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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Guerras entre D. Fernando I de Portugal e D. Henrique de Castela

Miranda, Outeiro, Mós, Vilarinho da Castanheira, Bragança e Vinhais tomadas pelos castelhanos. — Feito glorioso dos de Moncorvo. — Doações de Mirandela, Moncorvo, Alfândega da Fé, Bemposta, Penas Róias e Castro Vicente.

Havendo o bastardo D. Henrique assassinado seu meio irmão D. Pedro, o Cruel, rei de Castela, assenhoreou-se-lhe do reino, que el-rei D. Fernando de Portugal lhe disputou, como bisneto de Sancho, o Bravo, e em 1369 invadiu a Galiza tomando a Corunha que logo abandonou, sabendo que D. Henrique vinha sobre ele, e fugiu para Portugal.
Em represália, o castelhano veio sitiar Guimarães que não pôde tomar, graças à heróica defesa de seus moradores; recuando sobre a nossa província «e foi-se entom caminho de Braganza, e foia cercar e filhou-a» em 1369; mas a Chronica Conimbricense, lugar já citado, diz que a tomada de Bragança foi em 1370 e dois anos depois a de Miranda, no que certamente há erro, pois a esse tempo já estavam concluídas as pazes de Alcoutim que puseram termo à guerra.
Além de Bragança, também caíram em poder do castelhano: Vinhais, Outeiro de Miranda (é a vila de Outeiro, cabeça do extinto concelho hoje incorporado no de Bragança) e Miranda do Douro.
O documento que adiante aparece publicado pela primeira vez, e supomos referente a estas guerras, além de apontar também como tomadas pelos castelhanos as vilas de Mós e Vilarinho da Castanheira, respectivamente nos concelhos de Moncorvo e Carrazeda de Ansiães, espécie não mencionada nos escritores, subministra elementos para ajuizarmos do modo como as coisas corriam. Diz ele: «... e que ora quando chegaram os nossos inimigos a essa comarca (Moncorvo) forom cercados e combatidos de muytas companhas dos ditos nosos imigos e lhe forom queimados gram parte dos arravaldes e termhos que avyam e lhes forom roubados os gaados e feitos outros muitos grandes dapnos, de que ficarom muy dapnados e defendendo eles a dita vila e poendo os corpos e averes em nosso serviço ata que os ditos imigos se alçarom de sobre eles e que outro sy moos e vilarinho de castanheira que som acerca deles fezerom contra nos e contra nosso serviço o que non devyam em como sse o dito logo de vilarinho entregarom aos ditos nossos imigos sem serem combatidos, e o dito logo de moos se emprazarom e derom a refeens non seendo cercados nem combatydos non o fazendo eses lugares primeiro saber a nos seendo enprazados a tenpo que lhes podessemos acorrer».
É datado de 24 de Dezembro de 1381, e como castigo anexa as vilas de Mós e Vilarinho da Castanheira com seus termos ao concelho de Moncorvo.
Não deixa de ter graça o facto de D. Fernando andar «mui prasmado dos povos», a sua indignação contra as supracitadas vilas e a pretensão de as ir defender ele, o poltrão, como diz Pinheiro Chagas, «que em vez de socorrer se deixava estar em Coimbra de sossego, como diz maliciosamente Fernão Lopes. Mostrou-se depois sumamente indignado contra os habitantes de Bragança e de outras povoações de Trás-os-Montes, que se tinham rendido a D. Henrique, chegando mesmo a confiscar os bens de alguns que supôs mais culpados, o povo murmurava por causa desta severidade. E como ao mesmo tempo que assim procedia, ele se deixava estar pela capital não fazendo viagens mais largas do que até Santarém ou coisa semelhante e então não havia o folhetim, nem a revista do ano, nem a sátira, nem o epigrama, nem mesmo a chansonette gaulesa cintilante de chiste e deliciosa de pico epigramático, o povo se desforrava no seu rifão que resumia tudo aquilo e Fernão Lopes nos conservou e que vai textual para lhe não tirar o pico original — ex volo vai, ex volo vem de Lisboa para Santarém — Asnos vão e asnos vêm de Lisboa para Santarém».
Modernamente, nas lutas constitucionais, o povo, eterno poeta, ressuscitou numa variante irónica o mesmo rifão aplicado a um grande general:

Saldanha p’ra cima
Saldanha p’ra baixo
Mas não passa do Cartaixo.

