(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Uma coisa que me vem surpreendendo, numas terras com tanto, é a promoção do desconhecimento ou, noutra perspectiva, a promoção do «conhecimento de algibeira». Quem escreve isto é um «perfeito nabo» em muitas áreas. Assim, de repente, se tiverem uma avaria num carro, deverei ser a última pessoa para a qual deverão ligar, porque não sei distinguir uma «correia da distribuição» de uma «correia do alternador». O mesmo se aplica a outras áreas… A arquitectura, por exemplo, ou qualquer ramo da engenharia, porque caso projectasse uma casa, a mesma ruiria no próprio dia. Todos deveríamos ter a humildade para reconhecer aquilo em que somos uns «perfeitos nabos». Mas não vim aqui para falar de engenharia mecânica ou engenharia civil…
Quase todos já deverão ter ouvido falar de Zelas ou, erradas versões, de Zoelas, corrupção a partir da forma latina «Zoelae». A sensação com que fico, e poderei, naturalmente, estar equivocado, quando ouço ou vejo menções aos Zelas, é que não passam de uma curiosidade distante, como se tivessem sido uma «coisa sem importância». Na minha humilde perspectiva, porém, têm «toda a importância». Porque foi o povo que, há cerca de 2000 anos, habitou por terras nordestinas (não todas...). Um povo do qual teremos herdado muitos dos genes que carregamos. E não eram Lusitanos… Eram Ástures. Ocupando um vasto espaço que, grosso modo, iria desde os contrafortes da serra de Bornes até à Sanabria, desde o rio Tuela até às terras de Aliste e de Zamora. Embora pareça que, de actuais os tempos, alguns os queiram fazer exclusivos de determinadas zonas… Para lá dos genes, deixaram-nos muitos outros vestígios. Vestígios esses que, clara e inequivocamente, os diferenciavam. São bastantes, e seria enfadonho estar aqui a elencá-los a todos.
Um deles, que sempre exerceu um fascínio especial sobre este que escrevinha, manifesta-se pelo seu quase carácter monoteísta, coisa rara nos povos pré-romanos, dados que eram a venerar muitos deuses. Um povo que prestava culto a um deus designado como «Aernus», conforme inscrições encontradas em Castro de Avelãs e na «minha» Malta, sede da mais antiga Comenda Hospitalária do distrito. Segundo eminentes estudiosos da questão, o nome desse deus adorado pelos «nossos avós Zelas», significaria «estrela da manhã». Seria penoso estar aqui a explicar porquê… Significará isto que os nossos antepassados tinham um culto especial pelos astros, algo também visível na sua própria designação. Essa adoração pelos astros é corroborada pelas diversas inscrições funerárias, onde constam gravadas imagens de estrelas ou da lua. Ou até de «rodas de raios curvos», nalguns casos identificadas como «raios solares», não havendo consenso em relação à sua interpretação.
Estelas funerárias nas quais também constam representações zoomórficas, ou seja, de animais. Especialmente berrões ou cervídeos. Estão a ver, berrões… «Porca de Murça», «Porca de Bragança» (a que está no pelourinho), «Berrão do Adro», em Parada… E outras mais, e até temos uma «Vale da Porca», em Macedo, e um «Vale do Porco», em Mogadouro, que coincidências não são. O que não falta por esse Portugal fora, segundo alguns visionários «lusitanistas», são estátuas de «berrões»… Ou inscrições dedicadas ao tal de deus «Aernus»… Ou tantas outras coisas mais nas quais os Zelas eram diferentes. Mas adiante…
Até temos dois povoados Zelas classificados como Monumentos Nacionais (Aldeia Nova – Miranda, e Sacóias – Bragança) e outro par deles como Sítios de Interesse Público (Vilarinho dos Galegos – Mogadouro e Terronha de Pinhovelo – Macedo). Muitos outros havendo, aqui destacando a «Torre Velha», em Castro de Avelãs. E de que adianta ter Monumentos Nacionais ou Sítios de Interesse Público se proveito nenhum é retirado?…
Ai se os Zelas regressassem… Com o seu culto ao sol, à lua, aos astros… E a escolha da data do Natal, que muito tem a ver com isso… Essa questão fica para depois…
Rui Rendeiro Sousa – Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer.
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas.
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana.
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros.
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.
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