Por uma causa, tenacidade
Simultaneamente, encerravam-se todas as contradições e impasses relacionados com a instalação de outras comunidades religiosas em Vinhais. De facto, já em 1717, quando dois missionários trinos do seminário de Sagun pregavam a missão na região transmontana, se tinham registado tentativas de fundar uma casa em Vinhais para albergar padres desta comunidade castelhana. Nesta altura, a iniciativa de tal fundação devia ter pertencido a António de Morais Ferreira, pai de José de Morais Sarmento, uma vez que quando Frei João Velasquez chegou a Lisboa, na Quaresma de 1718, era dele a carta que levava para o segundo, recomendando-lhe toda a ajuda que pudesse à causa. Contudo, as diligências efetuadas na corte não foram suficientes para vencer a animosidade da comunidade do Varatojo, representada por Frei Gaspar da Encarnação, cujos argumentos influenciaram a decisão de D. João V de não caucionar a instalação dos padres castelhanos na vila transmontana.
Em 1723, Após constatar que não existia maneira de inverter os entraves à criação do hospício em Vinhais, José de Morais Sarmento recolher-se-ia à vila.
Diga-se que a estratégia dos frades trinos vinha sendo desenhada desde 1714 e tinha em Frei Álvaro da Apresentação um aríete. Por isso a aproximação à mitra da Sé de Miranda do Douro só se entende no quadro da criação de condições propícias à criação no bispado de hospícios para os frades Descalços da Santíssima Trindade. Ao prestígio intelectual, Frei Álvaro da Apresentação – lente de Sagrada Teologia na universidade de Salamanca – acrescentava a circunstância de ser natural de Chaves, o facto de ser sobrinho da madre abadessa das freiras beneditinas de Bragança e a autoridade de quem, com alguma frequência, subia aos púlpitos de Bragança e de Chaves.
Assim se explica que este eclesiástico tenha conseguido fundar os hospícios de Miranda do Douro e de Mirandela.
Em 1724, Frei Álvaro da Apresentação, quando pregava a Quaresma em Vinhais, percebendo os anseios dos locais, apressou a proposta da fundação de um mosteiro. Porém, conhecida a notícia, os franciscanos de Bragança saíram a terreiro, esgrimindo a falta das competentes autorizações fundacionais, para mostrarem ao bispo e ao rei o seu descontentamento. De imediato o monarca passou ordem ao corregedor para mandar demolir os hospícios de Mirandela e de Miranda do Douro e fazer recolher a Espanha os religiosos. A gravidade do caso levou o geral dos trinos descalços a enviar a Lisboa um seu representante, Frei Cristóvão, onde alcançou a revogação da ordem anterior. Na sequência deste lance, Frei Álvaro foi mandado recolher.
Contudo, oferecia-se uma nova oportunidade para a concretização dos intentos de alguns notáveis de Vinhais. Daí que José de Morais Sarmento, em nova petição apresentada a D. João V, afirmasse a pretensão de se poder erigir hum hospício de missionários reformados que, de acordo com as palavras de Frei Cláudio da Conceição, não continha quaisquer indicações que deixassem ver a predileção por esta ou por aquela ordem. Escutado o apelo, foi concedida a mercê e, em 1740, foi passado o competente alvará. Mas a José de Morais Sarmento estava ainda reservado o vaso do desconsolo à medida que ia sendo confrontado com a indisponibilidade de sucessivos institutos, como os Carmelitas Descalços, os Capuchos, os padres do Seminário do Varatojo e até dos franciscanos de Brancanes, para virem para Vinhais.
Em anexo transcrevemos uma passagem da “Cónica de Brancanes” em que se destaca a pretensão de José de Morais Sarmento e a sua persistência de décadas na fundação do convento e seminário. Será, pois, nesta perspetiva que se deve entender a calorosa e concorrida manifestação que se organizou para uma das entradas dos missionários em Vinhais, em 1744, e a prontidão com que este fidalgo, um interlocutor atento e privilegiado, fez chegar a informação à casa de Setúbal. Mas nem a capacidade de persuasão nem a oferta dos cabedais para se fazer a obra nem a garantia de assegurar “huma suficiente congrua” ao seminário determinavam o guardião de Brancanes a aceitar ou a formalizar a recusa definitiva. Mais tarde, esta prolongada ambiguidade levaria o cronista a lamentar que desse Deus as nozes a quem não tem dentes.
Por isso, seria necessário acionar outros canais que pudessem levar a Roma a insistência de José de Morais Sarmento e o apoio do bispo. Em 20 de fevereiro de 1753, Benedito XIV mandava passar o Breve Ecclesiae Regimini, diploma que não só consentia na criação de um convento mas ainda determinava que fosse de missionários franciscanos. Por proposta do geral da família seráfica a matéria seria submetida à análise da comunidade de Brancanes, votando-se pela fundação e elegendo-se os padres fundadores, ato em que se contaram “mais votos (a favor de) frei António de Nossa Senhora das Neves”.
O epílogo de um processo longo e obtuso ou a resposta consequente ao auto de medição e de visita executado nos últimos dias de outubro de 1751, por incumbência do bispo de Miranda do Douro, D. Frei João da Cruz, que teve como protagonistas maiores o reverendo Francisco de Morais Sarmento, abade de S. Facundo e protonotário apostólico, e o padre João Afonso Roxo, cura de Vinhais. Assim se reconheceu o sítio onde se daria início à edificação do seminário para os missionários apostólicos, os mesmos que muito se empenharam na criação da Venerável Ordem Terceira da Penitência de Vinhais.
continua...
Luís Alexandre Rodrigues
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