Júlio Machado Vaz |
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A minha vida tem sido um percurso com altos e baixos, mas que mantém uma coerência que vai muito além da minha própria vontade, porque muitas vezes é fruto de acasos. Todavia, os acasos surgem quando estamos preparados para os levar no sentido certo. Nós andamos no mundo e, quando mudamos uma pequenina areia de um sítio para outro, ajudamos a mudar o mundo. O importante é que o ajudemos a mudar para melhor. Tenho consciência de que, em alguns casos, o ajudei a mudar para melhor ou, pelo menos, esforcei-me para isso. Estou cheio de fracassos pelo caminho. Eu chamo-lhes fracassos, mas não são verdadeiros fracassos, porque uma pessoa só fraqueja quando desiste, e não quando está pronta a recomeçar.
Sou uma pessoa que não desiste, que não se ajoelha. Procurei sempre alicerçar a minha visão do mundo na dignidade das pessoas humildes, que normalmente ninguém vê. Há que descobrir dentro delas a sua dignidade, no milagre da luta pela vida. Foi essa escola de fazer milagres que fui assimilando e que procurei aplicar em todos os lugares por onde tenho passado. Tenho fé nas pessoas e isto dá-me uma grande serenidade. Não me cria particular angústia saber que morro amanhã ou que morro depois de amanhã. Nós achamos que devíamos ser eternos, e inventámos a imortalidade. Como verificamos que o corpo morre, inventamos a imortalidade da alma. Não há imortalidade, há renovação, metamorfose. A semente cai à terra, nasce uma nova árvore, que dá flores e frutos, que um dia vai morrer e que tornará a nascer. Hoje sou matéria viva, amanhã sou pó, terra, vento, que vai alimentar uma planta, que vai alimentar uma flor. Só a metamorfose é imortal. É essa a nossa forma de eternidade. Cada manhã em que acordo é um milagre da vida.
Amadeu Ferreira
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