quarta-feira, 17 de junho de 2015

A reforma administrativa concelhia (1836) e a criação do Distrito de Bragança (Séculos XVIII-XX)

1. PLANO DE REORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA DA PROVÍNCIA DE TRÁS-OS-MONTES NOS FINAIS DO SÉCULO XVIII
 A reforma da administração e divisão territorial – designadamente a dos concelhos – é uma matéria que ganha a maior actualidade na 2.ª metade do século XVIII, em correlação com o movimento do Iluminismo que vai associado a um processo de revisão das doutrinas e instituições tradicionais e entre elas as administrativas, com vista a criar uma ordem social e institucional «racionalizada» que concorra para o bem estar, boa administração e a felicidade pública.
Nesse plano se devem entender as medidas pombalinas (1750-1777) dirigidas à reforma da administração em geral e à concelhia em particular. Mais activamente nesta reforma se envolverá D. Maria I na continuidade do programa e medidas pombalinas, quando na conjuntura europeia pós- Revolução francesa de 1789 se tornam inadiáveis as reformas sociais e do regime senhorial que vão ao encontro das doutrinas, movimentos e aspirações reformistas e revolucionárias.

Eram também por então muito críticas as opiniões e posições das classes ilustradas portuguesas e com elas muitas magistraturas territoriais e ilustração local relativamente aos poderes, competências e actuação destas instituições locais, fazendo-se muitas vezes eco das queixas das populações administradas.
Em Trás-os-Montes ergueram a sua voz contra a administração despótica e abusiva dos concelhos muitos magistrados territoriais, pedindo e propondo reformas, e entre eles, e à cabeça, como líderes deste movimento regional e também nacional, os corregedores José António de Sá e Columbano Pinto Ribeiro de Castro, o juiz de fora de Chaves, Medeiros Velho, entre outros.
Pelas leis de 1790-92 mandará D. Maria I proceder aos estudos e levantamentos estatísticos que propusessem a reforma da administração territorial e uma nova demarcação das comarcas, despachando para as diferentes províncias juízes demarcantes com tais tarefas. Era objectivo fundamental a uniformização da justiça régia e da administração e divisão do território. Tal realizar-se-ia abolindo as jurisdições particulares – as ouvidorias e as isenções de correição régia – e uniformizando os concelhos e as suas justiças, submetendo todos os concelhos às justiças de juízes letrados, com juízes de fora próprios ou a eles associados. Tal obrigaria e levaria à reorganização das comarcas, com a extinção das ouvidorias e à reorganização dos concelhos – com extinção de concelhos – para a todos colocar sob a presidência de juízes de fora. A união jurisdicional dos concelhos, apresentava-se como solução possível, de recurso.
Um conjunto de critérios foram então postos no terreno para proceder à reforma das comarcas e concelhos para os tornar mais «racionais» e equilibrados, com base nos quais se propuseram as reformas, a saber: a distância; a extensão; a centralidade das capitais administrativas que conferissem a dimensão e distância geográfica mais adequada ao concelho e comarca e permitisse o exercício em tempo da administração; a mais fácil acessibilidade de todas as partes; a população e os recursos económicos que permitissem sustentar a administração de modo que o custo do seu exercício se não tornasse danoso.
A descontinuidade e os encravamentos das unidades administrativas eram abolidas. Todos os concelhos seriam governados por justiças letradas.
Coube em Trás-os-Montes tal tarefa a Columbano Pinto Ribeiro de Castro, magistrado natural do Porto, que antes exercera as funções de juiz de fora em Mogadouro e Moncorvo (1776-1781) e de provedor em Moncorvo, desde 1786 [181]. O resultado dos trabalhos consubstanciou-se na proposta da criação de uma nova comarca, a comarca de Chaves, agregando grande parte dos concelhos da parte ocidental da Província que integravam a comarca de Bragança. As outras ouvidorias seriam transformadas em comarcas e os ouvidores substituídos por corregedores. Dos 81 concelhos propunha-se a extinção de 50. O resultado era uma administração mais equilibrada nos termos que a tabela seguinte ilustra:

A nova comarca de Chaves integraria seis concelhos, a saber, o de Chaves, Água Revés, Monforte, Montalegre, Ruivães e Vila Pouca, retirados das comarcas de Bragança, Moncorvo e Guimarães. Todos estes concelhos ficavam, agora, a uma distância mais próxima e racional da nova cabeça da comarca, Chaves, do que o que se verificava no modelo antigo. Os concelhos que integram a nova proposta de comarca são eles também, o resultado de uma reorganização da carta concelhia.
A observação deste programa de reordenamento administrativo e territorial relativo à área da comarca de Chaves (a criar) mostra bem a aplicação dos princípios que sustentavam a reforma: os concelhos ficam mais próximos da cabeça de comarca; as freguesias mais próximas das sedes dos concelhos; estes ficam mais proporcionados territorialmente e reforçados em população, termo (freguesias) e recursos; a administração e justiça ficam entregues a magistrados letrados e como se pretendia, em princípio, as populações administradas ficam mais protegidas contra as incompetências e abusos das antigas justiças leigas e ordinárias.
Compreende-se o grande alcance e significado desta proposta de reforma territorial e administrativa.
Aliás todo o País, Província a Província, foi objecto de levantamento estatísticos e propostas de reforma de idêntico sentido e alcance. Com ela era o velho regime e organização senhorial, o poder e as jurisdições políticas dos donatários particulares (laicos e eclesiásticos) que eram extorquidos de importantes poderes e jurisdições. Nalguns casos dava-se continuidade a reformas vindas do pombalismo – mas também do reinado de D. João V –, regularizavam-se situações de facto pela anexação e extinção de jurisdições concelhias que já assim se encontravam anexadas ou extintas.
Contra esta proposta revolucionária de reforma e sobretudo de extinção de concelhos levantou-se, naturalmente, a oposição de muitos donatários, mas também das elites e poderosos locais ligados aos cargos de governação que iam ser extintos e até das próprias comunidades locais a que o concelho dava certa personalidade e autonomia. Por estas e outras razões advenientes da conjuntura política de finais do século, este programa de reformas propostas pelos juízes demarcantes não foi avante.
As vicissitudes sociais, económicas e sobretudo políticas por que irá passar a Monarquia Portuguesa nos finais do século XVIII e princípios do século XIX em grande parte desencadeadas pela fermentação da Revolução Francesa de 1789 e o envolvimento de Portugal na guerra provocada pelo expansionismo revolucionário francês, obrigaram a suster esta reforma estrutural da administração territorial portuguesa, embora alguns aspectos tivessem sido implementados, como foi a extinção das ouvidorias.
Mas não se promoveu então a reforma territorial dos concelhos. O envolvimento de Portugal nas guerras internacionais, e suas consequências directas e indirectas sobre a sociedade e a política portuguesa, obrigaram a concentrar todos os recursos e energias no plano de defesa e manutenção da independência nacional, ameaçada em diversos momentos: pelas primeiras invasões do território em 1801 pelas tropas francesas e espanholas, depois pelas 3 invasões francesas de 1807 a 1810.  Estas últimas a obrigar a Coroa e a Corte portuguesas a embarcar para o Brasil e a comprometer decisivamente qualquer programa de reforma.
As preocupações de realização de receitas para a Guerra, de fidelização das elites e das classes populares em torno da Monarquia perante as ameaças revolucionárias e conquistadores sobre Portugal ocuparia então o primeiro plano das preocupações políticas.
A reforma da administração territorial só voltará a ser objecto de preocupação política pelo regimesaído da Revolução Liberal de 1820, ainda que só com o 2.º Liberalismo pós-1832 é que se realiza a grande reforma da administração municipal e a criação da nova administração distrital portuguesa.

in:repositorium.sdum.uminho.pt

1 comentário:

  1. Que me sabe dizer sobre o governo de António ias de Oliveira
    carlossousamarques@sapo.pt

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