Nesta conversa com Mariana Bragada (MB), o Diário de Trás-os-Montes (DTM) pretendeu sobretudo conhecer o essencial do seu pensamento sobre a sua música e do processo criativo que esta jovem de Bragança nos apresenta, tendo a sua originalidade no uso de uma loopstation, instrumento musical repetitivo.
DTM: Chamas-te Mariana Bragada (MB), tens 21 anos, “Meta” porque, porque é adotaste este nome?
MB: Bem … boa tarde. Obrigada pelo convite. Meta tem a ver com metamorfose e com o processo de estar em contante mutação, ou seja, que a minha identidade é única, mas tem essa mutação constante presente e também por ser um prefixo, por exemplo, metafisico, metalinguagem. Um prefixo que se adiciona a algo, ou seja, também gosto de pensar nisso, em termos adaptativos, em termos de crescimento… e Meta, como chegada, tem a ver com o ser eu própria, a minha própria chegada, não ir à procura de algo externo … estar bem comigo mesma e … é isso!
DTM: “Meta” tem a ver com essa parte metafisica, será a parte espiritual também, que vem dentro de ti ou é ainda uma procura de algo mais?
MB: Sinto que é essa procura espiritual, mas em mim, ou seja, não uma forma externa, não uma forma de alcançar ou chegar algum lado, mas sim eu ser a minha própria chegada, a minha própria meta e estar bem comigo.
DTM: De onde é que te veio esta, esta vontade de cantar, esta vontade de compor, de onde é que partiu isso, qual foi clic que aconteceu aí na tua vida, em que te apercebeste que gostavas de cantar, foi com que idade?
MB: Bem eu já desde de pequenina que canto, tenho vídeos meus …que o meu pai gravou, com 3 anos a cantar. A primeira música que eu me lembro ate era em brasileiro, sobre uma borboleta. Mas fui sempre fui cantando, sempre entrei nos coros… também estive a aprender violino, depois foi guitarra. Sempre fui cantando … comecei a aprender guitarra quando estava no 9º ano cá em Bragança, para poder começar a escrever as minhas músicas originais. Tinha essa vontade também de me expressar e a partir daí fui sempre cantando, mas penso que assim mais a serio, e acreditar mais em mim também e trabalhar e aprofundar na musica, foi há um ano atras, um ano e pouco, um ano e meio…que criei um projeto para a faculdade, para a Arte Sonora, sobre as minhas raízes, sobre os meus avós, estive a fazer gravações na aldeia para usar como samples. E fiz um improviso com a loopstation…que um amigo meu me emprestou, que nunca tinha trabalhado, gostei tanto que a partir daí comecei a compor só com minha própria voz e para o meu projeto a solo, foi fluindo a partir disso, e ficou mais forte também por causa dessa experiência.
DTM: Essa experiência, digamos, essa experiência inicial chamava-se a “A vós, a voz, avós” é um EP, é uma música só?
MB: É um EP, tem 3 músicas …
DTM: Criadas por ti de raiz, com voz …e com esse instrumento
MB: Apenas voz, loopstation e samples originais, basicamente repete tudo por camadas o que for cantando e as samples tem quase assim uma história, fala sobre o esquecimento, fala sobre as cantigas da cegada, fala sobre aniversários e momentos de felicidade … um processo da vida em geral, sim!
DTM: E foi aí com essa criação, com essas três músicas que nasceste para a música? em pensas-te … é isto que eu quero fazer!
MB: Sim porque, o meu instrumento principal, sempre foi a voz … eu sempre quis explorar mais, e quando descobri a loopstation, e vi que posso criar um coro a partir de mim, posso criar várias camadas, usando só a voz que é mesmo o instrumento que eu gosto de trabalhar. Então para mim também foi um desafio aprender tudo, mas foi algo que me motivou também, trabalhar só com a voz e com essa parte de mim, só com essa essência … fez-me também experimentar mais coisas e a partir daí com esse EP , a musica portuguesa a gostar dela própria interessou-se no meu trabalho e também me gravou. E pronto, as oportunidades começaram a surgir.
