Execução de Trabalhos de Escavação |
Com efeito, tanto alguns dos vestígios aqui identificados, sobretudo de natureza epigráfica, como aqueles revelados pelas escavações realizadas, em finais do séc. XIX, sob direção de José Henriques Pinheiro, têm permitido a vários investigadores interpretar o local como possível capital dos Zoelas (ou Zelas), ou seja, como sede da civitas Zoelarum (circunscrição administrativa em época romana).
Os Zoelas, mencionados por Plínio (autor romano, do séc. I) a propósito do seu linho de excecional qualidade que terá chegado a Itália, eram um povo ou etnia de origem pré-romana, localizável no Nordeste Transmontano e integrável no grupo dos Ástures Augustanos, de acordo com as fontes epigráficas e literárias antigas. Este povo estenderia o seu território por uma vasta região, prolongando-se até às serranias
atualmente espanholas, a norte, e avistando o vale do Douro e do Sabor, mais para sul.
Escavação do Espaço Funerário |
Foi precisamente a importância atribuída a este lugar que justificou a intervenção arqueológica que decorreu ao longo de todo o verão de 2012, na qual participaram cerca de 40 alunos da licenciatura e do mestrado em Arqueologia da Universidade de Coimbra. Para a elaboração e concretização desse projeto de investigação, a Autarquia de Bragança e a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra estabeleceram uma parceria (que enquadrará também os trabalhos a desenvolver no decurso do corrente ano – 2013), conscientes que estão da importância que os elementos fornecidos pela Arqueologia têm quer para a afirmação de identidades, quer para a construção do conhecimento da História local e regional.
Mas para que os trabalhos de escavação arqueológica prossigam, será igualmente
importante que possamos continuar a contar com a colaboração e a necessária autorização dos proprietários dos terrenos.
Fruto dos trabalhos agora desenvolvidos, este lugar emblemático da arqueologia transmontana começou a revelar mais algumas das suas características.
Trabalhos de Desenho das Estruturas Idebtificadas |
Seja como for, os resultados até agora obtidos, quer durante o trabalho de campo, quer no decurso do trabalho laboratorial que se lhe seguiu, mostram que este lugar, no passado, ocupou vários hectares e foi habitado pelo menos durante cerca de mil anos. Com efeito, para além de se ter registado uma importante ocupação romana (séc. I-V d.C.), e de ser inclusivamente possível o registo de uma ocupação anterior, pré-romana (inscrita na proto-história), este lugar revelou importantes vestígios do período suevo-visigótico e também dos séculos seguintes, que antecederam a formação do reino de Portugal.
Perspetiva sobre um dos Edifícios Identificados |
Mas este lugar sobreviveu à queda do Império Romano do Ocidente, em 476 d.C. Provam-no alguns vestígios de carácter habitacional e, sobretudo, um extenso espaço funerário, com múltiplos enterramentos, cujas datações, obtidas pelo método do C14 (no laboratório Beta Analytic, em Londres), permitem inscrever genericamente essa necrópole do período alto-medieval.
A confirmação de uma importante ocupação da Torre Velha / Terras de S. Sebastião nos alvores da Idade Média remete-nos para uma outra problemática muito interessante, que continua em aberto, e para a resolução da qual esta intervenção poderá, eventualmente, contribuir: onde se situaria a paróquia suevo-visigótica de Brigantia?
Moeda do Século III |
Pedra de Anel Gravada com curiosa figura de Cavalo com rabo de Peixe |
A importância da povoação de Castro de Avelãs durante o período medieval encontra-se depois claramente atestada pela presença do mosteiro beneditino de S. Salvador, classificado como Monumento Nacional em 1910, ainda que tenha sido construído no vale, já algo afastado do núcleo original de ocupação situado na Torre Velha.
Anel Alto-Medieval |
Seja como for, a importância deste mosteiro beneditino para a região de Bragança durante toda a Idade Média pode não deixar de constituir um reflexo, mesmo que indireto ou herdado, da centralidade deste lugar de Castro de Avelãs.
Também é certo que ainda no séc. XII a capitalidade desta região é assumida por Bragança (e precisamente num momento seguinte ao do provável abandono da Torre Velha) – um novo tempo que então se iniciava exigia uma novo posicionamento topográfico para o núcleo central amuralhado. Mas a eventual centralidade do período
anterior (romano e suevo-visigótico) poderá nos alvores da Idade Média, perante um novo e substantivo reordenamento político do espaço, ter então assumido outras formas, de cunho eminentemente religioso, corporizadas pelo mosteiro, agora símbolo maior desse passado. A memória desse espaço e da sua centralidade, ao longo de pelo menos um milénio, teria assim ficado assegurada com a construção do mosteiro.
Pormenor de um dos Enterramentos |
Esta é, porém, uma hipótese que continua em aberto mas que a investigação em curso procurará esclarecer, ao abrigo do protocolo que, em boa hora, a Autarquia de Bragança e a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, souberam celebrar.
Pedro C. Carvalho (Professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra)
Clara André (Arqueóloga da Câmara Municipal de Bragança)
Sofia Tereso (Arqueóloga e Antropóloga)
Miguel Costa (Arqueólogo)
Bragança,
10 de março de 2013
in:cm-braganca.pt
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