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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 8 de maio de 2018

Abril de 1974 e Interioridade

Comemoramos Abril de 1974, data histórica que restituiu aos portugueses, a liberdade e a esperança de um futuro melhor, com mais desenvolvimento e justiça social. Foram empolgantes os primeiros momentos da revolução dos cravos, na procura de liberdade, de igualdade, de justiça social, tempos em que a generosidade e a inteligência se cruzaram para escrever novas páginas da História de Portugal.

Fazer a transição de regime, assegurar orientações democráticas para a nova arquitetura do Estado, exigiu clarificações, algumas feitas em clima de elevada tensão social e política. Abriu-se um novo ciclo político, o poder foi devolvido aos cidadãos que, em liberdade, através do voto conferiram aos seus representantes, a responsabilidade da consolidação das liberdades cívicas e políticas, da construção do Estado democrático e suas instituições, tendo como referencial geopolítico as democracias europeias.

Abril de 1974 parece ter sido ontem, apesar de ter ocorrido há quase meio século. Temos presente a intensidade da fase inicial deste percurso, com a população nas ruas, mobilizada pelas forças partidárias e sindicais, na procura de conquistas e direitos designadamente sociais, a forte participação nos atos eleitorais, considerados como a festa da democracia, até chegar ao tempo presente em que, alguns excessos e afastamento de princípios de boa governação das instituições, de desvalorização da cidadania e do escrutínio por parte cidadãos, nos confronta com a perda de confiança nas instituições e nos partidos, situação que não é exclusivo de Portugal, em alguns dos países europeus emergem partidos e movimentos populistas, resultando populistas que poem em causa valores e o projeto europeu. Em Portugal, apesar das dificuldades, há estabilidade no sistema partidário, os partidos tem sido capazes de conferir estabilidade e segurança ao regime democrático.

Neste dia, não podemos deixar de evidenciar uma das principais conquistas de abril, o Poder Local Democrático, que de forma gradual tem vindo a consolidar a sua autonomia política, administrativa e financeira, deixando para trás o seu anterior estatuto de mera extensão do Estado Central. O Poder Local tem sido um dos pilares da modernização e desenvolvimento do país. A estabilidade do governo das autarquias, a proximidade aos problemas dos cidadãos, a facilidade de escrutínio sobre as prioridades e decisões tomadas, contribuíram para que os eleitos nas autarquias tenham assumido as soluções de governo e a resolução dos problemas para lá do curto prazo, assegurando maior continuidade de políticas.

O Poder Local promoveu a cidadania, construiu infraestruturas ambientais, concluiu a eletrificação rural e urbana, requalificou urbanisticamente as aldeias, vilas e cidades, lançou as bases do planeamento local no sentido de assegurar melhor crescimento urbano, maior sustentabilidade na utilização dos recursos, construiu equipamentos educativos, culturais, sociais, desportivos e de lazer, reforçou as infraestruturas de abastecimento público, desenvolveu o transporte público, a limpeza urbana, apoiou a economia e o emprego. A confiança dos cidadãos nas autarquias e a aceitação por parte do Governo Central do princípio da subsidiariedade, tem vindo a permitir ao poder local substituiu-se ao poder central em áreas essenciais à qualidade de vida e bem-estar dos portugueses.

O Poder Local é uma marca forte da revolução de abril, se é verdade que não tem corrido tudo bem, é certo que as autarquias tem sido uma âncora da democracia, recebem uma pequena parte dos impostos cobrados aos cidadãos e empresas, são responsáveis por uma parte muito significativa do investimento público e apesar disso, só são responsáveis por 2,5% da pesada divida pública que condiciona o presente e o futuro dos portugueses, ao contrário, a administração central e as empresas públicas são responsáveis por 97,5% da divida pública. Visto de forma agregada, pode dizer-se que o excesso de despesa pública e os grandes erros de gestão de dinheiros públicos não estão nas autarquias.   

Em geral, no conjunto da administração pública e nos vários setores de atividade económica e social, registamos importantes êxitos e decisões que contribuíram para o país moderno que somos. Quem nos visita fala bem de nós, da atratividade do país, do património natural e cultural, das infraestruturas que temos, dos serviços de qualidade, da segurança no país, da forma de bem receber da nação mais antiga da Europa, com a fronteira continental mais estável, praticamente inalterada desde o século XIII.

