quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Províncias a que pertenceu o território bragançano segundo as divisões de Espanha pelos romanos

Quando os romanos entraram a contender com os cartagineses na nossa península, duzentos anos antes de Cristo, dividiram-na em Citerior, para aquém do Ebro, relativamente à Itália, e Ulterior para além, ficando aquela reservada às suas conquistas e esta aos cartagineses.
Esta divisão manteve-se pouco tempo, porque, avançando a conquista romana sobre a Ulterior, regiões desta passam pelos escritores a ser designadas como pertencendo à Citerior. No entanto, a nossa região ficou sempre pertencendo àquela.
No ano 27 antes de Cristo, fez Augusto, no sétimo ano do seu consulado, nova divisão da Espanha em três províncias: Bética, Lusitânia e Tarraconense. Esta, à qual o território bragançano ficou pertencendo, compreendia Catalunha, Aragão, Valença, Múrcia, grande parte de Granada, Navarra, Biscaia, Astúrias, Galiza, Entre-Douro-e-Minho, Trás-os-Montes e grande parte de Castela. De maneira que pelo Sul, em grande parte, o Douro separava a Tarraconense da Lusitânia.
No ano 331, depois de Cristo, fez Constantino Magno nova divisão à custa da província Tarraconense, que deu três: Tarraconense, Galiza e Cartaginense que, juntas às duas existentes, Bética e Lusitânia, ficaram ao todo cinco. Ainda houve outras divisões que nada fazem ao nosso propósito.
As províncias eram divididas em chancelarias a que os romanos davam o nome de conventos jurídicos, com sedes nas mais importantes cidades de cada província, onde era administrada a justiça pelo pretor, pro-cônsul ou presidente da província.
A Igreja, para a divisão eclesiástica e colocação das sés metropolitanas, seguiu a divisão civil das chancelarias romanas, e os godos, pelo geral, mantiveram esta ordem de coisas.
O território bragançano, no tempo em que fazia parte da província Tarraconense, era compreendido debaixo da denominação geral de Gallaecia, hoje Galiza, que compreendia toda a região, desde a Foz do Douro até ao promontório Céltico ou Nério, hoje de Finis Terrae, cortando daí para as montanhas das Astúrias de onde descia, e este era o seu lado oriental, com estas até ao Douro, pelas alturas de Freixo de Espada à Cinta, que lhe servia de limite até desaguar no mar (98). Portanto, era então galego tudo o que hoje em Portugal faz parte das províncias do Minho e Trás-os-Montes, quase toda, se bem que na primitiva divisão de Espanha em Citerior e Ulterior, debaixo do conceito de Lusitânia, compreendiam os romanos larga extensão de terreno na região acima do Douro.
É, porém, de notar que, segundo Argote, a quem vamos seguindo, a linha divisória da Galiza pelo oriente passava entre Chaves e Bragança em direcção a Freixo de Espada à Cinta e, portanto, Bragança e povos situados ao oriente desta linha não eram galegos mas pertenciam à chancelaria de Astorga, isto é, aos Astures Augustanos, e não aos Astures Trasmontanos que formavam os dois povos em que a chancelaria se dividia com 240.000 habitantes, isto é, pessoas livres, como traz Plínio.
A demarcação da chancelaria de Braga, que tinha na sua jurisdição vinte e quatro povos ou cidades com 275.000 almas, segundo Plínio, pelo lado oriental, na parte que toca ao bispado de Bragança, era a mesma linha divisória do antigo território chamado Galiza, da província Tarraconense.
Também é necessário ler com muita atenção os geógrafos antigos, principalmente Estrabão, porque mostram certa confusão na adscrição das regiões a esta ou àquela província, quando é certo que essa confusão está apenas na época a que se referem e, conseguintemente, na divisão predominante ao tempo.
Depois, na terceira divisão acima mencionada, quando Galiza formou província sobre si, compreendeu, além do território já designado, mais as Astúrias, Leão e grande parte da Castela Velha, mas o conceito de povos galegos continuou a designar apenas os habitantes da região denominada Gallaecia na província Tarraconense, de que atrás demos as confrontações, segundo Argote, baseado nos textos dos escritores romanos.
Argote, que, para estabelecer a sua divisão, teve apenas como documentos Plínio, Ptolomeu e Estrabão, os quais, falando em geral, não descem a minudências, e não viu algum outro particular por onde pudesse individualizar mais as limitações, foi, ainda assim, duma certeza pasmosa na determinação do lado oriental, que, separando a chancelaria de Braga e Astorga, passava pelo actual bispado de Bragança, pois, colocando essa linha divisória nas montanhas «orientais a Chaves», vai de acordo com o que sabemos pela escritura especial de Astorga, atrás citada, que diz pertencer a Astorga quanto cabia ao oriente do rio Tuela até entrar no Douro, em Foz Tua, onze léguas abaixo de Freixo de Espada à Cinta, embora depois, esquecido do que, com tanto acerto, escrevera, enganado pelos fragmentos do concílio de Lugo, dissesse que Bergança ou Vergança sempre pertencera a Braga, o que não pode ser, como dos seus próprios escritos se evidencia.
As limitações que inculcam Florez e Sarmiento não contrariam, antes vão de acordo com a de Argote, e, como já dissemos, a divisão do território destinado às sés metropolitanas obedecia mais ou menos à divisão das chancelarias romanas. Ainda hoje o bispado de Astorga entesta com o de Bragança e de Orense, outrora sufragâneos do de Braga, a cuja chancelaria pertencia, se não todo, pelo menos grande parte do território de uma e de outra Sé na região onde nasce o rio Tuela.
Não deve causar estranheza dizer Argote que a linha oriental da Galiza, como região e não província, ia bater um pouco abaixo de Freixo de Espada à Cinta, e nós, baseados na escritura de Astorga, que nos permite precisar mais claramente a sua trajectória, colocarmos o ponto de contacto no Douro em Foz Tua, onde o Tuela ou Tua entra nesse rio, porque Argote seguiu neste ponto a Resende, e quem ler a obra deste verá que coloca pelas imediações de Freixo de Espada à Cinta os vetones, povos que certamente ocupavam grande extensão de terreno, ao qual ia bater a linha divisória entre os Gallaici Braecarii, galegos brácaros, e Astúria, segundo os escritores romanos; portanto, sendo ao território dos vetones que Argote se referiu, e não a um ponto determinado, fica claro que não quis indicar Freixo de Espada à Cinta precisamente, e por isso a escritura de Astorga não contraria, antes completa e individualiza a sua opinião.
Portanto, debaixo do domínio romano na península, a região bragançana pertenceu primeiro à província Ulterior, até ao ano 27 antes de Cristo; desde essa época até 330 fez parte da província Tarraconense e, desde este ano por diante, pertenceu à província de Gallicia.
Os povos que ficavam no território ao ocidente do rio Tuela, nome que depois muda em Tua até entrar no Douro, em Foz Tua, pertenciam à chancelaria de Braga, isto é, eram galegos brácaros todos os povos que hoje no bispado de Bragança ficam ao ocidente do rio Tuela, nos concelhos de Vinhais e Mirandela; e eram astures-augustanos todos os habitantes dos concelhos de Bragança, Vimioso, Miranda do Douro, Mogadouro, Alfândega da Fé, Moncorvo, Freixo de Espada à Cinta, com os que nos concelhos acima mencionados ficavam ao oriente de Tuela.
Como os concelhos de Chaves e Valpaços pertenciam na íntegra aos galegos brácaros, a estes cabia o território que neles tem a diocese de Bragança.

Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança

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