Advertência
Não desejando pôr os Leitores a especular sobre que diabo quererá dizer este título — “Viagens na terra das contas” —, fica desde já assente que se trata de uma espécie de pastiche inocente de um conhecido título de Garrett. Uma brincadeira, digamos assim. Quanto à palavra ‘contas’, é o nome que o povo trasmontano dá às histórias e historietas que eram contadas e recontadas, geralmente nos serões à lareira — o cenário que mais lhes convinha.
Por outro lado, para evitar que algum Leitor mais exigente se sinta frustrado nas suas expectativas, que porventura tenha colocado demasiado alto, impõe-se uma chamada de atenção para a modéstia deste trabalho. Quero com a palavra ‘modéstia’ — não encontrei outra melhor — significar muito simplesmente que não se trata de um ensaio científico. Não é que o tema não merecesse um estudo profundo. Merecia. Simplesmente, esse estudo teria de ser feito por quem de direito, e não por mim, porque seria um voo desproporcionado à pequenez e fragilidade das minhas asas.
O que temos então aqui? Pouco mais do que um simples alinhamento de contas, quase todas de fundo humorístico, que, ao longo das minhas oito décadas de vida, ouvi contar ou li, e com as quais muito me ri — e continuo a rir de cada vez que volto a elas. Algumas dessas historietas nordestinas foram já publicadas por mim em obra de livro ou em crónicas jornalísticas e são agora republicadas de um modo geral ipsis verbis ou com alterações mínimas que o tempo se encarregou de recomendar.
Outras fui buscá-las em trabalhos de outrem, e essas são apresentadas tal qual vieram a lume, por respeito aos seus recolectores-divulgadores. A messe mais fecunda em que meti a seitoura são os volumes IX e X das célebres Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, de Francisco Manuel Alves, conhecido urbi et orbi por Abade de Baçal. É uma obra espantosa a que o Autor dá o sugestivo subtítulo de “Repositório amplo de notícias corográficas, hidro-orográficas, geológicas, mineralógicas, hidrológicas, biobibliográficas, heráldicas, etimológicas, industriais e estatísticas interessantes tanto à história profana como eclesiástica do distrito de Bragança”. Perde-se o fôlego ao dizê-lo. Mas, ao mesmo tempo, fica-se com a garantia de que o bom e erudito Abade não deixou por explorar, a bem dizer, disciplina nenhuma da actividade humana. A literatura de tradição oral foi uma das frentes em que mais batalhou. Não admira: há quase sempre nela uma implícita intenção de divertir que muito devia agradar ao homem divertido que foi o Abade de Baçal.
Ao mesmo tempo que transcrevi um razoável número de contas, fui-as salpicando de comentários de curto alcance para disfarçar a indigência teórica. E é nisto que consiste o livro: umas dúzias de páginas ao desenfado, cuja principal intenção é divertir. Se for um pouco além de divertir, tanto melhor. Mas nada de tiradas hermenêuticas mais ou menos judiciosas sobre o modo como o povo nordestino ri e porque ri e de que coisas ri. Não quis ir ultra crepidam, além da chinela, como dizem que foi o atrevido sapateiro da anedota. Acho que fiz bem.
Não desejando pôr os Leitores a especular sobre que diabo quererá dizer este título — “Viagens na terra das contas” —, fica desde já assente que se trata de uma espécie de pastiche inocente de um conhecido título de Garrett. Uma brincadeira, digamos assim. Quanto à palavra ‘contas’, é o nome que o povo trasmontano dá às histórias e historietas que eram contadas e recontadas, geralmente nos serões à lareira — o cenário que mais lhes convinha.
Por outro lado, para evitar que algum Leitor mais exigente se sinta frustrado nas suas expectativas, que porventura tenha colocado demasiado alto, impõe-se uma chamada de atenção para a modéstia deste trabalho. Quero com a palavra ‘modéstia’ — não encontrei outra melhor — significar muito simplesmente que não se trata de um ensaio científico. Não é que o tema não merecesse um estudo profundo. Merecia. Simplesmente, esse estudo teria de ser feito por quem de direito, e não por mim, porque seria um voo desproporcionado à pequenez e fragilidade das minhas asas.
O que temos então aqui? Pouco mais do que um simples alinhamento de contas, quase todas de fundo humorístico, que, ao longo das minhas oito décadas de vida, ouvi contar ou li, e com as quais muito me ri — e continuo a rir de cada vez que volto a elas. Algumas dessas historietas nordestinas foram já publicadas por mim em obra de livro ou em crónicas jornalísticas e são agora republicadas de um modo geral ipsis verbis ou com alterações mínimas que o tempo se encarregou de recomendar.
Outras fui buscá-las em trabalhos de outrem, e essas são apresentadas tal qual vieram a lume, por respeito aos seus recolectores-divulgadores. A messe mais fecunda em que meti a seitoura são os volumes IX e X das célebres Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, de Francisco Manuel Alves, conhecido urbi et orbi por Abade de Baçal. É uma obra espantosa a que o Autor dá o sugestivo subtítulo de “Repositório amplo de notícias corográficas, hidro-orográficas, geológicas, mineralógicas, hidrológicas, biobibliográficas, heráldicas, etimológicas, industriais e estatísticas interessantes tanto à história profana como eclesiástica do distrito de Bragança”. Perde-se o fôlego ao dizê-lo. Mas, ao mesmo tempo, fica-se com a garantia de que o bom e erudito Abade não deixou por explorar, a bem dizer, disciplina nenhuma da actividade humana. A literatura de tradição oral foi uma das frentes em que mais batalhou. Não admira: há quase sempre nela uma implícita intenção de divertir que muito devia agradar ao homem divertido que foi o Abade de Baçal.
Ao mesmo tempo que transcrevi um razoável número de contas, fui-as salpicando de comentários de curto alcance para disfarçar a indigência teórica. E é nisto que consiste o livro: umas dúzias de páginas ao desenfado, cuja principal intenção é divertir. Se for um pouco além de divertir, tanto melhor. Mas nada de tiradas hermenêuticas mais ou menos judiciosas sobre o modo como o povo nordestino ri e porque ri e de que coisas ri. Não quis ir ultra crepidam, além da chinela, como dizem que foi o atrevido sapateiro da anedota. Acho que fiz bem.
(Continua.)
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