O que de melhor podemos apresentar no Bilhete de Identidade do país é o trabalho de todas as gerações, legado que temos de continuar, mesmo que o caminho seja estreito e com obstáculos, é o nosso caminho de oportunidade, ao fazê-lo estamos a honrar o esforço de gerações que aqui nos trouxeram, a rasgar fronteiras de conhecimento e de oportunidade para as gerações vindouras. Alguns dos obstáculos que temos de vencer, tem muito a ver com os problemas do centralismo excessivo que nos conduziu à presente situação de despovoamento do Interior, de abandono dos campos e na última década e meia conduziu o país a um empobrecimento relativo, no quadro da União Europeia.

A falta de visão integrada de desenvolvimento para o país no seu todo levou a que, de forma progressiva, vários governos, a maioria agindo em ciclos de governação muito curtos, uns com uns pretextos, outros com outros, tivessem seguido uma orientação de extinção e de esvaziamento progressivo de serviços públicos, escolas, centros de saúde, serviços de finanças, estações de correio, serviços públicos de transporte rodoviário e ferroviário, de encerramento ou esvaziamento da generalidade dos serviços desconcentrados da região Norte.

Nas últimas décadas a presença do Estado no Interior foi diminuindo, tem-se assistido como que a uma espécie de despovoamento programado dos territórios do Interior, tendo como resultado a concentração em Lisboa, dos centros de poder político e administrativo e do conhecimento e no litoral, de 70% da população, de quatro quintos da economia, de 85% dos alunos do ensino superior e de 93% das dormidas turísticas. O resultado não é positivo, as desigualdades territoriais tem-se acentuado.

Comemorar abril é exaltar as conquistas da democracia, ao mesmo tempo, garantir o aprofundamento da democracia, da cidadania, do bem-estar para todos, sem hipotecar a capacidade de decisão das próximas gerações e a sustentabilidade de vida no planeta. Como cidadãos temos a liberdade de pensar o melhor para cada um de nós, temos como primeiro dever, pensar o interesse comum, aquele que nos dá segurança, confiança e sentido de comunidade, é o interesse comum que faz a nossa terra progredir, ganhar laços de solidariedade, sentido de entreajuda, adquirir bem-estar para a comunidade em geral.

Para isso devemos unir esforços de forma inteligente e solidária, entre pessoas e instituições, na comunidade local e no país, sem deixar de dizer de forma clara, que os Transmontanos ao longo de séculos tem, desde o início da nacionalidade, dado ao país o seu melhor em recursos materiais e em pessoas, sem reciprocidade em termos da solidariedade nacional devida, e por isso continuamos a afirmar ser credores de uma divida histórica junto do Estado português cuja resolução não é compatível com o estado de despovoamento e de abandono a que o Interior chegou. Situação que resulta das políticas nacionais que não tem favorecido as condições de vida digna no mundo rural, a instrução e qualificação das pessoas, a modernização e viabilização das explorações agrícolas e florestais de escala familiar, a qualificação e modernização em geral das atividades económicas no Interior. 

Os transmontanos conhecem bem o peso da interioridade, sabem por experiência própria o que significa a ação centralizadora de esvaziamento das periferias, sabem quais os efeitos da emigração dos campos para a cidades do litoral e para países mais desenvolvidos. É verdade que os portugueses, apesar do seu número reduzido, foram pioneiros na globalização, abrindo caminhos nunca antes percorridos, partir à aventura é da sua natureza, por isso a língua portuguesa é a 5.ª mais falada no mundo.

Em vários ciclos da história do país, a emigração foi incentivada para assegurar a expansão em novos mundos, para o desenvolvimento e defesa de territórios conquistados, também, em determinados momentos para fugir á fome, à falta de trabalho, tentando outros destinos, outros países procurando uma vida melhor. Refiro o período de 1957 a 1974 em que, de Portugal emigraram para França 901 mil portugueses, mais de metade de forma clandestina, todos á procura de um futuro melhor. Os Transmontanos sabem bem o que isso significa, quer os que ficaram quer os que partiram e apesar das fragilidades que esses momentos representam, não perderam a autoestima, o orgulho das suas raízes, da sua história e identidade, dos valores que herdamos, no caracter, no trabalho, na integridade e no respeito.   

