(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Foi um processo simples de aprendizagem, que sem método que enquadrasse disciplinas e as separasse como se de elementos estanques se tratasse.
Durante o dia trabalhávamos nas várias artes e ofícios que cada um de nós tinha como ganha-pão e ao fim do dia como um hábito, encontrávamo-nos nos cafés ou em qualquer outro sítio e havendo milhentos assuntos a conversa fazíamo-lo com a mesma atitude com que durante o dia cumpríamos com os deveres que nos tinham sido atribuídos.
Normalmente e dado o facto de haver sempre presente a suspeita de ouvidos "bufos" que por razões fúteis e caprichosas ideassem fazer acusações de factos em que uma simples frase fora do contexto pudesse conduzir a situação de embaraço à família ou no trabalho era em locais mais ou menos reservados que reuníamos! Quero deixar claro que nunca nenhum de nós foi incomodado por qualquer acusação ou denúncia e a razão foi a de que todo o corpo de Polícia nos conhecia como rapazes educados e cumpridores dos nossos deveres e isso bastou sempre para a nossa aceitação pelos mais velhos e sensatos de todas as condições sociais e fidelidades políticas.
É um facto que discutíamos todos os assuntos que a sociedade discutia e que eram invariavelmente analisados pela lógica esquerdista que se havia apoderado da simpatia das classes mais expostas à cobrança dos caprichos ou da rapina que, hoje, me parece, não ser mais honesta, antes muito menos, do que era a daquele tempo.
A literatura foi sempre o tópico dominante que sempre se sobrepôs aos outros e à volta do qual se faziam as argumentações a propósito, sendo que era notório o interesse mais evidente em alguns e menos noutros.
O Manuel Rodrigues era o moderador, e foi o principal impulsionador do gosto e do prazer que as páginas de O Germinal de Émile Zola ou as de Bel-Ami de Guy de Maupassant nos causaram e do que significaram para nós as explicações que de bom grado nos dava quando a dúvida sobre qualquer coisa complicada estava para além do nosso raciocínio ainda pouco habituado a ideias criptadas subliminarmente como as que eram intuídas nos livros de Alves Redol ou Soeiro Pereira Gomes.
Havia tempo para tudo, para a tertúlia do Augusto Verbo ou do Zé Machado, os bailes do Santo António no Castelo, com quartel general na tasca do Terrão onde uma vez abancou numa tarde, tocando acordeão e só se levantou no dia seguinte à noite, comendo, bebendo e tocando, até que o António Barril o foi buscar, levando-o para casa pois já nem força tinha para se levantar e mesmo assim ainda terminou com a música de Zeca Afonso, Venham mais cinco.
A palavra Gulbenkian servia para designar todas as implicações que a vinda de Calouste, o Senhor 5% trouxe consigo para Portugal. Arte, Refinamento Diplomático, Influência e Negócios, Dinheiro do Petróleo e a confiança ilimitada que este Mecenas dispensou a Salazar e ao Dr. Azeredo Perdigão. Foi como ganhar na Lotaria, tocou-nos a Sorte Grande e a elite da Nação sem se deslumbrar como aconteceu com as especiarias da India ou os quintos do Brasil, soube administrar bem e dar ao povo "mais pão , habitação, saúde, educação/liberdade de falar e decidir/. Tudo Isto através da Rede de Bibliotecas Ambulantes da Fundação Calouste Gulbenkian, que aceitou nos seus quadros os sonhadores deste país que espalharam a boa nova do conhecimento para todos e o distribuíram muito democraticamente! Ao Manuel da Gulbenkian bem assim como a todos os que o antecederam deixo uma palavra de agradecimento pelo muito que nos deram e ensinaram.
A Branquinho da Fonseca, Antonio Quadros e aos que lhe sucederam um muito Obrigado extensível ao Dr. Azeredo Perdigão e a Calouste Gulbenkian um arménio feito português.
Bragança 04/11/2018
A. O. dos Santos
(Bombadas)
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