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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 8 de julho de 2020

AS RESISTÊNCIAS À TRANSFORMAÇÃO E À EXPANSÃO URBANA DE BRAGANÇA

Na génese da Cidade nova valeram as transformações, às vezes pouco percetíveis, que se operaram e as resistências que se levantaram. Claro que, como frequentemente acontece, a densidade dos interesses de determinados grupos sociais e as questões de natureza económica, nomeadamente aquelas que tinham implicações imediatas na economia local, projetavam a pujança dos seus desígnios para além do tempo curto, deixando escorrer alguns dos seus postulados nas soluções de problemas novos que as mudanças estruturais determinavam.
Igreja de S. Vicente
Transformações e resistências que podem ser ilustradas pela petição apresentada e analisada na Câmara Municipal, em 17 de julho de 1878. Então, citadinos e rurais das várias povoações do Concelho, num total de 409 assinaturas, manifestavam a pretensão de transferir a “feira mensal do dia 3, estabelecida na Praça de São Vicente, para o Largo das Eiras do Colégio, por ser mais espaçoso para aquele fim”. Embora na semana seguinte se afixassem editais nos locais de estilo com a publicitação da mudança, vê-se como as funções económicas da praça teimavam em permanecer no núcleo mais antigo, no espaço delimitado pela Igreja de S. Vicente, pela cadeia civil e pelo edifício da Guarda Principal. Atente-se que em outubro de 1843 já a Câmara tinha determinado que matérias como a palha, fenos e lenha só pudessem vender-se no Largo do Tombeirinho e que as padeiras, as regateiras e as demais pessoas que desejassem vender “géneros” na praça, ocupassem as Eiras do Arcebispo, espaço também referenciado como Largo das Eiras ou Eiras do Colégio, especialmente nos dias de mercado, às quintas-feiras.
Em todo o caso, não podemos esquecer que, em 1829, a feira mensal, realizada no dia 21 de cada mês, já então ocorria na Praça do Colégio, atual Praça da Sé. Em dezembro deste ano, os vereadores, por acharem ser muito apertado o espaço da Praça e o “mercado muito incómodo para os que vendem, e para os que compram, e para os que passam de pé, e muito mais a cavalo, ou com carro”, determinaram a sua mudança para as Eiras do Colégio. Seria aqui, “nos sítios que a cada uma das ditas classes no mesmo dia da feira serão pela Câmara mandados indicar”, que se venderiam produtos como a sola, couros verdes, sal, fazendas “que se vendem em barracas”, e também chapéus e louças. Na Praça do Colégio só ficavam os ourives, “aonde costumam armar”, a hortaliça e a fruta. Já as sardinheiras e padeiras “que costumam vender no meio da Praça do Colégio” deviam mudar as suas bancas para junto da porta carral do Seminário de S. José, na Rua do Cabo, onde deviam respeitar as marcações e organização definidas pelos homens da Câmara Municipal. Nos editais que publicitavam tais mudanças também se podia ler que os que não cumprissem o novo normativo se sujeitavam à pena de 2 000 réis.
Vemos assim como, apesar da lentidão das transformações da malha urbana – olhamos, sobretudo, ao período que se inicia em meados do século XVIII – tanto a Praça da Sé como as Eiras do Arcebispo correspondem a novas centralidades. Era neste terreiro, onde também manobrava o regimento de Cavalaria, que se localizava o estaleiro da nova catedral, obra ambiciosa à vista das fundações subsistentes e dos desenhos encomendados ao arquiteto italiano Antonio Stopanni Romano, o mesmo que, após a expulsão dos jesuítas, seria chamado a ensinar matemática na Universidade de Coimbra que Pombal tinha reformado. Depois de D. Frei Aleixo de Miranda Henriques ter benzido o terreno, lançar-se-ia a primeira pedra em 21 de setembro de 1768.
Às necessidades do culto juntavam-se as preocupações do bispo com as solenidades do cerimonial que devia dar continuidade às aparatosas complexidades da lógica barroca de extração cortesã e a alguns dos pressupostos do poder desmedido. Tudo intenções bem legíveis na planta do templo e nos debuxos dos alçados com linhas e volumes grandiosos. Contudo, da pretensão de se encaixar a nova edificação nos terrenos da cerca que pertenceu à Companhia de Jesus, ainda que a fachada principal ficasse voltada para o Terreiro das Eiras, talvez viesse a resultar a impossibilidade da gestação de novos horizontes urbanísticos, apesar do bispo D. Aleixo de Miranda Henriques, na qualidade de personagem do círculo do marquês de Pombal, não poder ignorar a amplitude das disciplinadas projeções que se levavam a cabo na baixa de Lisboa. Apesar de tudo, a obra de Bragança parece não ter sido acompanhada por um pensamento ordenador que tivesse programado intervenções urbanísticas a partir das possibilidades que o adjacente e espaçoso Terreiro das Eiras do Arcebispo oferecia. Mesmo assim, a relação entre a praça, enquanto espaço público de referência, e os edifícios representativos dos poderes, continuava a dar sequência ao fio teórico mais característico do urbanismo ocidental.
Portanto, a velha urbe, longamente reticente a surtos rápidos de expansão, mostrava que tinha no seu âmago as soluções e os espaços para atender às necessidades religiosas e residenciais, às precisões do movimento comercial e a outras funções representativas da vida institucional. Posteriormente, alguns sucessos da revolução liberal, como os que permitiram a apropriação pública dos espaços monásticos, tiveram como consequência imediata, no que respeita a uma política de solos, o aumento das capacidades existentes, permitindo que o conceito de utilidade pública, institucional e associativa possibilitasse a recetividade de Bragança relativamente ao quadrante da modernidade. O ritmo complexo das múltiplas manifestações do quotidiano, a tendência para a generalização de novos conceitos, alguns, por exemplo, relacionados com os novos preceitos de higiene pública, ou os cruzamentos, nem sempre concordantes, das ambições individuais e coletivas, agiram sobre a Cidade, modelando-lhe a sua tessitura, propondo-lhe a observação de um corpo de leis, favorecendo a necessidade de laborar e assinalando certas datas com a festa religiosa e civil, enquanto se dava progressiva ênfase à manifestação do sentir político.
A cidadania ganhava protagonismo e os espaços públicos estavam-lhe associados.
Nesta medida, importa dar atenção à estabilização em sede própria de algumas instituições de recreio e mutualistas e ainda às de caráter público, até porque umas e outras procuram firmar-se fisicamente no interior do espaço traçado pela engenharia militar no século XVII.

Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa

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