DTM: Engraçado, tens uma voz algo melodiosa, mas são raras as pessoas que aproveitam só a sua própria voz e alguns instrumentos para compor … para fazer a sua música. Em Portugal não existem assim muitas referencias, as tuas referências vêm de onde?
MB: Bem, com a loopstation não há propriamente nenhum guia, nenhum livro de informações que ensine a usar. Conheço algumas pessoas que a usam mas apenas para coro, em algum momento especifico ou por exemplo só com guitarra, ou com baixo. As minhas inspirações musicais são bastante variadas, não é uma música feita só apenas com voz, aliás conheço muito poucos artistas que o façam. Principalmente gosto de ouvir músicas do mundo, gosto também bastante música Soul, R&B, jazz e eletrónica, são assim mais o meu género.
DTM: É essa mistura que te inspira e que te ajuda a compor?
MB: Sim, é a parte da inspiração, são também essas referências que ouço. A outra parte de inspiração também são as minhas próprias vivencias, as vezes em conversa com alguém surge uma ideia, ás vezes de olhar para algum sítio, uma fotografia, também surge a ideia …baseada a maior parte na realidade, mas também na fantasia e misturar mesmo o mundo de artes plásticas nas próprias letras, também muito influenciada pelos meus colegas da faculdade …
DTM: Tens dificuldade, quando compões uma música com a loopstation, que se repita sempre igual? … tens alguma maneira de fixar essas musicas, de as gravar depois, de as escrever para elas daqui a 5 anos, 10 anos ainda tenham a mesma matriz?
MB: sim …
DTM: … porque a loopstation, parece um processo criativo instantâneo, pelo que eu percebo…
MB: Sim, sim … é um processo instantâneo e também da para fazer muita coisa de improviso assim logo, ou seja, também é bom para improvisar. Eu, fui trabalhando algumas melodias e alguns ritmos e depois claro, tenho de os aprender, memorizar, perceber a sequencia, escrever uma letra que se adeque. Estive a gravar agora o EP em março também, dessas músicas, que também toco nos meus concertos, por isso, sim… é tudo um processo.
DTM: disseste que estiveste a gravar agora em março … é um EP, é o tal das 3 músicas ou é outro?
MB: É outro, este…
DTM: Como é que se chama este EP?
MB: Este EP vai-se chamar “Mónada”.
DTM: Ainda não saiu?
MB: Sim ainda não saiu. Vai sair em outubro deste ano, estive a gravá-lo em março, e agora estou no processo todo de lançar, videoclip e single, e promover também. Vai sair em outubro, 4 músicas originais com a loopstation, e outra gravação original que gravei aqui em Bragança.
DTM: Então são 5, digamos
MB: Sim , o lançamento mesmo de tudo, pronto … vai ser em outubro. Já há a música da “saudade”, já esta no youtube, que já fui cantá-la em alguns sítios, e na masterclass na Antena1 também tem algumas músicas que vão estar no EP ao vivo, mas assim gravações mesmo, assim no estúdio … tudo completo é em outubro.
DTM: Diz-me … tu só cantas em português, não é?
MB: Não, canto em português, inglês e espanhol.
DTM: Aí é?
(risos)
MB: Sim …
DTM: Portanto, cantas em português, espanhol e inglês … a tua música é um pouco estilo eletrónico ou tem a ver com um estilo “Madre de Deus”, aquela música de igreja, música sacra. É difícil de definir … não é?
MB: É …
DTM: Porque quando tu surgiste, quando ouvi a melodia pela primeira vez, a tua voz, o teu disco … eu fiquei com essa impressão … é difícil encaixar?
MB: Sim
DTM: Mas como é que tu entendes que é?
