Praça do Mercado de Bragança |
Na mesma altura, a Câmara recorreu ao antístite, D. José Martens, animando-o a usar o seu poder persuasivo em matérias temporais e a influência junto do irmão. Estava em jogo a linha férrea entre Mirandela e Bragança e a pretensão de se obter celeridade na decisão que permitiria a concretização desta artéria tão almejada e há tanto tempo encarada como o elemento essencial para a vitalidade da agricultura, do comércio e da indústria de todo o Distrito bragançano. Estas perspetivas iam influenciando o redimensionamento de algumas áreas da Cidade, integrando-as no tecido urbano, e dando o mote que tornava pertinentes novos melhoramentos, entre os quais se contavam a construção de uma capela no cemitério público, cujos portões tinham sido encomendados no Porto e, especialmente, uma praça fechada, onde a fartura de todos os géneros alimentícios, incluindo a carne e o peixe, dariam um assinalado contributo à dinâmica de fomento que, romanticamente, andava nas bocas dos que detinham alguma forma de mando na Cidade e seu alfoz. Um dos muros de vedação do novo cemitério assentava em parte da antiga barreira que confinava, a norte, com a cerca das freiras claras, o despejado espaço onde se concentravam as atenções para a obra da nova praça comercial.
Por sua vez, a conceção da construção do novo mercado obrigaria imediatamente ao desenvolvimento de outros trabalhos, como a canalização da água, a partir da Praça da Sé, ou a melhoria das possibilidades de circulação. Neste particular, previa-se a expropriação de uma casa sita nesta Praça, pertencente a Manuel de Sá Pilão, para se demolir, de modo a possibilitar o rasgamento de uma nova artéria que facilitaria o contacto entre esta praça pública e a nova obra que se levantaria na cerca das Clarissas.
O valor que a área conventual representava para a transformação e modernização da Cidade obrigava a manter altos os níveis de atenção, conhecidos que eram os interesses de alguns endinheirados. Por isso, em 10 de maio de 1882, o Presidente da Câmara, Tomás de Sá, avançou com a proposta de se endereçar uma representação à Câmara dos Deputados, “pedindo que seja retirado da Praça por se achar denunciado para venda o Convento e cerca das extintas freiras Claras desta Cidade, por se esperar que seja concedido a esta Câmara para melhoramentos – praça mercado”.
Arrematada a empreitada da nova praça comercial pelo bacharel Eugénio de Castro e por João Pereira Charula, iniciaram-se as obras que lançaram mão “principalmente (da) alvenaria e cantaria” que se tiravam do convento. Recorde-se a existência no sítio da obra de “uma alameda de grandes negrilhos e nela duas capelas, uma de Santa Ana e outra de Nossa Senhora do Bom Sucesso”, já profanadas e que foram destruídas. Mas não tardaria a sua suspensão à ordem de um despacho do tribunal administrativo, de 4 de dezembro de 1886, que atendeu a um recurso interposto pelo secretário-geral do Distrito. Os impactos das diferenças políticas não geravam consensos a respeito deste empreendimento. A ampliação e a distorção dos factos chegaram ao ponto de gerar em alguma opinião pública a crença infundada no derrube da Igreja de Santa Clara para se afeiçoar o terreno para a praça. Por isso, em abril daquele ano, já a população se tinha amotinado, entrado no estaleiro da obra, “despedaçando e inutilizando quantos materiais aí encontrou”.
Os obstáculos políticos enredavam o processo nos fios judiciais e nos vagares burocráticos, e a obra continuava parada. Por isso, em novembro de 1891, os arrematantes apresentaram ao Município duas soluções possíveis para o impasse. Uma hipótese considerava a conclusão da obra “mediante indemnização pelos prejuízos causados pela ação do tempo”, enquanto a outra possibilidade consistia “na rescisão do contrato mediante o pagamento aos suplicantes do capital despendido nas obras feitas e mais o juro consignado” numa das cláusulas contratuais. Francisco Avelino Ferreira, como Presidente da Câmara, convidaria os interessados a estudarem todas as possibilidades e a apresentarem os respetivos valores monetários “para depois se resolver como for conveniente aos interesses municipais”. Desconhecemos o que aconteceu em seguida. Mas, na sessão realizada em 16 de fevereiro de 1893, a Câmara, acolhendo a proposta do seu vice-Presidente, deliberou “que se não continue com a obra da praça-mercado desta Cidade porque o plano e projeto atual daquela construção não convém ao Município, que contra ele se tem manifestado a opinião pública autorizando a Presidência desta Câmara a requerer a notificação judicial dos empreiteiros, sem que contudo por este facto se reconheça a legalidade das obras feitas”.
Entretanto, os empreiteiros, acusando a Câmara de ter faltado sucessivamente ao cumprimento do contrato, tinham instaurado um processo judicial contra a autarquia por entenderem que tinham direito ao “pagamento de juro de 3,5% sobre o valor total da arrematação desde que as obras tiveram princípio até hoje”. Assim se perpetuou a inatividade do estaleiro que ciclicamente fornecia o pretexto para as divergências entre as principais forças políticas.
O tema iria transitar para o século XX e ganhar nova acuidade quando a vereação regeneradora, em 1901, iniciou a construção da praça-mercado na Praça Camões, a qual veio a concluir-se em 1905-1906. As querelas entre progressistas e regeneradores prosseguiram durante esta década, mas foram particularmente acesas em 1904, tendo a discussão sobre as obras da Praça Camões transitado para o campo financeiro, uma área em que a Câmara sofria de enormes dificuldades, pois a sua receita ordinária anual era somente de catorze contos. Para se minorarem as dificuldades e efetuarem alguns pagamentos a credores, alienaram-se o baldio do Campo Redondo e a tapada do Plantório.
Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa
Gostei de ler , tentei penetrar nesse universo de frenesias e confusoes , mas pronto era ainda a monarquia ,,!
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