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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

O "TI BLOSO"


Lembro-me dele, curvado pelo peso dos anos, a caminhar na Rua do Loreto.
Carão grande, feições expressivas, mãos potentes presas a pulsos grossos. Mãos habituadas a malharem e retorcerem o ferro, de acordo com os seus ditames e desejos.
No entanto, estas poderosas mãos também consertavam sensíveis mecanismos das espingardas.
No seu quotidiano de trabalho as facécias resultantes do seu modo despachado de resolver os problemas granjearam-lhe fama e admirações de várias proveniências.
Uma dessas facécias respeita a um rapazola incumbido de, em determinado dia, ir levantar uma espingarda entregue aos seus cuidados. De posse da espingarda, o moço perguntou-lhe quanto custava o conserto. “São vinte escudos” respondeu o Sr. Veloso. O rapaz deixou cair o pedido de um recibo, a fim de entregar ao dono da arma. “Bom, com recibo são quarenta escudos” atirou o sabido artesão.
A vertiginosa subida do preço da reparação levou o rapazote a desistir do pedido.
Esta reviravolta provocou o espanto do seu velho amigo Artur Mirandela, que assistia ao desenrolar dos acontecimentos. Não se conteve e interpelou-o: “Como é? Sem recibo vinte escudos, com recibo quarenta escudos?!”. A resposta, lapidar, surgiu de pronto: “Então o rapazelho tinha alguma necessidade de saber que eu não sei escrever?!”.
Os seus trabalhos de ferreiro encontravam-se – talvez ainda se encontrem – espalhados pelas aldeias das redondezas.
No decorrer de uma actividade venatória vislumbrou na aldeia de França uma grade de varanda em ferro. Susteve o passo, apreciou a obra e desabafou: “Que coisa feia! O raio da grade até está torta”. Ante tão contundente crítica o compincha Mirandela logo lhe avivou a memória dizendo ter sido a grade feita por ele. Impávido e sereno, o émulo de Hefesto atribuiu ao desnivelamento do terreno as culpas pelo modo em que se encontrava a grade.
O Sr. Manuel Veloso gostava da profissão. Mas, verdade, verdadinha, do que ele gostava era de caçar.
Fazia parte de um temível e bem humorado grupo de caçadores, onde pontificavam o já referido Artur Mirandela, o poeta Miguel Torga, o Domingos Bramão, o arquitecto Manuel Ferreira e a D. Mimi Pinto de Azevedo.
O intrépido ferreiro não se deixava impressionar pelos currículos dos companheiros de caça. Daí dizer ao autor dos “Contos da Montanha” ser-lhe impossível iniciar a sublime arte de caçar sem primeiro ter refeiçoado de faca e garfo. Na dele, tal falha seria igual a caçar com cartuchos sem pólvora.
Na condição de viúvo, namorou determinada rapariga atreita a pedir. Ela, um dia, arriscou a lembrar-lhe o longo período de namoro sem ele nunca ter tido uma lembrança para ela, nem ao menos um par de meias. A resposta, afiadíssima, soltou-se da boca: “Olha, rapariga, se me falas em dinheiro perdes o cliente!”.
A experiência e uma peculiar visão do mundo levavam o Sr. Manuel a tudo relativizar de maneira a não se deixar amofinar pelo fluir do tempo. Deixou saudades.

in:Figuras notáveis e notórias bragançanas
Texto: Armando Fernandes
Aguarela: Manuel Ferreira

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