MB: Para mim, não… quando me perguntam tb que estilo sou, não consigo bem responder, digo que sou uma mistura… sou uma “manta de retalho”. Mas, para mim …falas de caminhar para a frente, ter essas referências do passado para mim é um híbrido, sinto que a minha inspiração e a minha música é um híbrido. entre as raízes entre o contemporâneo, ou seja, entre a voz, o ser humano e a tecnologia como a loopstation, há sempre uma junção de olhar em frente mas também saber de onde viemos, é essa dança…
DTM: Tens feito vários espetáculos, eu assisti no Quintanilha Rock, os espetáculos é sempre tu sozinha ou tens alguém que te ajude, tens alguns músicos que possam acompanhar, como é que é isso?
MB: Não, de momento o meu projeto a solo, Meta, é com a loopstation a voz e a guitarra, por isso sou sozinha.
DTM: E os espetáculos são em grandes palcos, festivais ou preferes um espaço reservado, tipo igreja ou teatros?
MB: Acho que no meu caso resulta melhor assim em espaços fechados, mais intimidade… cantei na igreja no ano passado, no festival Bons Sons e também gostei muito, porque é outro ambiente. Acho que é um ambiente em que as pessoas também estejam … disponíveis para ouvir e que tudo ocorra bem.
DTM: Já fizeste muitos espetáculos?
MB: Já fiz alguns, fui tocar no “Bons Sons” foi o meu primeiro festival, cantei no TedxPorto, depois também já andei pelo Porto, Viana do Castelo, tive também a oportunidade de ir também a Madrid cantar no SofarSounds, dei lá 2 concertos, fui a primeira vez que fui para fora cantar, pronto… no Alentejo, Lisboa …
DTM: Quando dizem que és uma menina de Bragança, isso traz algum constrangimento ou ajuda?
MB: Não, acho que o pessoal não tem esse preconceito. Pelo menos eu não senti ate agora, acho que o eu ser daqui, valorizar as minhas raízes, é algo que traz referencial para a minha música.
DTM: Tens algumas raízes transmontanas na tua música?
MB: Sim, eu tenho
DTM: Falaste nas ceifas, isso é transmontano mesmo?
MB: Sim, no primeiro EP era mencionado, agora neste novo tem mesmo a ver com ancestralidade e com as raízes …
DTM: Olha, tens a noção que deve existir uma “Meta” antes do festival e depois do festival, para mim e para a maior parte do pessoal conhecido foi uma surpresa ter alguém da terra no festival da canção … foi uma surpresa! como é que chegaste lá, quer dizer, vamos explicar ás pessoas como foi esse teu percurso
MB: Foi? Para mim tb …(risos) Basicamente a Masterclass é um programa da Antena1, que fazem mensalmente e que convidam músicos emergentes para ir tocar lá a cada mês, ou seja, sessão de 4 músicos, e o meu pai ouviu na radio e disse “olha! Pode-se mandar estão abertos para receber pessoas, e se gostarem vais la gravar…” então eu enviei, e no mês de outubro eles disseram que sim. Fui gravar em Lisboa duas músicas originais minhas e só depois soube que a Masterclass, por ano, escolhe um participante que tenha ido lá com entrada direta para o festival da canção. O convite pela Antena1 e então escolheram-me e convidaram-me para ir compor, interpretar uma música minha e então tive a oportunidade de compor original, ir interpretar e cantar no festival …
DTM: Essa música para o festival da canção como é que se chamava?
MB: “Mar Doce” …
DTM: E de onde veio esse mar doce, esse nome “Mar Doce”?
MB: Tem a ver também com o nosso mar interno, quer dizer refletir o interior, para nós fazermos as pazes connosco. Essa conotação também que eu falei, o mar em constante mudança, maré baixa, maré alta … tempestades …tudo …é o mar. O mar todas as mudanças acho que é aceitarmo-nos em nós todo o que acontece. O Mar Doce é também para contrariar um bocado esta tristeza também em muitas músicas em Portugal e todo mais. Para ser um bocado … mostrar outra perspetiva também de nós e dos portugueses… mais feliz.
DTM: Mostrar mais felicidade, é isso?