Alguém dá a entender que Bragança foi tomada em 1371 ou depois, e conseguintemente as mais vilas citadas deste distrito, mas parece-nos que há equívoco, visto as pazes datarem de Março desse ano.
Demais, as conquistas pelo território bragançano seguiram-se rápidas ao levantamento do sítio de Guimarães e «em mui poucos dias (como diz Fernão Lopes, e de caminho ouçamos-lhe a traça que usaram para Miranda) cá uns foram tomados por arte, outros por se não poderem defender. Assim como foi tomada Miranda que, antes que el-rei D. Henrique chegasse a ela, mudaram-se alguns seus e fingiram que eram recoveiros portugueses e que haviam mister viandas da vila por seus dinheiros, os do logar não se cotando de tal arte, deram-lhe lugar que entrassem dentro, e eles entrando tiveram logo a porta, e nisto chegaram à pressa os que iam cerca para lhes acorrer, e desta guisa houveram a villa». Duarte Nunes de Leão na descrição que nos dá deste facto segue quase ipsis verbis o dizer do velho cronista.
Referem os historiadores o pânico extraordinário que causou a entrada de D. Henrique na região portuguesa: uma verdadeira assolação. Os frades, desamparando os conventos, vagueavam aflitos fugindo ao furor desenfreado da soldadesca castelhana; os moradores das aldeias abandonavam suas casas refugiando-se nas serras ou recolhendo-se «para as cercas e castelos com suas coisas e mantimentos»como aponta Duarte de Leão. Esta notícia do cronista mostra-nos a serventia de uma espécie de fortificações muito rudimentares que existem pelo nosso bispado, nos montes mas perto dos povoados, como a cerca de S. Vicente de Raia, concelho de Chaves, que enfileiram ao lado dos velhos Castros, das Torres, como a de Rabal, sobranceira à estrada de Bragança, das atalaias, como a da Candaira no monte de Urzelo, termo de Baçal, das Trincheiras como as duas, nos termos de Varge e Aveleda, no mesmo concelho de Bragança e em ponto menor, para fins de observação das Esculcas, como a de Vilartão na estrada de Vinhais para Chaves e dos vulgaríssimos fachos.
Referindo-se a este pânico, diz Fernão Lopes: «e todos os montes daquela comarca (Trás-os-Montes) foram então cheios de homens, mulheres e moços, gado, e viveram na Abadia Velha, e em Ventuzelo e em todas as aldeias dos montes altos, e todos os monges e abades dos mosteiros daquela comarca todos fugiram; e foi isto do mês de Agosto até Santa Maria de Setembro.
E deixou el-rei D. Henrique recado (guarnição) na vila de Bragança e foi-se para Castela».
Estas guerras entre D. Fernando e D. Henrique terminaram pela paz de Alcoutim, celebrada a 31 de Março de 1371, na qual se estipulava a entrega recíproca das terras tomadas e o casamento do nosso rei com D. Beatriz, filha do de Castela, o que não teve efeito e somente a primeira condição, voltando então ao domínio português Miranda e as demais vilas do nosso distrito com Bragança, governada na devoção de Castela, por um tal Garcia Alves de Osório.
A propósito destas guerras e seus protagonistas mete o bom do Fernão Lopes na sua obra tais naturalismos de frase vermelha que excedem muito quanto a moderna musa da escola realista canta. Hajam vista os capítulos XLI e LIII do livro I da sua crónica.
Na Ribeirada ou na Manteigui, de Bocage, não se diz mais desbragadamente, embora com mais malícia.
Por ocasião destas guerras fez o rei D. Fernando de Portugal largas doações aos fidalgos galegos e castelhanos que para ele se voltaram, como foram no nosso distrito: Mirandela, a D. Fernando de Castro, cunhado de el-rei D. Henrique; Moncorvo, Alfândega da Fé, Bemposta, Penas Roias e Castro Vicente, a Fernando Afonso de Zamora.




Memórias Arqueológico-Históricas
do Distrito de Bragança

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