Por entender que a lista do material linguístico recolhido pelo autor não está, como é normal que assim seja, definitivamente fechada, proponho-me trazer aqui, numa espécie de adenda ao mesmo, um conjunto de palavras e expressões genuinamente transmontanas, que não foram consideradas.
Porque a riqueza da nossa Língua reside precisamente na diversidade dos falares que ela comporta, achei que seria melhor ilustrar estes verdadeiros achados com uma “designação geográfica” mais precisa, para, assim, se fazer a “justiça” de atribuirmos “o seu a seu dono”.
Palavras e expressões de Vinhais:
Ex. - Onde é a casa do senhor João?”
- É ali, onde ó tanque.
2 – “Bota”, do verbo “botar”.
As duas expressões no mesmo contexto frásico:
Ex. Botas um copanho? Ou seja: queres beber um copo?
Ex. – Era/estava muita gente na festa?
Ex. – Bamos birar a Bragança?
- Bota lá!
Palavras e Expressões de Bragança:
1 – “Bem m´eu finto” e “ Bô fé l´eu ponho” são duas expressões tipicamente da Vila/Cidadela e do Bairro d´Além do Rio. A primeira, invariavelmente precedida de “bô”, tem o significado de “nessa não acredito eu”, e a segunda, quer dizer “não ligo nada a isso”.
Ex. – Amarras um copo?
Se a pergunta fosse dirigida ao meu vizinho e saudoso Senhor Cunha, da Vila, a resposta seria:
- Sinceramente, até dois!
Palavras e expressões de Vimioso e Miranda do Douro
Ex. – Sabias que os vizinhos da frente se separaram?!
- Bôjeira!
Ex. Tu saíste-me cá um lafrau! Ou seja, ….uma boa peça!
3 – “Fuínha”. Dicionarizada como “pequeno mamífero carnívoro, em Vimioso e Miranda do Douro tem o significado de “unhas de fome”, “forreta”.
Ex. Esse (a pessoa de quem se fala) é bô matcho! Ou seja, “bô matcho” quer dizer má pessoa, alguém que não presta.
Ex. Não vás na conversa do gajo, que ele é matchutcho.
6 - “Ácerta”. Significa “isso é verdade”, “não haja dúvida”.
7 – “ tir-te daí”. Quer dizer “sai da frente”, quando alguém está a estorvar.
8 – “ Estorbilho”, alguém que incomoda, que faz estorvo.
Ex. – Que jeito dava agora uma chuvinha, p´rás castanhas!
- Quem quer ó diz.
Ex. – Mãe, quando vamos às compras?
- Em comendo, filho. Ou seja, depois de comer.
No café:
Ex – Lurdes, come aqui uma torradinha comigo, antes de irmos trabalhar.
- Agradeço, mas já estou comida. A Lurdes quis dizer que tinha comido em casa, antes de sair.
Num contexto familiar, em que o filho não se portou nada bem, e o pai teve a coragem do desarmar com um firme e inegociável Não.
Ex. – Só por mor da teima, hoje não vais sair.
Ou numa situação imprevista:
Ex – Demorámos mais um bocadinho, por mor da chuva.
Palavras e expressões muito comuns em todo o nordeste transmontano.
Ex.- Num biste o Zé?
- Olha que já estou aqui há mais duma hora, e não o bi.
O mesmo vale para a transmontaníssima expressão “ bou-me a comer”, “bou-me a tomar banho”, “bou - me a trabalhar”…….., correspondentes, no país vizinho, ao “ me voy a comer”, “me voy a duchar” e “ me voy a trabajar”.
Ex. Olha que o vinho não está nada mau! Quer dizer, está bom.
Ou:
Ex. O Mário não é mau rapaz. Ou seja, é bom rapaz, boa pessoa.
Para terminar, uma nota que devemos reter: a Língua não é feita pelos gramáticos, nem pelos lexicólogos, mas pelos falantes. Aos primeiros apenas compete registar os fenómenos linguísticos. Ou seja, na oralidade (que é disso que estamos a falar) é incorrecto dizer que, por exemplo, em Lisboa se fala melhor do que em Mirandela, ou que em Coimbra se fala melhor do que na Madeira. Na oralidade – principalmente quando se trata destes “tesouros” de valor incalculável - há uma espécie de “mercado livre”, saudavelmente “desregulado”, em que não existem agramaticalidades.
António Pires
Liceu Nacional de Bragança, FLUP, DRAPN.
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