, Généalogiques et Chronologiques, concernant les ascendances de Constantino José Marques Monteiro Lopes Banha de Melo Sequeira Sampaio Coutinho Freire Manuel Borges da Costa de Araújo Pereira Bacelar Teixeira Pinto de Magalhães e Lacerda. Paris, 1854. Parece que usava de todos estes nomes, e em harmonia com eles mandou compor um brasão de armas. Na Ilustração Trasmontana, 1908, pág. 161, vem um longo artigo, acompanhado de fotogravuras, referente a Constantino, e outro na Ilustração Portuguesa, n.° 183, relativo a 23 de Agosto de 1909, também acompanhado de muitas fotogravuras alusivas ao Rei dos Floristas e passagens da sua vida. O jardim público do novo bairro da Estefânia, em Lisboa, tem o nome de «Jardim de Constantino», em memória deste célebre trasmontano.
A propósito deste ilustre trasmontano, diz ironicamente o visconde de Santarém: «Para me consolar da ausencia delle [refere-se a um amigo], inventou o celebre Constantino um jantar para Domingo, mas o estado da minha saude por uma parte, e a inferioridade da minha posição e qualidade, á que elle se dá agora, tendo-se declarado descendente dos Imperadores Romanos, não me permittio acceitar o seu convite. Já não é Constantino de Marialva, isso era do rocócó, agora nos convites saio-se com os appellidos de Sam Payo, e Mello, e diz em alto e bom som a quem mo contou que a sua família é mais antiga do que a de todas as Casas Reinantes, pois descende dos Imperadores Romanos, cuido que de Heliogabalo, que foi o mais docil de todos. Se elle tal disse não sei como o Porteiro da Casa dos Orates o deixou andar por fóra!».
Em 1853,António Bernardo de Morais Leal, como procurador de Constantino José Marques de Marialva e Melo Pinto Sequeira de Lacerda, residente em Paris, requereu ao vigário-geral de Pinhel que lhe mandasse passar certidão de idade de sua mãe D. Vicência Vitorina de Melo Banha, filha de José Bernardo de Melo Banha e Sequeira e de D. Ana Luísa Joaquina de Araújo Teixeira Bacelar e Lacerda, natural de Moncorvo e baptizada na Póvoa do Concelho, termo de Pinhel, a 7 de Setembro de 1773; neta paterna do comendador Francisco Banha Sequeira Coutinho, fidalgo da casa real, e de D. Josefa Antónia de Melo Freire e Sampaio, da Póvoa do Concelho, e materna de Narciso Borges de Araújo Bacelar, cavaleiro professo na ordem de Cristo, de Refóios de Cima, e de D. Antónia Josefa Teixeira de Magalhães e Lacerda, de Moncorvo.
A certidão de idade, que diz ser extraída do fólio 186 de um livro do arquivo paroquial de Moncorvo por despacho do vigário-geral da comarca, diz: «Constantino, filho de José Joaquim Marques Moutinho Lopes, natural da villa de Moncorvo [outros documentos dizem nascido em Lodões, concelho de Vila Flor], e D. Vicencia Victorina Banha de Mello Sequeira Sampaio Coutinho Freire Manoel Borges da Costa de Araujo Pereira Bacellar Teixeira Pinto de Magalhães, natural da Povoa do Concelho, comarca de Trancoso; neto pela parte paterna de José Luiz Marcos, da freguezia de Fornos, monteiro-mór da villa da Torre de Moncorvo, e de D. Ignacia Maria Moutinho Lopes, da freguezia de Lodoens, concelho de Villa Flor; e pela parte materna, neto de José Bernardo de Melo Sequeira Sampaio Banha Coutinho Freire Manoel, fidalgo cavaleiro da Caza Real, natural da Povoa do Concelho, e de D. Ana Luiza Antonia Izabel Joana de Araujo Borges da Costa Pereira Bacelar Teixeira Pinto de Magalhães e Lacerda, natural de Moncorvo, nasceu na mesma villa de Moncorvo aos dezoito dias do mez de Agosto, do ano de 1802: e foi baptizado em Alfandega da Fé aos 28 dias do mesmo mes, pelo Rd.° Padre Francisco José Villares Ribeiro, e foi seu padrinho Manoel Antonio Aleixo, capitão mór de Murça».
Tanto o requerimento como a certidão são cópia de documentos autênticos pertencentes à Ex.ma Sr.a Doutora D. Regina Quintanilha, a quem agradecemos a fineza destas informações, e respeitam a uma habilitação de génere, espécie de investigação de paternidade, feita pelo Rei dos Floristas pelos anos de 1853, quando os mesmos eram já falecidos. À mesma colecção de documentos pertence uma árvore genealógica que alcança até aos quartos avós, tanto maternos como paternos, de Constantino, organizada em face de certidões extraídas dos livros do registo paroquial de Moncorvo e das mais terras respectivas. É possível que todos estes documentos representem a verdade; mas, organizados meio século depois do facto do nascimento de Constantino, sobre o depoimento de testemunhas que não podiam certificar positivamente mas apenas pela tradição, na qual certamente influiria a evidente megalomania do Rei dos Floristas, o seu prestígio e o desejo de o lisonjear, carecem da solidez incontestada que deve haver nestas coisas.
No Museu Regional de Bragança há, por oferta do doutor Raul Manuel Teixeira, alma artística do mesmo, um amor perfeito de Constantino, que, apesar dos anos, bem inculca o brilhante talento artístico do autor.
CONTINS – Em 1620 representaram a el-rei os moradores de Contins, termo da vila de Mirandela, dizendo que a sua igreja matriz estava arruinada e prestes a cair e, como eram pobres e não tinham recursos, pediam para cultivar o prado da Coutada, sito no limite de Contins, indo para a Senhora do Viso, a fim de, com o seu produto, procederem às obras de reparação na dita igreja. El-rei permitiu-lhe o usufruto do prado mencionado durante seis anos.

Memórias Arqueológico- Históricas do Distrito de Bragança

Sem comentários:

Enviar um comentário