Como sempre, não podemos resignar-nos, temos trabalho a fazer, desafios a vencer, reclamamos, em nome dos ideais de abril, o direito ao desenvolvimento, à equidade e á coesão entre regiões. Temos que lutar por um novo modelo de desenvolvimento, de combate ao despovoamento e abandono dos campos, apoiado no conhecimento, na inovação, nas tecnologias limpas, na competitividade, na produção de bens e serviços transacionáveis, no exercício pleno da cidadania, com políticas nacionais de incidência regional e que traduzam de forma expressiva a solidariedade nacional que tem faltado.

Conhecer a realidade presente, tanto no que tem de bom, como no menos positivo, é um exercício de conhecimento e de cidadania, necessário à tomada de decisões que nos orientem nos caminhos do futuro. Se analisarmos alguns dados para o conjunto dos municípios da CIM Terras de Trás-os-Montes, como a evolução da população, das empresas, do emprego de entre outros, nos últimos 15 anos, verificamos que as fragilidades são elevadas, grandes os desafios.

A população do conjunto dos municípios de Terras de Trás-os-Montes, em década e meia diminuiu 17 560 pessoas, valor superior à população atual do conjunto dos concelhos de Alfândega da Fé, Vimioso e Vila Flor;

O número de empresas no conjunto dos concelhos diminuiu em 2394 empresas, correspondendo a 8,1% do total;

O emprego ao serviço das empresas, considerando todos os setores de atividade, diminuiu 10 550 empregos, atingindo a generalidade dos setores de atividade económica, com exceção da indústria transformadora que cresceu, e do setor da saúde que mantém o emprego;

Ao nível da produtividade, Terras de Trás-os-Montes regista uma tendência de decréscimo face à média regional, ocupando a 19.ª posição no conjunto das 23 NUT III do País;

Em termos de PIB per capita, no período de 2000 a 2011, Terras de Trás-os-Montes convergiu 15,4 pontos percentuais com a Região Norte, o que lhe permitiu atingir, no ano de 2011, a segunda melhor posição atrás da Área Metropolitana do Porto, 2,3 pontos percentuais abaixo da média regional. Nos cinco anos seguintes o crescimento tem sido residual, resultado da crise económica e financeira, em termos comparativos baixou da 2.ª para a 4.ª posição, 6 pontos percentuais abaixo da média regional, tendo sido ultrapassada pelas NUT III do Cávado e do Ave. Esta situação é mais preocupante se considerarmos que regiões do Interior, em forte declínio demográfico, como é o caso de Terras de Trás-os-Montes, o crescimento do PIB per capita é feito maioritariamente por uma razão menos boa, a redução da população.

É certo que temos alguns ativos importantes para ajudar a enfrentar as graves dificuldades associadas ao despovoamento, como melhores acessibilidades, melhores infraestruturas, melhores vilas e cidades, instituições mais qualificadas, centros de competências de que antes não dispúnhamos, uma maior abertura das empresas para os mercados externos, resultado de atitude mais empreendedora e inovadora de alguns empresários, situação que não nos desobriga de um esforço adicional para intervir prioritariamente no que é essencial, fazer crescer a economia da região e o número de empregos, fixar jovens qualificados e melhor remunerados, para enfrentar os problemas atuais da demografia.

A NUT III Terras de Trás-os-Montes que representava no ano de 2016, no contexto da Região Norte, 20,54% do território; 3,05% da população; 2,9% da riqueza criada e 3,3% do emprego, tem que por de pé uma agenda estratégica de desenvolvimento robusta, que lhe permita ganhar peso relativo em termos regionais, ao nível da criação de riqueza e de emprego, a sua principal prioridade, em todos os setores de atividade, não descurando a agricultura e florestas, e com essa agenda retomar a rota de convergência com a Região Norte, colocando como objetivo superar a média regional da qual já esteve muito próximo. 

O Nordeste Transmontano tem, no contexto do País e da Região Norte, um conjunto de especificidades identitárias, culturais, patrimoniais e de recursos económicos que exigem uma visão de desenvolvimento estratégico construída em forte cooperação entre atores do território, envolvimento dos cidadãos e suficiente conhecimento ligado às oportunidades e fragilidades territoriais, tem por direito próprio que ganhar voz, conquistar a solidariedade do país para vencer, neste ciclo de enfraquecimento que tem que ser revertido para um futuro de esperança.

Viva o 25 de abril
Viva Portugal

25 de abril de 2018 
António Jorge Nunes
in:diariodetrasosmontes.com

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