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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

D. Fernando I, segundo duque de Bragança, por Ernesto Rodrigues (40 anos de vida literária)

D. Fernando I, segundo duque de Bragança
Fora a carta de foro dada no arraial de Ceuta, em 20 de Fevereiro de 1464, era de Cristo; Pero de Alcáçova, que a escrevera, entregou cópia a um parente meu, Afonso Roiz, ou Rodrigues, e, a rogo do duque, recado para vir mostrá-la em pessoa, obrando aquela fala breve.
A história dirá quem era esse Afonso Rodrigues, e antepassados. Quem sou eu, do mesmo nome, cujos últimos dias talvez venham escondidos num fio da sua meada.
Foi há 550 anos; não imaginava que, na indefinição de criança em calções, sandálias lestas, o passado viria acariciar-me, exigindo este discurso.

Saudava, agradecido, D. Fernando I, segundo duque de Bragança, na estátua de bronze, sobre três blocos rectangulares de granito em assento leve, rodeada de folhame. Em cota leve, flectia ligeiramente a perna direita, espada embainhada e oblíqua, fincada, rígida, à esquerda, com determinação; e, entreaberta na mão direita, a carta foraleira, que oferecia, confiado, à cidade. Miudamente, observava as cotoveleiras, joelheiras, o cabelo grisalho caindo sobre as orelhas, e franjado na testa, com duas rugas verticais, fundas. A comissura dos lábios era grave. O neto de D. João I, rei ínclito que renovara o castelo – filho do primogénito D. Afonso, primeiro duque de Bragança −, mostrava-se firme, teso como a dignidade.
Eu assistira à inauguração, em 1964, ganapo ainda, enroscado nos pilares de ferro em que assentava um dos cinco candeeiros. Tinha oito anos, nada sabia de nós. Lembro-me da formatura de senhores, que escureciam o dia, e, talvez por isso, menina vestida de branco, um loiro anelado, da minha idade, sobressaía na manhã fresca, oferecendo salva de prata.
Agora, vinha aqui todos os dias, a casa dos avós, cada vez mais tristes, por mim, sentia. Antes, repousava no rectângulo de pedra frente à estátua, que dois bancos em voo semicircular enquadravam. Alternava verde; à direita, a pousada de São Bartolomeu, onde sonhava descansar, um dia; em fundo, o ronronar do Rio Fervença, sucedendo galos, cães, poalha de vozes… Nas tardes de sol, árvores e duque estampavam-se na tela muralhada.
Ao tempo, D. Fernando I e eu ouvíramos outros discursos embalados em patriotismo – civis, militares, religiosos; exaltados telegramas de cumprimentos e saudações, martelados de stop, à imagem de um país sem iniciativa.

A Casa de Bragança, Lisboa, Âncora Editora, 2013.

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