MB: Sim, mais paz …
DTM: Foste ao festival da canção, “Mar Doce” ficou em que lugar?
MB: Na final em 7º.
DTM: Para ti já foi bom, ou pensavas chegar mais longe… quem não estava a contar com nada há um ano atrás, foi excelente, o que é que tu achas?
MB: Para mim foi uma grande oportunidade e foi também um grande trabalho porque nunca tinha gravado uma música em estúdio, nunca tinha participado em nenhum programa televisivo, ou seja, houve muitas coisas que aprendi pela primeira vez para o festival e também … pronto, compor e cantar também com guitarra, com coro, com outros instrumentos, bateria … foi excelente.
DTM: Explica-nos isso, criaste a canção, inventaste-a tu? A música e a voz e a letra e depois tiveste ajuda de alguém, da RTP, da orquestra e assim, para fazer o arranjo?
MB: Sim, basicamente cada um escolhe onde quer gravar a sua música, a sua forma de apresentá-la, mas a ajuda que tive foi a dos meus amigos. Foi a minha composição, e o Festival da Canção deu-me liberdade completa para escrever, para cantar e para compor, ou seja … este ano convidaram assim mais artistas com o seu próprio nome a sua própria estética, digamos assim. E deram liberdade e muito apoio também, acho que também esteve muito bem organizado.
DTM: Tiveste noção que o povo ficou um bocado desiludido porque a tua canção ao pé da que ganhou, não tinha nada a ver. Merecias ter ganho…
… e agora onde vamos com este Mar Doce e o novo EP de 5 cancões, onde vamos mais, o que queres para a vida … Continuar a cantar? Tens um curso de Design e Comunicação…
MB: Estudei 3 anos de Design e Comunicação na faculdade de Belas Artes, sim!
DTM: Estás a ver o teu futuro por aí? Pelo curso ou mais aqui pela música?
MB: Eu acho que agora quero, quero conseguir expressar-me e criar e ter essa liberdade, então vou trabalhar na música, mais como principal porque é algo que eu gosto mesmo de fazer e que preciso também de fazer. É uma coisa que me é natural, que sai, que preciso partilhar… acho que é a minha forma também de ver boas energias cá para fora. E o meu objetivo é continuar a caminhar e a poder partilhar estas melodias que estão comigo, mas também eu gosto muito de danças performativas, dancei ca em Bragança durante algum tempo, participei no teatro, também tenho uma proximidade com as artes plásticas e com o design, ou seja, eu gosto de fazer muitas coisas também (risos).
DTM: O teu futuro é pr`aí assim …
MB: … e fotografia também!
DTM: Arte onde possa estar também a música …
MB: Arte performativa, é esse o meu principal gosto, mas quero continuar com a música, trabalhar, aperfeiçoar e criar novos estilos e novos estilos de concerto para mim … quero continuar a evoluir também …
DTM: Queres continuar em Bragança?
MB: Eu estou a morar no Porto, há 4 anos que estou a morar lá …
DTM: Há alguma coisa que gostasses de dizer?
MB: Sim, então, desde já obrigada… sim, estejam atentos à minha página do Facebook: MetaMonada que vou partilhando tudo lá. Um videoclipe que estive a agravar também cá na minha aldeia vai sair em breve! Vou lançar o videoclip e single antes de lançar o EP, que o EP será lançado em outubro e depois vai estar disponível em edição física e edição online também e pronto… Dia 27 de Julho tenho concerto em Guimarães e em agosto ainda vou passar pela cidade de Bragança a cantar, eu vou avisando tudo no meu facebook e instagram para quem quiser acompanhar!
E obrigada a todos que me tem apoiado e acompanhado, porque é preciso unirmo-nos todos e estarmos juntos e em comunidade para fazermos as coisas acontecerem com base no amor… obrigada e até já!
Entrevista dirigida por António Pereira, fotos de Rui Coelho e António Pereira, algumas fotos cedidas pela Mariana Bragada.
in:diariodetrasosmontes.com
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