(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Nesta interminável sequência de grandiosidade das «Terras de Bragança», muitas das coisas que por aqui vou trazendo são fruto do acaso ou, por vezes, «a pedido de várias famílias». Será esta incursão representativa do último caso. Tudo por responsabilidade da magnífica Algoso e do seu não menos magnífico castelo. O que conduziu a Balsamão e ao seu convento, território que, não obstante se localizar na soberba freguesia de Chacim, no concelho de Macedo, tem uma umbilical ligação a Algoso. “Atãu’e, bota lá mais uas palabrecas, pr’ós qui’u quijerim”…
De facto, durante meio século, os Marianos de Balsamão marcaram presença por Algoso, no Convento de Santo António, entre a segunda metade do séc. XVIII e a primeira metade do séc. XIX. Quando as ordens religiosas masculinas foram extintas, após um decreto dessa primeira metade do séc. XIX, os seus bens, ou foram «arrebanhados», ou vendidos em hasta pública ou, particularmente no que respeito dizia a «bens menores», como paramentos, vasos sagrados ou algumas pinturas, foram transferidos para a igreja paroquial respectiva. O que aconteceria com alguns bens, que foram depositados na Igreja de S. Sebastião de Algoso. Aqui destacando, particularmente, um: a magnífica tela de «Nossa Senhora da Imaculada Conceição». Pintura que, há não muitos anos, se encontrava «esquecida» na sacristia da igreja, e cuja autoria será de um dos mais renomados pintores portugueses do séc. XVIII. É a incúria com que, muitas vezes, por desconhecimento, tratamos o nosso valioso património…
Pintor esse que também deixou magnífica obra pelo Convento de Balsamão. Assim como o fizeram outros destacados pintores do séc. XVIII. Balsamão, como alguém deixava em comentário, está envolto em lendas. Todavia, Balsamão é muito mais do que lendas. Mas tanto mais!!! Talvez muitos não o saibam, Balsamão tem uma ocupação, quase contínua, desde há cerca de 2000 anos. Pois por lá existiu um povoado fortificado pré-romano, com toda a probabilidade dos nossos antepassados Zelas. Povoado esse que também teve ocupação Romana. E que, ao que tudo aponta, terá sido a sede de um dos «pagi» Suevos e, posterirmente, centro de cunhagem de moeda Visigoda. “Ah peis é”!
Balsamão guarda muito mais do que História Religiosa. Aliás, as lendas sobre Mouros não passam disso mesmo, de lendas. Que os ditos Mouros pouco ou nada quiseram saber destas terras. Por isso, Chacim, por exemplo, nada tem a ver com a «chacina» que lhe apontam. Caso assim fosse, mais «Chacim» havendo, um dos quais no Minho, e mais uns quantos por Espanha, muitas «chacinas» teria havido. Pelo contrário, o nome «Chacim» é um antropónimo, ou seja, o nome derivado de uma pessoa. Assim como «Balsamão» o é. Mas isso não interessa para aqui…
Balsamão que aldeia foi, alcandorada no alto do Monte Carrascal, popularmente chamado Monte do Caramouro. E até teve um castelo, cujo perímetro ainda é possível verificar (e não, não é a torre que por lá há, que essa é de construção contemporânea). Um castelo que, conjuntamente com o de Algoso, foi um dos tomados, no início do séc. XIII, aquando das incursões de Afonso IX de Leão, que deixaram as nossas terras «a ferro e fogo». Outras histórias… Assim como outras histórias levaram ao abandono da povoação de Balsamão, que ainda no séc. XIV existia como tal, pois o nosso D. Dinis andou «às turras» com um dos filhos do «último Braganção», por causa dos direitos sobre a dita povoação. Depois seria abandonada…
Por lá deve ter permanecido uma pequena capela em honra a Santa Maria. A qual, mais tarde, tomaria o nome de Nossa Senhora de Balsamão, em honra à povoação entretanto desaparecida. Capela essa cuja primeira referência documental à sua efectiva existência é do séc. XVI, quando uma das muitas «desgraçadas» vítimas da «santa» Inquisição, aí foi obrigada a ir em penitência para limpar os seus «pecados judeus». Posteriormente, seria um eremitério, por lá tendo assentado uma ordem religiosa. Só já no séc. XVIII é que chegariam os Marianos, de lá expulsos, tal como em Algoso, no séc. XIX. Em boa hora regressariam no séc. XX.
Balsamão é muito mais do que devoção ou a casa-mãe dos Marianos em Portugal. Balsamão é um sítio mágico, onde se captam umas inigualáveis energias. E até tem um museu fantástico, uma igreja que assoberba os sentidos, quer pelo seu tecto, quer pelos vestígios de pinturas murais que ainda lá moram. E até tem uma subida que encantará qualquer um, com as suas capelas a bordejarem o caminho. E até se comem por lá uns acepipes de «fazer chorar por mais», acompanhados de uma simpatia e de uma arte de bem receber incomparáveis. Mas eu sou suspeito para falar…
Porque Balsamão é uma marca indesmentível na minha vida, por lá foi decidido baptizar os filhos. Por lá, a deslumbrar os sentidos, corre o Azibo, que é muito mais do que a “barraige”. Só quem já experimentou dar uns mergulhos no «Poço dos Paus» é que sabe do que falo. Ou quem já estendeu a manta para um piquenique nas imediações da «Ponte da Paradinha» saberá o que quero transmitir. Ponte medieval essa que terá sido construída pelos Hospitalários, para melhor fazerem o seu trajecto entre a Comenda de São Cristóvão de Malta e a de São Sebastião de Algoso. Sempre a ligação entre as «minhas» terras e Algoso, daí o fascínio. Algoso e a sua Comenda Hospitalária que também foram detentoras, por via da Comenda de São Cristóvão, de vastos direitos sobre outras aldeias do meu concelho, na sua região noroeste, nomeadamente as magníficas Lamalonga, Vilarinho de Agrochão, Nozelos e Ala.
Tudo isso por doações feitas pelos «nossos» Bragançãos, que a «cartilha» diz que foram os reis a fazer. Havendo agora outra «cartilha» que até quer fazer de Balsamão, e de outras terras que Hospitalárias foram, território Templário. Mas isso são outras «batalhas»… E já me “ztendi co iz’tu’e, q’ou quandu impeçu a butare faladura” sobre as nossas terras, tanto que têm, nunca mais se me “fetch’á matraca”. “Zculpim qualquera cousinha, pode sere?”…
Rui Rendeiro Sousa – Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer.
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas.
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana.
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros.
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.



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